Em debate sobre PL das Fake News, Priscila Costa argumenta com base em informações falsas

Bianca Raynara
EntreFios - tecendo narrativas
5 min readJun 16, 2023

A vereadora do Partido Liberal (PL) participou de entrevista na TV Assembleia, onde criticou o texto do Projeto de Lei 2630/2020 e propagou desinformações

Por Antônio Eudes, Bianca Raynara,
Mauricio Ruan Izidorio, Victor Marinho

Vereadora Priscila Costa em entrevista à TV Assembleia

A equipe do EntreFios checou quatro declarações concedidas pela vereadora Priscila Costa, líder do Partido Liberal (PL) na Câmara Municipal de Fortaleza, durante uma entrevista à TV Assembleia no programa Um Lugar de Fala sobre o Projeto de Lei das Fake News (PL 2630).

O programa foi ao ar em 8 de maio de 2023 e, além da presença da vereadora, contou com a participação da deputada Lia Gomes (PDT) e do professor da Unifor e procurador do município de Fortaleza Martônio Mont’Alverne. Durante a entrevista, Priscila criticou o projeto de lei e ainda fez apontamentos sobre fake news propagadas no período da pandemia de covid-19.

As etiquetas e o método utilizados para esta checagem são as mesmas da Agência Lupa, agência brasileira destinada a checar informações públicas.

Confira, a seguir, a checagem das declarações proferidas pela vereadora em maiores detalhes:

Falso

“O PL 2630 quer terceirizar o que seria responsabilidade da nossa Justiça brasileira e dá para as redes sociais o poder de polícia”.

O projeto de lei não implica em nenhuma transferência de responsabilidade do sistema judicial brasileiro. Em vez disso, ele busca estabelecer diretrizes para que as plataformas digitais atuem em conformidade com a lei e de maneira responsável na moderação de conteúdo. O PL também visa promover maior transparência no processo de moderação atualmente adotado.

Embora as redes sociais fiquem incumbidas de tomar medidas para combater a disseminação de desinformação e conteúdo ilegal, elas não exerceriam funções policiais propriamente ditas, como diz a vereadora, e continuariam respondendo ao Judiciário brasileiro.

Os primeiros rascunhos do projeto incluíam a criação de uma entidade autônoma ligada ao Estado para regular essas plataformas. No entanto, essa proposta foi removida do texto atual devido à resistência encontrada na Câmara dos Deputados. Contudo, ainda há estudos em andamento para avaliar a possibilidade de órgãos e entidades que possam desempenhar essa função.

Falso

“ O PL 2630 previa, por exemplo, punir apenas plataformas que tivessem até 10 milhões de inscritos, agora atualizaram, botaram 2 milhões de inscritos”.

A não aplicação da lei a provedores que oferecem serviço de rede social com menos de 2 milhões de usuários é do texto original do projeto. Não foi uma “atualização” do projeto, como foi dito pela vereadora. A aplicação da lei para redes sociais com número superior a 10 milhões foi uma proposta do deputado Orlando Silva, até então relator do projeto.

Apesar da lei não se aplicar a redes sociais com número inferior a 2 milhões de usuários registrados, ainda sim o projeto prevê o uso da lei como um parâmetro para aplicação de programa de boas práticas para estas redes sociais com número “inferior”.

Segundo o projeto de lei, as boas práticas visam combater a desinformação, a liberdade de expressão e de imprensa; a garantia dos direitos de personalidade, dignidade, honra e privacidade; o respeito à formação de preferências políticas e de uma visão de mundo pessoal do usuário; o compartilhamento da responsabilidade de preservação de uma esfera pública livre, plural, diversa e democrática; a garantia da confiabilidade e da integridade de sistemas informacionais; a promoção do acesso ao conhecimento de assuntos de interesse público; a proteção dos consumidores; e a transparência nas regras para anúncios e conteúdos patrocinados.

Verdadeiro, mas…

“O Butantan postou em suas redes sociais oficiais que não seria necessário a terceira dose da vacina [contra o coronavírus]. E quem estivesse falando sobre isso deveria ser acusado de fake news”.

Ao defender que o PL 2630 faz parte de um projeto institucional de censura, a vereadora se utiliza de exemplos que, segundo ela, poderiam ser vetados pelo projeto, se aprovado. A principal argumentação durante o debate é o questionamento de quem escolheria o que é fake news ou não. Com base nisso, a parlamentar cita a publicação oficial do Instituto Butantã em 2021 ao afirmar que a terceira dose da vacina contra o coronavírus não seria necessária.

“O Butantan esclarece que não será necessária uma terceira dose da vacina contra a Covid-19. Afirmar isso é disseminar Fake News. A Coronavac é segura e eficaz após o ciclo de duas doses e mais 15 dias, conforme apontam vários estudos”, relata parte da publicação.

A vereadora não mentiu. A publicação realmente foi feita pelo instituto em abril daquele ano de 2021. Entretanto, o conteúdo publicado pelo Butantan não foi exposto por completo no discurso de Priscila. Apesar do instituto afirmar que a terceira dose não seria necessária, na mesma publicação esclareceu que um estudo para uma atualização da vacina com o objetivo da aplicação de uma nova dose está sendo desenvolvido.

“O que o Butantan estuda é atualização da vacina, com a possibilidade de, no próximo ano, aplicar uma outra dose, em razão das novas cepas e da evolução da doença, como ocorre com a vacina da Influenza”, justificou o instituto.

A afirmação de Priscila também se contradiz em 2023, visto que, em orientação recente na página oficial do Butantan, recomenda a aplicação de duas doses de reforço.

Falso

“(…) Porque, por exemplo, você dizer que quem relacionou vacina com AVC foi o presidente Bolsonaro é até uma falta de informação da deputada, porque quem relacionou AVC com a vacina foi CDC e FDA América”.

A fala de Priscila contradiz as informações divulgadas no site do Centers for Disease Control (CDC) e do U.S. Food and Drug Administration (FDA). Ambas as instituições buscam propor um esclarecimento à população após a suposição da relação entre o aumento de casos de AVC com a vacina de covid-19, ressaltando a possibilidade mínima da ocorrência de casos, que geralmente está atrelado a problemas de saúde preexistentes.

No Brasil, o ex-presidente da república Jair Bolsonaro, durante uma declaração à imprensa no Rio de Janeiro em dezembro de 2021, relaciona a vacina com casos de AVC, embolia e trombose. A CDC e FDA, por seus meios de comunicação, negam que haja relação da vacina com o problema.

“Nem a Pfizer e a BioNTech nem o CDC ou a FDA observaram descobertas semelhantes em vários outros sistemas de monitoramento nos EUA e globalmente e não há evidências para concluir que o acidente vascular cerebral isquêmico esteja associado ao uso das vacinas contra a COVID-19 das empresas”.

A equipe do EntreFios tentou contato com a assessoria de Priscila Costa para oferecer espaço para se retratar sobre as etiquetas atribuídas às declarações da vereadora, mas não obteve resposta até a data desta publicação (16 de junho de 2023).

--

--