Afinal, o Brasil vendeu a Copa de 1998?

Raphael Evangelista
Enciclopédia das Copas
5 min readAug 29, 2022

Uma nova tradição surgiu nas Copas após 1998: saber se aquela fatídica final foi comprada, se a Seleção entregou o jogo, se a história da convulsão de Ronaldo foi real ou apenas uma falácia, entre outras tantas coisas que um texto muito famoso afirmou logo depois da derrota do Brasil para a França em Saint-Denis.

Imagem: Gazeta Esportiva

Há anos este e-mail circulou com o seguinte cabeçalho:

“Copa 2014 — Divulgado o escândalo que todo mundo suspeitava! Talvez, isso explique a razão de o jogador Leonardo ter declarado a seguinte frase: ‘Se as pessoas soubessem o que aconteceu na Copa do Mundo, ficariam enojadas (…)’”.

Muita gente ficou escandalizada e acreditou que tudo foi uma grande armação, afinal de contas, ele trazia informações bem completas e alegava que o Brasil perdeu de propósito para poder se beneficar com o título na Copa seguinte e sediar o Mundial em casa. Verdadeiro o texto ou não, tudo isso realmente aconteceu, não é?

Fato é que de lá pra cá, mudam-se os personagens e as ocasiões e a mesma história surge nas redes sociais como meme. Sempre que o Brasil perde uma Copa, um time é eliminado da Libertadores, um lutador perde no UFC ou qualquer outro grande evento de multidões, uma versão deste e-mail revela a verdade que gerou uma surpreendente derrota.

Em comum a essas ocasiões está a pessoa por trás das denúncias: o “jornalista Gunther Schweitzer da Central Globo de Jornalismo”.

Em 2014 a ESPN encontrou com o suposto jornalista da Globo, que pela primeira vez falava publicamente sobre o caso desde o ano 2000.

Desde então, sempre que possível, resgatam a palavra dele para entender o que foi que aconteceu e se de fato ficaremos todos enojados ou não.

Eu também tive o prazer de bater um papo com o protagonista do polêmico e-mail na véspera da Copa de 2018, mais uma vez para desenterrar essa curiosa história e se você não está com muito tempo pra ler, pode assistir a entrevista com Gunther Schweitzer aqui:

E aí? Este e-mail era verdadeiro ou não?

O e-mail era verdadeiro e circulou por várias caixas de entrada, se você recebeu, com certeza tem 30 anos ou mais. O que não é verdade, porém, é a assinatura. Gunther Schweitzer nunca foi jornalista da Globo:

“Eu recebi o e-mail lá pelo ano 2000, eu trabalhava na Volkswagen. E esse e-mail contextualizava toda a falcatura que tinha sido utilizada pra Copa de 1998”, afirma Gunther.

No entanto, ele nega que tenha sido o autor da mensagem original.

“Eu acabei repassando esse e-mail e tinha uma assinatura, eu não lembro qual era. Só que não sei quem trocou a assinatura e me colocou com cargo de jornalista investigativo da Rede Globo”, relata.

E será que o Brasil vendeu mesmo a Copa?

Perguntado se ele acredita que o e-mail era verdadeiro, Gunther diz que não acredita e nem duvida: “Sinceramente, a gente sabe que tudo que em política, futebol, tudo que envolve muito dinheiro, sempre tem alguma falcatrua”.

Repercussão mais de vinte anos depois

Nessa entrevista, Gunther comenta que até hoje há quem jure de pé juntos que o Brasil vendeu a Copa de 1998: “Tem muita gente ainda que acredita, que leva a sério, que comenta, briga, dá palpite…”

Sobre o nome dele circular até hoje por conta disso, ele diz que antes se chateava, mas que aprendeu a levar na boa.

Vida na política

Em 2018, Gunther, que é árbitro de vôlei, quis aproveitar a repercussão de seu nome sempre estar na suposta “denúncia” e apostou em uma nova empreitada: se candidatou a deputado estadual na defesa do esporte como plataforma de campanha.

Na época, inclusive, circulou uma versão do famoso texto envolvendo o atentado ao então candidato Jair Bolsonaro e claro, a assinatura levava o nome de Gunther, que fez questão de desmentir.

Ao todo, ele recebeu 1.229 e não foi eleito.

Gunther segue sendo um grande entusiasta do vôlei e divulgando em suas redes seu trabalho como professor e árbitro. E para o bem do esporte, esperamos que sem nenhuma falcatura.

Memes e fake news à parte, até hoje esse assunto gera polêmica.

Edmundo, que entraria no lugar de Ronaldo e momentos antes da partida voltaria para o banco, chegou a falar certa vez (sem saber que era gravado) que Ronaldo tinha um contrato com a Nike que o obrigava a jogar. Em entrevista recente, o “animal” contou detalhes de como foi a assustadora tarde da concentração brasileira na França onde eles e outros jogadores achavam que Ronaldo iria morrem em campo e revelou ter se chateado como a comissão técnica que nunca o colocava em campo.

Uma CPI foi instaurada no congresso nacional para entender os acordos entre CBF, Nike, atletas e uma suposta entrega da Copa. Acabou dando em nada após três anos de investigações. Foram ouvidos nela: Ronaldo, o técnico Zagallo, o lateral Roberto Carlos e nomes fortes das empresas envolvidas.

Zagallo ficou pistola com jornalistas no pós-jogo para tentar explicar o que rolou e causou saia justa na coletiva. Pra muita gente, um chilique desnecessário e providencial.

Emanuel Petit, autor do terceiro gol da França naquela noite, chegou a questionar certa vez se de fato aquela final foi pra valer e também menciona a possibilidade de um acordo para facilitar para os anfitriões daquela Copa:

Será que realmente ganhamos a Copa do Mundo? Não é um pouco de arranjo? Não sei. No campo, você realmente tenta ganhar. Fizemos de tudo quando enfrentamos nossos adversários. Mas, com tudo o que está acontecendo agora, eu tenho que me perguntar. Isso me assusta e me deixa paranoico. Fui marionete para manter a economia?

Michel Platini, lenda do futebol francês e durante muitos anos do alto escalão da UEFA, teve a pachorra de declarar em um determinado momento que ele e a FIFA mexeram uns pauzinhos para que França e Brasil se enfrentassem na final, colocando ainda mais pulgas atrás das orelhas brasileiras:

“Não iriamos preparar uma Copa do Mundo por seis anos para não fazer pequenas travessuras, certo? Você acha que os demais países que foram sede também não fizeram?”

Ronaldo, o protagonista da história, sustenta desde 1998 que o Brasil não vendeu a Copa e que essa ideia é absurda. Apesar dele pouco se lembrar do que aconteceu, teve sim uma convulsão.

Em um papo recente ao Flow Podcast, Ronaldo comentou o caso e reafirma que tudo não passa de teoria da conspiração.

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Raphael Evangelista
Enciclopédia das Copas

Escrevo algumas coisas. Já fui redator lá naquele site das listas, adoro pizza, cachorro quente e paro a vida por um mês a cada quatro anos para ver a Copa.