A sutil violência de "querer ser alguém na vida"

Téia Capitanio
En-ducar
Published in
2 min readMay 29, 2017
Novo filme da Maria Farinha Filmes sobre a juventude e o Ensino Médio Brasileiro.

Juventude é talvez uma das fases mais deliciosamente desafiadoras da vida. É receber um balde de realidade e um balde de hormônio. É utopia e desilusão. É responsabilidade e transgressão. É ser julgado e ser cobrado. É ter que decidir quando mais se quer tudo. É uma pulsão de vida que erradia pelos corpos, pelos sonhos e pelos olhos. É um baita desafio!

Este filme, delicado e necessário, como todos os trabalhos da Maria Farinha Filmes, fala sobre este momento da vida e sobre o papel da escola nisso tudo. Propõe uma reflexão extremamente necessária nesse momento social e político. O que sonhamos para os jovens? Digo reflexão, porque acho que precisamos debater, mas antes disso precisamos refletir. Debatemos pouco, mas refletimos ainda pouco. E um depende da qualidade do outro.

Me senti bastante tocada pelo filme, mas dentre minhas reflexões teve uma coisa que me incomodou, que é uma pulga na orelha que venho carregando nos últimos meses. Porque colocamos o sonho da juventude quase que exclusivamente como sonho profissional? Como se o trabalho fosse quase que a única coisa que constituisse o ser. Deixo claro que não estou diminuindo a importância do sonho e planejamento profissional, mas me parece que não sobra muito espaço para sonhar outras coisas, sonhar desenvolver um valor, sonhar com outra cidade, sonhar acabar com um medo ou com um sofrimento, sonhar fazer um projeto. Sonhamos sermos médicos, engenheiros, advogados, dançarinos, como se nestes títulos estivesse nossa possibilidade de finalmente ‘sermos’.

Já parou pra pensar no absurdo da frase tão comumente dita: “o que você vai ser da vida?”, “quero ser alguém na vida”, etc. É uma sutil e violenta anulação da potência que já se é, que sempre se é, independente da idade. Não há ser no futuro. Acho estas frases tão sintomático de tanta coisa que não cabe em palavras.

Enquanto não reconhecermos a potência que se expressa no jovem no momento presente, possivelmente sofrimentos serão gerados nos planos futuros. Há sabedoria em querer sonhar a cada dia e há um convite possível aos jovens de pensarem o que querem ser no agora, que ser humano querem ser a cada atitude, a cada relação, a cada decisão.

É disso precisamos. É da ausência de sonhos e seres presentes que estamos sofrendo no Brasil.

Enfim, assistam o filme! Tá uma delícia igual a juventude. (Dica: dá para organizar exibições gratuitas usando esse site lindo: http://www.videocamp.com/pt/movies/nuncamesonharam

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Téia Capitanio
En-ducar

Investigadora curiosa sobre a educação para a inteireza do ser.