Sobre a vida

Três poemas de Mike Essig

R Solino
Ensaios sobre a loucura
2 min readFeb 26, 2017

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(Tradução R. Solino)

Foto: Mike Essig. (Cropped, levels corrected).

I — Timor mortis conturbat me*

Relâmpago
no céu noturno:

nada ali,
lá está,
nada ali.

Nossas vidas
neste mundo:

nada aqui,
cá está,
nada aqui.

Do nada,
um breve flash
de ser
antes do nada.

A morte
não encerra,
ela retoma.

Não tema.

*O temor da morte me perturba.

II — Epidemia de solidão

Alguém me disse
recentemente,
“está havendo uma epidemia
de solidão”.

Aí está!

Agora sei por que
meu coração estremece
quando vem o crepúsculo
e minha alma
treme ao amanhecer.

Esqueci de ser
vacinado.

III— Hora extra¹

Relógios abrem feridas que nem abutres ferozes com bicos mortais estalando. Suas mãos te pegam pela garganta estrangulando o pensamento. Relógios são mentirosos: sem tempo a perder, o tempo tudo cura, o tempo dirá, e, pior que tudo, tempo é dinheiro. Tempo não é dinheiro. O tempo é sua alma escorrendo pelos pés. Dinheiro é só uma marca barata de papel higiênico. Use-o de acordo. Zumbis pequeno-burgueses compram essas mentiras, confundem tempo com passo. O consomem como um café caro: quatro anos de faculdade, quarenta horas por semana, trinta anos de hipoteca, cinco anos pagando o carro. Compram suas vidas com tempo. Foram convencidos pelos usurários de que pagamento é propriedade, o sucesso é material. E ficam muito ocupados para questionar. Quando o tempo se esvai, eles morrem, sem saber que viveram uma mentira. O tempo é quem ri por último. Sempre.

¹ O título original, “Off the Clock”, significa “horas extras sem remuneração”. Não encontrei um bom equivalente local.

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