#Verificamos: Capitão Wagner fez declarações contraditórias sobre motim policial

Andressa M.
EntreFios - tecendo narrativas
7 min readOct 19, 2020

A equipe do EntreFios checou quatro declarações feitas pelo deputado federal e candidato à Prefeitura de Fortaleza durante entrevista à Rádio O Povo CBN em 21 de agosto. Na ocasião, Wagner disse ter se manifestado contra a greve policial em seu perfil do Facebook

Por Andressa Monte, Levi César,
Nathan Sil. Pe. e Pétala Brito

Capitão Wagner é um dos 11 candidatos à Prefeitura de Fortaleza / Reprodução - Facebook

Durante entrevista concedida à Rádio O Povo CBN em 21 de agosto deste ano, o deputado federal e candidato à Prefeitura de Fortaleza Capitão Wagner apresentou propostas do seu plano de governo e fez algumas declarações passíveis de checagem.

Durante a sabatina, quando ele ainda era pré-candidato, foram discutidas questões como o motim dos policiais no Ceará, no início deste ano; o afastamento do deputado estadual André Fernandes de seu cargo na Assembleia Legislativa do Ceará; e a agenda política do pré-candidato.

Nossa equipe apurou algumas dessas afirmações. Entre elas estão a alegação de que o pré-candidato teria se manifestado contrário ao motim policial ocorrido no Ceará, em janeiro deste ano; a consideração do arquivamento da denúncia contra o deputado estadual Nezinho Farias, como pressuposto de inocência; além da menção a valores arrecadados em multas de trânsito na gestão do atual prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio, nos anos de 2013 e 2019.

Nossa equipe de checagem se utilizou da metodologia e das etiquetas de verificação da Agência Lupa, uma agência brasileira de checagem de declarações públicas.

Veja, a seguir, a checagem de cada uma das declarações selecionadas.

VERDADEIRO, MAS…

“[…] Se ele quiser dar uma olhadinha lá em janeiro [no Facebook], ele vai ver que eu me posicionei contrário ao acontecimento do movimento [motim dos policiais]. Eu tô muito tranquilo em relação a isso. Eu quero debater Fortaleza, e as soluções para os problemas da cidade”.

O trecho faz menção à fala de Capitão Wagner durante entrevista à Rádio O Povo CBN, ao ser questionado sobre sua participação no motim de policiais no início deste ano e se iria continuar compactuando com tais manifestações caso seja eleito prefeito.

A alegação do candidato é verdadeira, pois em suas redes sociais, mais especificamente em uma live do dia 21 de fevereiro, no Facebook, foram encontradas manifestações contrárias ao motim da categoria:

“Muita gente está tentando disseminar uma série de inverdades, de fake news. Voltei pro estado do Ceará com a missão de ajudar nessa interlocução e nessa negociação, o papel de cada um está muito claro. Dei entrevista agora há pouco ao jornal O Povo, e na entrevista eu dizia que eu era o menos interessado na greve, para mostrar que eu não queria a greve, foi o que eu quis dizer”, declarou durante transmissão ao vivo pelo Facebook em 21 de fevereiro.

Entretanto, por mais que a alegação do candidato seja verdadeira, ainda são necessárias algumas ressalvas.

Capitão Wagner diz ter se posicionado contrário ao motim em janeiro de 2020. Mas a live em que se diz contra data do dia 21 de fevereiro.

Outra ressalva seria a de que, mesmo o candidato tendo se mostrado contrário ao motim dos policiais em 21 de fevereiro, no mês anterior, em 23 de janeiro, Wagner promoveu uma live em que emite declarações de afronta ao Governo do Estado do Ceará. Essas declarações contribuíram, de certa forma, para a escalada do motim, que, segundo o art.142 da Constituição Brasileira, é inconstitucional. As declarações foram:

“Não querem descontar nove e meio, como tá na lei, não; querem descontar 14%. Olha só que legal o governo do estado do Ceará, o governo do Partido dos Trabalhadores. Bacana, é o partido que defende os trabalhadores [altera o tom de voz, demonstrando ironia]. O mesmo governo que criticou a reforma da Previdência do Bolsonaro e aprovou uma idêntica aqui. Quer cumprir tudo que tem de ruim na lei para o servidor, mas não quer a parte boa, não. A parte boa é que a líquida seria de nove e meio por cento, mas o governo quer cobrar 14, em desacordo com a lei que foi aprovada em Brasília”.

Capitão Wagner complementa:

“[…] Esses mesmos servidores, todos profissionais de segurança, fizeram com que o estado do Ceará fosse destaque em 2019 porque reduziram 56% da violência no estado do Ceará. Com a ajuda de polícias penais, policiais militares, bombeiros militares, policiais civis, todos os profissionais de segurança unidos, todos unidos, conseguiram reduzir em 56% a violência no Ceará. Prêmio? O governador viaja e não anuncia o que prometeu a esses profissionais de segurança [referindo-se a um pronunciamento à imprensa em que Camilo Santana promete uma reestruturação policial]. Pior ainda, poder beneficiar a categoria, com lei federal que ele tem a obrigação de cumprir e não cumpre, isso é improbidade administrativa. Deixar de cumprir uma lei federal, ou melhor, cumprir em parte, na parte ruim ele cumpre, na parte boa ele não cumpre. Aí depois dizem que a gente quer politizar. Eu acho que a gente tá tendo muita paciência, governador”.

Wagner prossegue:

“A gente tem paciência, a gente tenta de alguma forma não partir para esse tipo de postura. Mas essa postura é necessária quando o governo só quer enrolar. Isso é necessário para que todo cidadão cearense saiba a enganação que está ocorrendo com os profissionais de segurança”.

E finaliza:

“Infelizmente estão sendo enrolados pelo Governo do Estado, é isso que está acontecendo. Eu não queria chegar a esse ponto, mas é verdade o que está acontecendo. Ou o governador anuncia o que ele prometeu até o final de janeiro, ou ele tá mentindo”.

Além disso, o pré-candidato também aparece em vídeo entre policiais amotinados. É importante lembrar que movimentos grevistas e de sindicalização por militares, como já dito anteriormente, são considerados inconstitucionais segundo o que estabelece o Art.142 da Constituição Federal de 1988: “ao militar são proibidas a sindicalização e a greve”.

VERDADEIRO, MAS…

“[…] eu não acredito que venha a se repetir um movimento como esse [greves de policiais], não só em Fortaleza, mas em todo o estado do Ceará. A gente teve um movimento em 1997. Depois só em 2011 é que teve um outro movimento. Infelizmente esse fato aconteceu esse ano[…]”.

A afirmação do candidato é verdadeira, pois, de fato, ocorreram movimentos grevistas de policiais no Ceará nos anos de 1997 e 2011.

No entanto, a informação não está completa, pois não cita a greve dos policiais civis em 2016. No ano em questão, agentes da Polícia Civil do estado paralisaram as atividades por duas vezes em um período de dois meses. Entre as reivindicações da categoria estavam melhoria salarial, aumento do efetivo policial e o fim da manutenção de presos nas delegacias do estado.

Segundo as apurações da nossa equipe, o primeiro movimento grevista de policiais no Ceará ocorreu em 1997. Na ocasião, 376 agentes das polícias Militar e Civil se uniram para reivindicar reajuste salarial e melhorias nas condições de trabalho. Já em 29 de dezembro de 2011, às vésperas do Réveillon do ano seguinte, policiais e bombeiros decidiram pela paralisação das atividades após assembleia realizada em um ginásio poliesportivo de Fortaleza. Os dias após a deflagração da greve foram marcados pela sensação de medo e insegurança entre a população. A crise na segurança pública naquele ano atingiu seu momento crítico em 3 de janeiro, quando comércios e empresas fecharam as portas, e ruas e avenidas ficaram desertas.

Segundo a assessoria de imprensa do candidato, a declaração refere-se somente às greves de policiais militares no estado. No entanto, os movimentos grevistas da Polícia Militar ocorridos nos anos citados por Capitão Wagner contaram também com a participação de policiais civis e bombeiros, como citado anteriormente.

VERDADEIRO, MAS…

“Eu acho que a denúncia que o [deputado estadual] André [Fernandes] encaminhou para o Ministério Público, para que fosse investigada, ao ser arquivada, comprova que o deputado [estadual] Nezinho [Farias] não tinha envolvimento com grupos criminosos e, ao mesmo tempo, o encaminhamento foi prudente” .

A declaração checada por nossa equipe é verdadeira, mas carece de mais explicações para atestar sua veracidade.

Quanto ao processo investigativo encaminhado pelo deputado André Fernandes (Republicanos), atualmente afastado do cargo, não há nenhuma comprovação de que o denunciado, o deputado Nezinho Farias (PDT), tenha envolvimento com grupos criminosos, não por presunção de inocência — como afirmado pelo capitão Wagner na declaração supracitada —, mas pela justificativa de que o parlamentar não apresentou indícios ou provas que confirmassem a denúncia apresentada.

Ainda em 2019, o procedimento no MPCE foi protocolado, porém arquivado, sem prejuízo de instauração de um novo inquérito diante de fatos que assim justifiquem.

Por essa razão, não é certo julgar a ação como prudente. As acusações de André Fernandes trouxeram inquietação entre assessores e deputados da Assembleia Legislativa do Ceará (AL-CE), resultando na convocação do Conselho de Ética da casa, o qual, por unanimidade, aprovou a suspensão do mandato do parlamentar e encaminhou desfecho para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) para a confirmação da suspensão. Após complicações logísticas oriundas da pandemia da Covid-19, o caso foi, enfim, julgado e finalizado em votação na sessão plenária de 20 de setembro, com 29 votos a favor da suspensão entre os 43 deputados presentes.

EXAGERADO

“[…] Eu posso citar, por exemplo, no ano em que o Roberto Cláudio assumiu a Prefeitura [de Fortaleza], ele arrecadou R$ 35 milhões […]”.

Em relação à primeira afirmação analisada, o pré-candidato à Prefeitura de Fortaleza afirma que, em 2013, ano em que Roberto Cláudio assumiu a gestão da capital cearense, foram arrecadados R$ 35 milhões em multas de trânsito pela prefeitura.

Nossa equipe verificou no Portal da Transparência de Fortaleza que o valor total arrecadado foi de R$ 30.189.762,80 milhões. Não foi, portanto, exatamente os R$ 35 milhões afirmados pelo candidato.

SUBESTIMADO

“[…] Em 2019, foram R$ 148 milhões [arrecadados pela AMC]”.

Já em relação à segunda declaração checada por nossa equipe, Capitão Wagner afirma também que em 2019 foram arrecadados R$ 148 milhões em receita para a Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC).

De acordo com o Portal da Transparência, o valor foi de R$ 158.946.309,01 em multas. Mais uma imprecisão de dados encontrada em suas declarações críticas à atual gestão da Prefeitura de Fortaleza.

INSUSTENTÁVEL

“[…] e ele [Roberto Cláudio] fechou as três escolas de trânsito que existiam na cidade […]”

Por último, Capitão Wagner afirma que o prefeito fechou as três escolas de trânsito que existiam em Fortaleza. Nossa equipe de checagem não encontrou dados públicos relevantes que comprovem a veracidade dessa informação.

De acordo com a assessoria de comunicação do candidato à Prefeitura de Fortaleza, todos os valores mencionados por ele foram retirados do Portal da Transparência da cidade.

No entanto, a equipe do EntreFios constatou que os dados apresentados no portal não correspondem aos citados por Capitão Wagner.

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Andressa M.
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