Porque hoje é domingo e a culpa acumulou.

Não só da dieta que eu deixei de seguir — overdose de açúcar, álcool e nicotina — mas de tudo o que fiz, pensei em fazer ou sonhei dolosamente.

Porque hoje é domingo e desde sexta eu não sinto seu gosto em mim. Me aperta o peito pensar em tudo o que aconteceu e me esqueço de que você é um outro eu. Porque hoje é domingo e os programas na TV, aberta ou fechada, já não me satisfazem tanto quanto.

Hoje é domingo e eu ansiosa pela manhã, por amanhã. Depois que a semana começa é mais fácil de terminar. (Obviedades.) Hoje é domingo e essa manhã eu sonhei com você. Eu fazia exatamente o que fiz hoje de madrugada, mas sem amargar. O quanto é difícil se conhecer? Eu quero sexta. Eu quero hoje. Mas hoje é domingo e domingos não acabam assim, ilesos.

Hoje não tem samba e amor até mais tarde. Hoje é futebol e o Flamengo perdeu. Hoje chove. Domingo pode chover? Hoje eu tento escrever qualquer coisa porque já passou meu tempo. Mil rascunhos, nada publicado. Teço um texto de culpa dominical, cristã, social, destilando mentiras sinceras, ocultando verdades inescrupulosas, travestidas de medo de perder a única coisa que ainda vale. Prefiro ter minha paz de quem faz tudo certo e sempre, pelo menos até agora, pelo menos antes de amanhã: segunda-feira-imunda.

Hoje eu já não escrevo as coisas pra fazerem sentido. Aliás, cada vez menos para serem lidas por muitos. Psicografo meu próprio espírito, tecnicamente chamado pela ciência da psicanálise de elaboração. Labor. Sabor. Saber. Noutra vida, ou só daqui a alguns anos, sendo a otimista que não sou, quero entender de perto que a culpa que carrego é só fruto do que não sinto de verdade, mas do que sou. Fui (produzida). Passiva de todo esse conjunto complexo de qualidades que impuseram a mim e eu passei a acreditar.

Mas agora já me distancio, olha bem, que o que eu comecei dizendo é que hoje é domingo, tenho culpa, sinto sua falta e tudo o que eu mereço é a segunda-feira brava.