A Warner é o maior problema do Coringa (2019)

A irresponsabilidade da empresa pode prejudicar o filme

Jota Gaivota
Enfim Cinema
Published in
5 min readOct 1, 2019

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Esta matéria é parte de uma série chamada O Mês do Terror no Enfim Cinema (2019). Confira as outras partes.

Você, assim como eu, deve estar ansiosíssimo pra assistir ao filme sobre o Coringa. Dirigido por Todd Philips, que também dirigiu o primeiro filme da franquia Se Beber Não Case, e é escrito por ele junto do Scott Silver, roteirista de 8 Mile (o filme sobre o rapper Eminem) e também O Lutador, com Mark Walberg (2010, David O Russell).

O filme trata de como o comediante Arthur Fleck, interpretado por Joaquin Phoenix, se transforma no criminoso Coringa. Nos trailers da pra perceber que a interpretação do ator buscou criar um personagem com conflitos internos e o roteiro parece retratar uma pessoa com dificuldade de comunicação e de relacionamento interpessoal. Segundo Joaquin Phoenix, o ator principal, o filme é sobre trauma na infância, falta de amor e de compaixão no mundo.

O fato é que a execução da equipe de Todd foi tão eficiente que a própria Warner posicionou o filme como candidato ao Oscar, possivelmente de Melhor Ator mas sem desconsiderar o título de Melhor Filme. Aliás o filme já venceu o Leão de Ouro, prêmio máximo de Festival de Veneza. Você provavelmente já sabe mas a campanha pra uma premiação dessa é muito parecida com uma campanha política. Tem de colocar o filme na boca do povo, especialmente dos que votam na Academia. Pra isso é necessário a publicidade intensiva, o boca-a-boca dos fãs, entrevistas em grandes programas e até o uso de polêmicas.

Segundo o Telegraph Joaquin Phoenix saiu no meio da entrevista deles depois do jornalista Robbie Collin questionar se o ator estava “preocupado se o filme poderia perversamente acabar inspirando o tipo de pessoa que retrata, com potencial de resultados trágicos?”. A assessoria de imprensa disse que ele entrou em pânico e que a questão nunca tinha lhe ocorrido.

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Graças a repercussão do caso a Warner restringiu o acesso ao tapete vermelho da estréia do filme no último sábado. Somente os fotógrafos teriam acesso. Alguns dias depois algumas famílias das vítimas do massacre de Aurora emitiram uma carta afirmando que respeitam o direito de livre expressão mas que com ‘grande poderem vem grandes responsabilidades’. Assim a Warner deveria:

  • Acabar com as contribuições para candidatos que recebem dinheiro da NRA e votam contra as reformas da política de armas, pois “estes políticos estão literalmente colocando seus clientes e empregados em perigo”.
  • Use sua influência política no Congresso para fazer lobby por reformas de armas.
  • Ajudar a financiar fundos de sobreviventes e programas de intervenção.

Em 2012, na cidade de Aurora, nos Estados Unidos, um outro homem de 24 anos assistiu a 40 minutos do filme O Cavaleiros da Trevas Ressurge e depois foi até seu carro, pegou um rifle e disparou contra os outros expectadores. 70 pessoas ficaram feridas e 12 foram executadas. Este homem tinha o cabelo tingido de laranja e, segundo a imprensa, se dizia ser o Coringa.

O Exército estadunidense emitiu o comunicado abaixo sobre possíveis atentados na estréia do filme. Porém se prestar atenção ele não é destinado aos jornalistas ou ao público, mas sim aos próprios oficiais em preocupação com eles e seus familiares. Algo que não me parece ser indicativo de nenhum tipo de mobilização ou investigação. Aliás não descarto aqui o fato de que a Warner Bros se dá muito bem com o Exército. Não somente isso há este ofício alertando que haveria conversas muito específicas sobre um possível atentado na estréia do filme, em 4 de outubro em alguma sala de cinema.

“Team,

Posts on social media have made reference to involuntary celibate (“incel”) extremists replicating the 2012 theater shooting in Aurora, Colorado, at screenings of the Joker movie at nationwide theaters. This presents a potential risk to DOD personnel and family members, though there are no known specific credible threats to the opening of the Joker on 4 October.

Incels are individuals who express frustration from perceived disadvantages to starting intimate relationships. Incel extremists idolize violent individuals like the Aurora movie theater shooter. They also idolize the Joker character, the violent clown from the Batman series, admiring his depiction as a man who must pretend to be happy, but eventually fights back against his bullies.

When entering theaters, identify two escape routes, remain aware of your surroundings, and remember the phrase “run, hide, fight.” Run if you can. If you’re stuck, hide (also referred to as “sheltering in place”), and stay quiet. If a shooter finds you, fight with whatever you can.

** this is a condensed version of an HQ Army Materiel Command, G-3, Protection Division Security message**

No fundo não faz sentido traçar o paralelo de que uma única obra, aliás um personagem, seja responsável por causar esse tipo de reação em pessoas, mesmo que tenham alguma psicopatia. Isso é coisa de obras do H. P. Lovecraft ou do Rei Amarelo do Robert W. Chambers. A alienação se dá num nível de sociedade, mas isso vamos falar depois que o filme sair.

A questão possível de se discutir agora é a falta de atitude da Warner Bros. Sua resposta aos pais preocupados foi a de reiterar seu histórico de não fazer mais que a obrigação e doar dinheiro às vítimas da violência armada. Também afirmou que a AT&T, dona da Warner, se reuniu com “outros líderes” para influenciar os políticos sobre a importância de legislações relacionadas a “essa epidemia”. Mais importante que isso é afirmar que a posição dos contadores de história é a de “provocar conversas difíceis sobre assuntos complexos”. E até ai, tudo maravilha.

Mas ao esconder a equipe do alcance dos jornalistas. Ao não criar nenhum tipo de propaganda ou conscientização. É irresponsável! É uma empresa que atinge milhões de pessoas para conseguir seus lucros absurdos e não está interessada no bem estar delas. Nem tanto no sentido de evitar atentados durante as exibições mas a da própria vida cotidiana. Eu acredito que o filme não deveria ter interferência no roteiro, até porque não o vi mas tudo que está “fora de quadro” poderia ter sido trabalhado para que a obra fosse realmente entendida como o retrato de problemas possíveis da sociedade.

Mas não se engane, se o pior acontecer as empresas reativamente vão se mobilizar pra criar fundos e campanhas que não vão reparar o estrago feito.

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Links Relacionados

O artigo As Críticas ao Novo Filme do Coringa. E a Cultura INCEL, por Cesar Gaglioni, no Nexo Jornal.

O artigo Aurora Shooting Victims Voice Fears Over ‘Joker’ in Letter to Warner Bros., por Ryan Parker, no The Hollywood Reporter.

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