Entre LP entrevista Gaía Passarelli

Anna Bella Bernardes
ENTRE LP
Published in
6 min readMar 9, 2021

O título de criadora de conteúdo digital da Gaía Passarelli surgiu bem antes da categoria que aparece no topo do seu Instagram. Ela começou a produzir conteúdo na internet em 1997, no extinto site rraurl, o primeiro site de música eletrônica e alternativa a ganhar popularidade no Brasil. Vale lembrar que nos primórdios da internet discada, as pessoas não conseguiam encontrar informações tão instantaneamente como agora.

Foram 14 anos como editora do rraurl (leia sobre os 13 grandes momentos do site aqui) até se tornar apresentadora na MTV Brasil. A emissora tava procurando por um homem jovem, bonito, tatuado e que manjasse de música, e ela, uma mulher jovem, bonita, tatuada, que manja muito de música e sem o estilo meio surfista de VJ, fez o teste e trabalhou por lá até o fim, em 2013.

Gaía também é autora de “Mas Você Vai Sozinha?” (Globo Livros, 2016), escreve crônicas sobre São Paulo e dores de amor aqui no Medium e é diretora editorial do BuzzFeed Brasil desde 2019, ano que o site começou sua mudança editorial. Este foi um dos assuntos que conversei com a Gaía na entrevista a seguir. Continue a leitura e confira!

O Buzzfeed Brasil foi a primeira edição em língua não-inglesa, fundado por aqui em outubro de 2013. No início de 2019 foi iniciada uma mudança global, colocando o foco em conteúdos diferentes dos anteriores e você entrou como diretora de conteúdo na sequência. Em janeiro deste ano ele se desligou da matriz. Como está sendo essa nova fase?

Várias coisas estão entrando no lugar após um par de anos muito duros. O momento é de reencontrar a voz do portal, reestruturar equipe, refazer processos de criação. Isso está acontecendo com a flagcx, gigante da publicidade e atual detentora do BuzzFeed no Brasil. A flagcx é uma empresa com uma cultura de trabalho bastante sólida e isso que a gente precisava. Pra responder sua pergunta de forma mais direta: está sendo bem intenso e acontecendo muito rápido. Eu acredito muito no time que estamos montando para seguir nessa nova fase. Estou animada.

A operação do BuzzFeed News tem previsão de volta?

O BuzzFeed News Brasil foi encerrado em agosto do ano passado e a marca não fez parte da negociação. Não há planos nesse sentido.

Em uma época tão conectada quando a nossa é normal ter a sensação de estar perdendo muita coisa. O FOMO tem ganhado força nesses tempos de isolamento social. O que você pensa sobre essa infotoxicação e o movimento slow content?

Eu tive que googlar “infotoxicação”, acredita? Mas acho que já boto isso em prática na vida. 2020 foi um ano muito, muito duro, óbvio. E eu moro sozinha, trabalho em casa, trabalho com-para a internet. Preciso ter algum controle e já passei por crises pessoais suficientes pra saber, hoje, que sou responsável por mim mesma. Então, uma das coisas que comecei a fazer pra tentar manter a sanidade mental por aqui e não surtar, foi consumir menos, muito menos redes sociais. Escolher por onde e quando me informar. Não participar de surtos coletivos e linchamentos virtuais. Sabe, o dia tem um número limitado de horas e é preciso escolher o que fazer com elas. Entre acompanhar o apedrejamento virtual do dia no Twitter e dormir, eu escolho dormir. Não sei se te respondi, mas acho que vivemos um tempo de cada um por si com o Caos no comando. Todo mundo vai ter que aprender a se cuidar e isso passa por consumir menos, inclusive conteúdo.

Sobre a vontade de viajar na pandemia: para onde você pretende ir assim que for vacinada?

Quero muito voltar para o México! O México é o único país onde cheguei e senti que poderia ficar. A Cidade do México é uma metrópole incrível, super cosmopolita e cultural, e o interior e os dois litorais do país tem dezenas de cidades menores cheias de história e cenários maravilhosos. Além do mais: melhor comida, sem sombra de dúvidas. Eu amo muito a América Latina e assim que puder voltar a viajar quero voltar a explorar nosso continente.

Você planeja fazer uma 4ª temporada do podcast? Quais você anda ouvindo?

Eu não vou voltar com o podcast: não tenho tempo e esse foi um projeto pontual que já acabou. Meu compromisso é continuar escrevendo. Escrevo todos os dias e nunca escrevi tanto quanto durante esse ano. Sinto uma melhora real no que estou produzindo, mas, seguindo o conselho de um amigo, não tô publicando e sim guardando pro futuro. Algumas coisas saem aqui no meu Medium, mas não tem periodicidade.

Mas ouço muito podcast! Entre os preferidos atuais estão o Noites Gregas (aulas de mitologia grega com um professor gaúcho, recomendo demais pra quem quer mergulhar nesse mundo), o 451 mhz (que é o podcast da quatrocincoum, a revista dos livros), o Quarta Capa (podcast da editora Todavia), o Medo e Delírio em Brasília, o Boa Noite Internet do Cris Dias (que acabou de voltar!), o podcast novo da Folha sobre psicanálise apresentado pela Tati Bernardi, e outras coisas pontuais. Podcast de notícia eu ouço o Assunto da Renata Lo Prete. E acabei de ouvir o “Stay Free: The Story of The Clash”, uma produção do Spotify com a BBC que é a história do Clash narrada pelo Chuck D e é um absurdo de bom. Pra podcast de conversinha, um monte de gente falando e disputando quem brilha mais, eu não tenho a menor paciência.

Em um dos seus textos você fala sobre a mulher 40+ no mercado de trabalho hoje. Envelhecer mudou e você diz que reaprender a trabalhar tem muito de reaprender a estar com gente todos os dias, o dia todo. Como está sendo aprender a trabalhar na pandemia?

Pra mim não foi difícil pra mim me adaptar ao home office. Eu fui freela muitos anos e aprendi a ter uma rotina bem organizada, separar a hora de trabalhar da hora de viver, etc. Gosto de acordar cedo, de ter agenda fixa, essas coisas. A parte ruim é não ter a troca com as pessoas no dia a dia, isso realmente me faz muita falta, tenho a sensação de que as conversas mediadas pelas plataformas online rendem pouco, tem semanas em que me sinto isolada mesmo. Só que sei que isso ainda vai durar um tempo, não tenho nenhuma ilusão de voltar ao antigo normal. Então seguimos adaptando e encontrando formas de trabalhar.

Como foi produzir conteúdo pro rraurl.com nos anos 90/00 e como está sendo agora, pra além de todas as evoluções tecnológicas? O que muda no tipo de texto, no trabalho, e como você enfrenta essas mudanças produzindo conteúdo digital há mais de 20 anos?

Eu comecei a escrever por acaso em 1997 ou 1998. Era uma coisa motivada apenas por paixão adolescente e de alguma forma isso me trouxe até aqui. O principal pra mim é ter, hoje, a consciência de que a internet não esquece, que toda palavra é pra sempre e que criar “conteúdo” requer responsabilidade. Eu não tinha essa percepção há vinte anos, claro, era muito uma coisa de aprender a me expressar, não tinha ideia do impacto que o que você fala ou faz tem para outras pessoas. Mas isso não é uma mudança só “da internet”, faz parte de amadurecer. O importante, acho, é saber que cresci junto com a internet. Apesar de ter tido uma passagem fugaz pela televisão e ter colaborado com jornal impresso, eu sempre fui uma pessoa da internet, e por isso me sinto tão à vontade trabalhando no BuzzFeed, que vem desse mesmo lugar e trabalha com os valores de “truth & joy” — verdade e alegria. A gente vive um tempo em que a internet e a vida são cada vez mais a mesma coisa. Por isso mesmo é importante fazer da “sua” internet um lugar produtivo e salutar.

Espero que tenha gostado do conteúdo de hoje. Se sim, deixe seus aclamados aplausos e escreva um comentário aqui em baixo ou no nosso Instagram. Até a próxima!

Somos fãs do trabalho da Gaía e ela é uma grande inspiração pra gente. @Gaía, obrigada por dividir suas histórias com a gente.

--

--

Anna Bella Bernardes
ENTRE LP

Jornalista das Gerais perseguindo São Paulo. Comms leader do @museudapessoa e Co-founder da @entrelp. www.instagram.com/annagramizando