Melancolia

regras, rótulos, bueiro de ideias e muita burocracia

capitu
Ensaios sobre a loucura
3 min readNov 2, 2020

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Este texto foi escrito ao som de E no Final — O Terno

Fonte: Pinterest

Deveria ser umas 19h de uma quarta-feira, o clipe de uma música do Tim passava quando ela foi do quarto para a cozinha e viu a TV ligada na sala sem ninguém. Um blusão cinza, melancolia e uma taça de Cabernet recém aberto que comprara sábado, porém, não bebeu por motivos de: ganhou um bolo (e sem ganache dessa vez).

Vagam em sua mente lembranças, pensamentos e conclusões. Vaga olhando para o celular em cima da mesa, eles até se olham, mas nada acontece. Puxou um cigarro, acendeu na boca do fogão e foi como assistir um filme de uma menina solitária num cômodo de um apartamento - andando até a sacada mais próxima.

Tesão reprimido disfarçado de curiosidade e um tanto de falsa afirmação. A máscara machucou e a seda não esperou. Será? Tem se perguntado muito. Eu não sei. Suas emoções a levam e atravessam sem permissão de entrada, consequente, estadia. Mas, ela nem se importa mais, tornou-se roteiro do dia-a-dia. Costumes servem para algo.

Caminhou até a sacada do apartamento e assistiu a nova geração de erros, confissões e cheiro de vodka barata. Parecia ser uma festa. A onda batia em seus pés devagarinho e não entendeu o porquê de tantos porquês. Ela não sabe, quer dizer, escolheu não saber e aí a famosa autossabotagem mais uma vez tomando seu lugar cativo, pode entrar.

Tempo é relativo. Ela sabe. Ilusão e solidão são noivos que caminham numa linha tênue, que no fim podem até se casar, caso, seja o (caos) caso. Ainda lembro quando éramos um e assistiu uma menina afundada em sua própria confusão. Colhia, escolhia estar. É escolha neste caso. Junto a ela conversas aleatórias, desejo e música. Gente afobada e idealizações, bufou olhando para o celular de novo a espera de uma notificação.

Nessa hora, a menina que olhava para o céu, parou o olhar na única sacada apagada do prédio ao lado e num instante se cruzaram. Foi então que dentro de um déjà vu tudo ficou nítido.

O que a menina e ela tinham em comum? Sensação de acaso e coincidências entregam as dimensões paralelas, prazer, não era apenas uma brisa. Tempos diferentes, interestelar já tinha explicado. Elas eram a mesma. A mulher da sacada com uma taça de vinho e a menina no play do prédio com um copo de vodka na mão, em algum lugar a teoria do multiverso era aceita (está aí a comprovação). Reconheceram-se. Garganta seca, angústia, sensação de “eu já vivi essa merda”. Uma dose de gritos abafados, por obséquio.

Piscou e tudo sumiu. Não passou de mais uma viagem, delírio ou sei lá como você quer chamar. Vou fumar menos da próxima vez, pensou. Aquela era mesmo a paisagem mais linda que já tinha visto… acendeu a luz da sacada e caminhou até o quarto.

Lá embaixo, um menino apareceu e beijou sutilmente sua bochecha. A menina piscou rápido, que estranho, guardou a melancolia no bolso do jeans, desligando o celular e ignorando a ligação.

E mais uma vez tudo desbotou-se na estação do acaso.

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Ensaios sobre a loucura

"te conhecendo parece uma viagem aleatória dentro da tua cabeça"