Ativismo social e transformação pela música
A cantora e compositora Becka Nizers, nome artístico de Rebeca Macêdo, é uma artista independente de Fortaleza que encontra no rap e no trap formas de se expressar e de impactar a vida das pessoas
Por Lóren Souza
Ela demora para sentar à frente do computador e regular a luz da ring light. “Ainda tenho dificuldades com essas tecnologias”, confessa. Becka acaba de chegar do trabalho como cuidadora de idosos, mas não demonstra cansaço.
Sempre muito descontraída, emana alegria e vivacidade, parecendo lembrar da energia dos momentos que viveu, enquanto fala sobre música, trabalhos já feitos e participações em organizações de eventos.
Vinda de uma família religiosa, Becka começou a cantar já na infância, dentro da igreja. Por volta dos 11 anos, teve seu primeiro contato com o hip hop, por meio do grupo Atitude Feminina. Becka foi atraída pelo ritmo, pelas batidas e pelos assuntos abordados nas letras.
Por ser de periferia e presenciar as violências e vivências das mulheres ao seu redor, ela conseguiu se relacionar e se identificar com as temáticas do grupo. Nesse mesmo período, outros artistas passaram a fazer parte de seu repertório. Negra Li, Racionais e Charlie Brown Jr eram as ferramentas de suas primeiras rebeldias. Proibida pelos pais de ouvir músicas seculares (músicas que não são da igreja), Becka pedia ajuda aos primos mais velhos e conta rindo que eles baixavam as músicas para que ela pudesse ouvir escondida.
A mais velha de cinco irmãos afirma que sempre teve que ser responsável e independente. “Esse instinto de liderança já é de mim desde criança, e eu levei isso para a vida”. Esse perfil ativo a levou durante a adolescência a organizar eventos de batalhas de rima em bairros da periferia próximos de sua casa.
“Eu via jovens que não podiam ir para outros bairros ver batalhas, então pensei: ‘Por que não fazer?’ E fiz! Fiz em uma praça do meu bairro. Fui atrás de microfone, caixa de som, chamei MCs de fora, teve premiação. A primeira batalha deu mais de 300 pessoas”, conta com empolgação. “Depois, não precisava nem chamar o pessoal de fora, a galera de lá já rimava sozinha.”
Ainda na adolescência, ela criou a oficina Projeto Hip Hop em uma escola pública da região. Além de MCs, pessoas de outras áreas do hip hop, como o break e o grafite, foram convidadas para ministrar aulas. Os olhos de Becka brilham ao falar com carinho sobre o período. “Meninas que participaram da oficina”, ela lembra, “estão até hoje no meio musical.”
Atualmente tendo que trabalhar para sustentar sua produção musical, Becka não tem mais disponibilidade para realizar esses eventos e oficinas e fala em tom de nostalgia sobre esses momentos. “Esses movimentos levam um pouco de perspectiva para as pessoas. É muito gratificante! Não tenho tanta saudade de batalhar, mas tenho muita saudade de organizar, principalmente, pelas meninas”, conta.
Sendo artista independente, os principais desafios são o financeiro e a falta de reconhecimento, mas é notório que Becka encontra motivação para continuar contribuindo com a formação de novos artistas, pelo impacto que a música traz para a vida das pessoas e para o público que a acompanha.
Becka busca sempre entregar excelência em suas criações. “Pode ter uma pessoa me escutando, mas aquela pessoa está valorizando meu trabalho. Então, eu tenho que ser a melhor para aquela pessoa”. E completa: “As pessoas me dão palavras de incentivo, palavras de amor, e eu não desisto, já é uma coisa minha”, termina com um sorriso.