A vida depois do plantão

Lucas Dutra
EntreFios - tecendo narrativas
3 min readApr 8, 2021

“Durante meus 29 anos em atividade exercendo a enfermagem, nunca vivi tempos tão difíceis”, afirma a enfermeira Leila Maria sobre o cenário pandêmico em que vivemos

Por Lucas Dutra

A enfermeira Leila Maria / Arquivo Pessoal

Nascida e criada no interior do Ceará, mais especificamente em Itapajé, Leila Maria Dutra de Oliveira Silva é esposa, avó e mãe de um casal, aos quais se refere com muito carinho e orgulho.

Aos 50 anos de idade, Leila é um enfermeira formada pela Universidade Estadual do Vale do Acaraú (UVA), de Sobral, com três pós-graduações, atualmente cursando sua quarta, em Enfermagem Obstétrica, pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Mesmo com um vasto currículo e um repertório profissional majestoso, com passagens pela Secretaria de Saúde Municipal de Itapajé e o Centro de Hematologia e Hemoterapia do Ceará (Hemoce), a profissional afirma que não é fácil encarar a linha de frente da saúde no combate à pandemia do novo coronavírus.

Sua motivação em seguir a área da saúde vem desde a infância. Ela afirma que, quando era criança, costumava brincar de cuidados médicos, e essa era sua brincadeira favorita. Quando chegou ao período da sua juventude e, consequentemente, ao dilema da escolha profissional, Leila nem pensou duas vezes: era enfermagem. O desejo de juntar sua vocação com suas habilidades era seu maior aliado nessa escolha, da qual ela muito se orgulha.

Por meio de videochamadas diárias, que ajudaram a construir este perfil, Leila relata as dificuldades que vem encontrando profissionalmente por conta da disseminação do vírus da Covid-19. Mesmo afirmando estar amedrontada, a enfermeira reconhece que, neste momento, sua atividade é uma das mais essenciais para ajudar na crise humanitária pela qual passamos.

Quando iniciou sua carreira profissional, aos 21 anos, Leila nunca pensou que passaria por um momento tão conturbado e incerto quanto o atual. A profissional alega que a pandemia não interfere apenas nas suas relações hospitalares, pois trouxe, também, muitas barreiras para as suas relações interpessoais fora da vida profissional. A saudade de viver uma rotina “normal” com seus familiares e amigos é uma realidade cotidiana na sua vida.

“Durante meus 29 anos em atividade exercendo a enfermagem, nunca vivi tempos tão difíceis. Além de enfermeira, eu sou mãe, esposa, filha, avó e amiga. Minha relação com meus entes queridos ficou extremamente abalada desde o início da pandemia. Com minha mãe, por exemplo, eu só tive contato uma vez, desde que começou esse surto que já passa de um ano. Com meus filhos, meu contato foi reduzido, e no início isso foi muito doloroso”, pontua a enfermeira.

Lembrando de acontecimentos recentes do Hospital João Ferreira Gomes, em que trabalha, a enfermeira destaca dois pontos específicos que estão presentes na sua dualidade de sensações: a felicidade que é ver um paciente recuperado após a internação por conta do Covid-19 e a exaustão de toda a equipe de profissionais. De uma forma triste, Leila expõe que o dia a dia no ambiente de trabalho está pesado e difícil.

“Ver o ser humano em uma situação de vulnerabilidade e poder lhe ajudar é uma das sensações mais gratificantes que eu tenho enquanto enfermeira e cidadã. Só que, agora, não só os pacientes estão vulneráveis, nós que trabalhamos com isso também nos encontramos nessa situação, principalmente o meu setor [de enfermagem], que sustenta o grande rojão do funcionamento dos leitos”, explica.

O olhar de fora pode identificar Leila Maria como uma mulher forte e corajosa, não só pela profissão, mas também pela história de vida. Mas quem a conhece a fundo reconhece suas incertezas e firmezas com facilidade. Sua trajetória é linda, dura e admirável. Facilmente a vejo como uma mulher plural que se encontra constantemente na sua melhor versão.

Hoje, vacinada, Leila segue na esperança por dias melhores, conciliando seus trabalhos e estudos de uma forma sacrificante, mas ao mesmo tempo orgulhosa, sempre reforçando para seus conhecidos a importância de ficar em casa nesse momento. Embora seja difícil estar na sua posição, ela tenta levar sua realidade de uma forma leve, como faz com tudo na vida.

Mulher de grandes vivências, vontades e valores, Leila não vê a hora de tudo isso passar para poder viver, de verdade, a vida depois do plantão.

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Lucas Dutra
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Praticando Jornalismo pela Universidade Federal dó Ceará. 📰