A cultura e suas transformações

Caio Mendonça Cysne
EntreFios - tecendo narrativas
3 min readOct 30, 2020

Para a produtora e gestora cultural Nádia Sousa, é a capacidade de modificar a vida de alguém que a faz acreditar em seu trabalho

Por Caio Cysne

Foto em preto e branco. Nádia Sousa é uma mulher branca com cabelos até os ombros e usa óculos de armação escura.
Nádia Sousa, produtora e gestora cultural / Arquivo pessoal

Nádia Sousa está visivelmente cansada depois de um dia puxado de trabalho. Contudo, ela não para: voltará a trabalhar após a entrevista, pois está finalizando um projeto para um edital da Lei Aldir Blanc.

São mais de 20 anos atuando no campo da Cultura em vários cenários políticos e econômicos do país, do estado e do município de Fortaleza.

Atualmente, Nádia é proprietária da produtora Mercúrio e sócia do espaço Bruta Flor.

Fomos recebidos primeiramente pelo seu cachorro Kurt Cobain — uma homenagem ao cantor da banda Nirvana — , da raça lhasa apso. Todo visitante precisa cumprimentar Kurt antes de falar com qualquer outro membro da família, ela nos avisa enquanto vamos entrando.

Nos preparativos para a entrevista, conversamos sobre aquele dia e amenidades, enquanto ela jantava com seu companheiro, o também produtor e gestor cultural Lenildo Gomes e seu filho Gabriel.

Mas Kurt não é o único pet da casa, tendo a companhia de oito gatos, também com nomes de estrelas do rock. Nádia cultiva ainda uma pequena floresta em seu apartamento, localizado no centro de Fortaleza.

As roupas leves destacam suas tatuagens, que mostram sua forte ligação com a cultura: algumas são reproduções de obras conhecidas nas mais variadas linguagens. Para ela, não é possível mensurar o impacto dos projetos culturais na vida de uma pessoa. “Mesmo aquela ideia que para você é muito simples e muito tola, de às vezes parar no corredor e sentar com um jovem daquele e dizer assim: ‘Por que você não tenta teatro?’”, exemplifica.

Formada em Letras pela Universidade Estadual do Ceará (Uece), iniciou a carreira profissional como professora de português em escola particular. Relembra com nostalgia que, ao mesmo tempo, atuava numa instituição sem fins lucrativos na Maraponga, bairro na periferia de Fortaleza.

Nádia chegou a atuar em outras organizações culturais, como a ONG Encine, no Papicu, na comunidade Verdes Mares e outra no bairro José Walter. Desde então, nunca mais parou de trabalhar na área cultural, mesmo em alguns rápidos momentos de raiva e de vontade de desistir, brinca.

São os momentos de troca que fazem Nádia permanecer no campo da cultura. Recorda-se com muito carinho dos momentos de conversas — principalmente, com os alunos — quando esteve como coordenadora pedagógica do Centro Urbano de Cultura, Arte, Ciência e Esporte (Cuca). Segundo a gestora, difícil mesmo era lidar com os pais que não conseguiam entender o que os filhos e as filhas faziam tanto tempo lá.

Ela lembra de dois casos que a marcaram muito. Sua atual professora de violino foi aluna de um curso que Nádia criou no Cuca. A produtora e gestora só tomou conhecimento disso porque a professora chegou a comentar o quanto o equipamento cultural tinha mudado sua vida. O outro caso foi de um menino, hoje mulher trans, quando os pais dele a procuraram para conversar sobre a participação do filho nas atividades do equipamento. Ela dá três batidas com a caneta na mesa, como se lembrasse de cada detalhe dessa conversa.

Nádia tem uma vasta vivência na periferia, seja em equipamentos públicos, seja em projetos culturais. Ela menciona que, na mesma época em que atuou no Cuca, trabalhava numa escola particular não muito conhecida, ultramoderna, com turmas de no máximo dez alunas e alunos. Viver nesses dois mundos causava um paradoxo em sua cabeça.

São anos trabalhando com cultura e vendo de perto seu poder transformador. É clichê e piegas demais, afirma em meio a risos.

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