AJUDA CÔMICA

Caroline Peralta
Encontros com a Arte e os Artistas
4 min readJun 25, 2019

Este encontro forneceu inúmeros aprendizados ao analisarmos validação de discursos, comportamentos de mediação, estruturas culturais e o comportamento comunicativo da sala de aula em relação há pedagogia que discordamos.

No primeiro bloco da aula discutimos com os convidados as funções históricas da linguagem circense, desde de sua influência nas mídias como televisão e cinema, até a participação do circo nas estruturas culturais regiões do Brasil. O palhaço com humor crítico, ambiguidade, exacerbando ridículo e assumindo suas sombras com a comédia permite escancarar as fragilidades da nossa sociedade, como se fazia o bobo da corte.

Com a sociedade do espetáculo, industria cultura e a globalização percebemos as ressignificações da imagem do palhaço em diferentes manifestações.

Pôster turnê da banda punk rock Dead Kennedys
Jogos online/plataformas
Banda infantil Patati e Patatá

Na aula conhecemos ao vivo um desses exemplos, Gabriela Winter (Jujuba) representante da organização social sem fins lucrativos Palhaços Sem Fronteiras que pertence a uma rede de unidades internacionais — Clowns Without Boders International (CWBI).

A convidada falou sobre o riso possuir a ferramenta de regeneração afetiva e já ser biologicamente comprovado o aumento de reações químicas de relaxamento, Gabriela compartilhou as diferentes histórias nas viagens que se voluntariou como palhaça na tentativa de ajudar campos de refugiados, abrigos, ocupações, alojamentos, tentando transcender as barreiras culturais, de idioma, políticas, sociais e religiosas… O riso sendo na pratica realmente o melhor remédio.

Apesar de concordar em pequenas partes, num geral a logica da convidada possui diversos conflitos. O primeiro é a sua comunicação e escolha de palavras que contem alto grau de colonialismo e homogenização das culturas/territórios. Outro ponto é a forma de aplicação da linguagem circense nesses locais, em nenhum momento houve confirmações de mudanças permanentes após o encontro com a ONG, e muito menos há uma preparação nas apresentações que reflita a condição de classe/sentimentos das pessoas em vulnerabilidade econômica.

Explorando esse tema encontrei um artigo “Economias Carnavalescas: Clowning e o impasse neoliberal” de Barnaby King professor da Edge Hill University, no Reino Unido. Refletindo sobre Neoclowniberalismo e as necessidades do palhaço sobreviver no mundo capitalista, o autor estuda como foi sendo realizado na história diferentes pactos sociais no qual os palhaços se submetiam ao comportamento da “cultura cidadã”, ao invés de realizar o genuíno desafio de romper as relações de poder com o instrumento do lúdico, tornando-se portanto somente um “Buenavista Social Clown”.

Foi interessantíssimo acompanhar a reação das pessoas indignadas da sala, pelo que percebi a convidada respondeu os alunos educadamente, mas absorveu com um tom “estudantes que problematizam tudo” ou “beleza, mas estamos fazendo a diferença”. Não teria sido um ótimo exercício conseguir uma mudança na convidada só utilizando linguagens circenses ? Conseguir fazer ela rir dela mesma, compreendendo o tamanho das reproduções que ela está inserida para satisfazer seu ego?

Como educomunicadora não tenho o objetivo de criticar, eu já sei criticar muito bem e tento aprender na faculdade (que inclui muito mais que a sala de aula), a meta aqui é ensinar a criticidade ao outro, compreender porque essa expressão está acontecendo e como a própria pessoa irá aprender a criticar a si mesma e o mundo ao redor. Esse exercício de questionamento deve ser constante nas relações, senão torna-se muito fácil virarmos nesse caos imprevisível o que mais odiamos/temíamos. Falhei como educomunicadora nessa aula porque o ambiente universitário é opressor, não me sinto segura de aplicar o que penso no coletivo de sala de aula e a confiança na comunicação nunca foi incentivada ou simplesmente não me incentivou.

Interligando tudo, a educação está nessa estrutura carnavalesca/neoliberal tanto quanto o circo, desconheço as infinitas lutas históricas que os professores, e principalmente, as professoras fizeram e fazem para sobreviver com o minimo de dignidade nesse sistema que desvaloriza o questionamento.

Contudo a USP como um todo e o sistema acadêmico universitário de base oligárquica me lembra a palhaça Jujuba, achamos que estamos fazendo diferenças quando esquecemos da criticidade, tentamos transformar o outro julgando o que achamos melhor, não escutando os reais processos e percebendo os tempos de cada um. O sistema se deleita da “mão de obra qualificada” enquanto nos sentimos privilegiados de continuar reproduzindo a incomunicação de diferentes formas.

Praticando fora da sala de aula, treino cotidianamente as ressignificações do palhaço utilizando o humor como ajuda não só para rir e sim para libertar/reencontrar os diferentes jeitos de sorrir no mundo. Isso não tem preço/nota que compre ou satisfaça tamanha experiência no existir.

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