Film is not dead: a película reverbera pela cena independente

Francielle Cota
ENTRE LP
Published in
8 min readJun 11, 2020

O filme vive! Unindo memória e estética, conversamos com duas fotógrafas que resgatam o fazer manual e a sensibilidade da fotografia analógica, frente à instantaneidade das câmeras digitais.

Quando a história da fotografia engatinhava, em tempos ainda mais sombrios para as mulheres, muitas tiveram seu primeiro contato com o suporte realizando serviços de laboratório, acabamento e fotopintura para maridos ou pais fotógrafos.

No Brasil, Gioconda Rizzo (1897–2004) foi a primeira mulher a abrir um estúdio de fotografia e ter a autoria de seu trabalho reconhecida. Aos 17 anos ela montou seu estúdio próprio, o Photo Femina, que revolucionou os retratos feitos em chapas de vidro e chamou a atenção da alta sociedade paulistana. Seu pai fechou o estúdio com dois anos de vida, em 1916, porque descobriu que ela fotografava cortesãs francesas e polonesas.

Com o passar do tempo, o cenário correu por outras linhas históricas da representatividade feminina e a câmera em punho. Entretanto, no contexto da arte fotográfica, ainda lidamos com um universo dominado majoritariamente por homens.

São Paulo — vulgo paulicéia desvairada — é preenchida por arte e, principalmente, por quem a faz. Em tempos fotográficos tão digitais e instantâneos, Isabela Yu e Yasmin Kalaf são jovens que empoderam a presença da mulher na fotografia, trabalham com Comunicação na principal cidade do país e lutam para manter viva a tradição do processo analógico, menos amparado nos recursos tecnológicos e mais ligado à sensibilidade.

Sobre as entrevistadas

Isabela Yu — por: Helo Cleaver

Isabela Yu: jornalista por amor e formação. Atualmente é responsável pelas redes sociais do selo Balaclava Records. Junto com sua amiga e parceira de jobs, Heloísa Cleaver (Helo), montaram a Revista Balaclava, que é distribuída gratuitamente e está em sua quinta edição.

Além disso, Yu é repórter colaboradora do site Monkeybuzz, onde desenvolveu a série “Mulher-Elétrica”, assumindo a responsabilidade pelas entrevistas e fotografias.

Yasmin Kalaf — por: Isabela Yu

Yasmin Kalaf: uma mulher multidisciplinar. É formada em design, mas atua em áreas diversas, como fotografia e produção cultural/musical no selo Cavaca Records.

No selo, é responsável pela parte de direção de arte e pela distribuição de fonogramas para as plataformas streaming. Yasmin também realizou trampos com o Inhame Estúdio fazendo captação de vídeos.

Entre LP: Como surgiu sua relação com a fotografia analógica?

Isabela: Um irmão da minha avó era fotógrafo, então temos uma relação muito carinhosa com as fotos da família. Meu pai também tem registros maravilhosos de quando ele estava na faculdade. Essa relação com os álbuns de família passou para mim. Sempre tive aquelas câmeras Point and Shoot para levar nos passeios do colégio. No colegial, comprei uma digitalzinha com um zoom imenso porque eu comecei a ir em shows e queria muito registrar aquilo. A volta da fotografia analógica aconteceu na faculdade. Meu irmão me deu uma instax de Natal e tudo foi escalando depois disso.

Monica Agena — por: Isabela Yu

Na mesma época, me chamaram para fazer assessoria da Ombu com a Helo. Foi o nosso primeiro trabalho juntos. Primeiro passo, eles precisavam de fotos de divulgação. Eu fui lá e tirei umas fotos deles no ensaio. Eles começaram a fazer vários shows então eu também tirava foto dos rolês e deles tocando. Comecei a fazer isso também com a Raça, depois acho que em todos os rolês que estava com amigos, minha família, ou em viagens, tudo fora de casa.

Yasmin: Eu fotografava desde pequena como brincadeira, colocava umas toalhas no chão para fazer de fundo infinito, essas coisas, até o dia que minha mãe deu uma câmera analógica que era dela e comecei a experimentar algumas coisas e fui gostando. Com isso quando comecei a frequentar shows comecei a andar com uma Point and Shoot onde eu registrava os bastidores e fui pegando gosto até começar a registrar shows em si.

Applegate/Cidade — por: Yasmin Kalaf

Entre LP: Quais as câmeras que você mais utiliza para produzir os ensaios?

Isabela: Os ensaios são situações novas para mim. Sempre curti a fotografia em movimento, ou flagrar algo no momento. Produzir e pensar essas imagens em ensaios ou estúdios é um desafio. Eu uso a Canon Eos Rebel GII e a Olympus MJU I. Também tenho uma Instax Wide.

Jadsa Castro — por: Isabela Yu

Yasmin: A que eu mais uso ultimamente é uma Canon EOS 300 n que ganhei de presente de um amigo. É com ela que faço retratos, shows, e tudo! Ela é muito versátil. E sempre tenho uma Point and Shoot em mãos. Ultimamente, também tenho usado a Cannon 135 Super Prima.

Moblins — por: Yasmin Kalaf

Entre LP: Na sua opinião, quais são as experiências positivas em registrar um show em analógico?

Isabela Yu: Você pode ficar segurando o celular e filmando o show em vez de prestar atenção. Você pode sacar a sua câmera e bater uma foto. Especificamente em fazer em analógico gira em torno dos motivos anteriores, você tem menos possibilidades de cliques. Falo isso como apreciadora. Nunca me atrevi a fotografar um show de verdade. Vira e mexe eu saco uns cliques de shows próximos, nos festivais da Balaclava ou no Breve (a casa de show do Dotta e do Farah). Inclusive, o primeiro rolê que me chamaram para fotografar foi um festival da Geração Perdida, de BH, no Breve. Saiu em uma matéria do Panoni para a Vice. Não consigo opinar tecnicamente sobre fotografar grandes shows ou usar lentes enormes.

Sophia Chablau — por: Isabela Yu

Yasmin: Com certeza a versatilidade dos filmes. Gosto muito de testar a película e ver até onde ela pode chegar, quais resultados eu posso tirar dela, se eu usar um filme vencido e puxado as fotos vão ter um resultado, se eu usar um filme novo vai ter um resultado completamente diferente. A surpresa da fotografia analógica é a melhor parte.

Applegate — por: Yasmin Kalaf

Entre LP: O que você acha do hype atual com as câmeras retrôs?

Isabela Yu: Acho ótimo. Massa que mais pessoas falem sobre isso. Comprem câmeras, revendam câmeras, que mais pessoas aprendam a revelar e a digitalizar em casa. Nunca vai ser extremamente popular, mas pode demorar mais tempo para desaparecer. Estamos na era do Iphone 11, com três câmeras, super HD, mega profissional. Os caras não vão parar de procurar a nitidez perfeita. O analógico, assim como as revistas, os selos de música, as casa de show, são uma forma de resistência. Pelo menos vejo assim. Não é um clube, é uma forma de viver nessa era doida. E também porque as coisas podem coexistir. Por um momento, as pessoas acharam que todo mundo ia ler apenas com os Kindles da vida, erraram. E acho que poderia ser para todo mundo. Infelizmente, assim como fotografia digital, é algo que custa dinheiros (muitos). Em comprar filme, se você faz fora de casa a revelação, etc. Espero que ultrapasse o hype e se torne popular de verdade. Não acredite no hype, cara (rs). Teste de tudo e veja o que funciona para você.

Ana Faria (Frango Elétrico) — por: Isabela Yu

Yasmin: Acho legal, nós precisamos de materiais analógicos nos dias de hoje, nos limitamos usando só as ferramentas digitais. E fora que fotografia analógica é um ensinamento para pessoas ansiosas como eu, rs. Fora o fato que estamos vendo mais lugares vendendo filme, coisa que facilita muito o acesso.

Jup do Bairro — por: Yasmin Kalaf

Entre LP: Qual o trabalho analógico executado por você que te marcou em 2019?

Isabela Yu: Com certeza o “Mulheres-Elétricas”. Amei de paixão fazer as fotos de divulgação das bandas, mas a série é muito interessante de fotografar porque eu aproveito o espaço. Geralmente, são estúdios, ou as casas das próprias entrevistadas. E aquele momento de pânico? Falta luz ou está chovendo, o que fazer? Bom, fui aprendendo e também tive a brilhante ideia de a cada edição testar filmes diferentes. Fiz a maioria em Portra 400, mas também fiz em Kodak Gold 200, Pro Image 100… Foi uma loucura! Cada filme teve sua própria brisa, várias deram errado, assim como eu gostei muito de várias. Dirigir essas mulheres, foi tudo um grande aprendizado.

Lucinha Turnbull — por: Isabela Yu

Yasmin: Fiz dois trabalhos que me deixaram muito feliz com os resultados.

O primeiro foi com a banda Applegate, fiz as fotos para a capa do álbum e de divulgação da banda. As de divulga usei um filme puxado que resultou em tons azulados lindíssimos. Para as fotos de capa, os meninos me pediram algumas fotos de prédios futuristas e ambientes de cidade, já que o álbum carrega esse conceito de densidade da vida urbana. Saí então em um domingo para andar pela cidade com o meu foninho de ouvido escutando o Tábua da Esmeralda do Jorge Ben e a câmera na mão carregada com um Pro Image 100. Fotografei pela Vila Olímpia e pelos arredores da Paulista, o desafio dessas fotos foi como não serem fotos de prédios óbvias, então procurei ângulos, formas e detalhes que poderiam ser mais interessantes.

O segundo foi com a dupla Moblins, eles me convidaram para desenvolver a identidade visual e a capa do primeiro disco deles. Eles tem um estilo muito próprio e são muito ligados a moda e artes cênicas e queríamos que isso ficasse aparente de uma forma sutil na capa. Fotografamos no estúdio onde eles gravaram algumas das faixas, o estúdio tinha uma parede de concreto em uma área aberta, esperamos anoitecer para conseguirmos o efeito de dramático. O styling ficou por conta da Marina Avello (Maavello) e a tipografia que usamos na capa pelo Kaue Fregolon.

Moblins — por: Yasmin Kalaf

Playlist musical para inspirar

Ao final, Isabela Yu e Yasmin Kalaf deixaram uma contribuição maravilhosa de sons que têm feito parte do dia a dia delas. As playlists estão disponíveis no Spotify do Entre LP. Acesse e confira!

Bônus por Isabela Yu: conhecendo o trabalho de fotógrafas pelo mundo

Gringas:

Ana Kras — https://www.instagram.com/teget/

Pether Sutherland — https://www.instagram.com/petersutherland/

Luo Yang — https://www.instagram.com/luoyangggg/

Olgaç Bozalp — https://www.instagram.com/olgacbozalp/

Pia Riverola — https://www.instagram.com/piariverola/

Adriana Roslin — https://www.instagram.com/adrianaroslin/

Nadine Ijewere — https://www.instagram.com/nadineijewere/

Pooneh Ghana — https://www.instagram.com/poonehghana/

Andreia Lemos — https://www.instagram.com/andreiaartt/

Chloe Shepard — https://www.instagram.com/eolhcsheppard/

Yuki Kikuchi — https://www.instagram.com/yuki_not_rinko/

Brasileiras:

Camila Tuon — https://www.instagram.com/camilatuon/

Gabriela Schdmidt — https://www.instagram.com/gabriela_schmdt/

Cassia Tabatini — https://www.instagram.com/cassiatabatinistudio/

Vivi Bacco — https://www.instagram.com/vivibacco/

Naira Mattia — https://www.instagram.com/nrmtt/

Bruna Sussekind — https://www.instagram.com/bsussk/

Vitoria Leona — https://www.instagram.com/vitorialeona/

Larissa Laidan — https://www.instagram.com/larizaidan/

Takeuchis — https://www.instagram.com/takeuchiss/

Josefina Bieti — https://www.instagram.com/josefinabietti/

Nicole Heineger — https://www.instagram.com/nheiniger/

Lorena Dini — https://www.instagram.com/diniloris/

Luisa Dorr — https://www.instagram.com/luisadorr/

Andressa Ce — https://www.instagram.com/ce.andressa/

Ivi Maiga — https://www.instagram.com/ivimaigabugrimenko/

Bruna Bento — https://www.instagram.com/bentobruna/

Cecilia Duarte — https://www.instagram.com/cecilia___duarte/

Janis Lima — https://www.instagram.com/janisjfl/

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Francielle Cota
ENTRE LP

Jornalista amante da película 35mm e boa prosa.