Luizianne Lins faz declarações imprecisas sobre período à frente da prefeitura de Fortaleza

Gustavo Meneses
EntreFios - tecendo narrativas
7 min readOct 28, 2023

EntreFios checou informações apresentadas pela ex-prefeita da capital cearense e hoje deputada federal pelo PT, em entrevista ao PontoPoder, do Diário do Nordeste, em 31 de agosto

Por Alice Barbosa, Ellen Araújo,
Gustavo Mesquita,
Hudson Vieira e Rita Izabele

Luizianne Lins em entrevista ao PontoPoder / Reprodução

A equipe do EntreFios checou seis declarações proferidas pela deputada federal Luizianne Lins, do Partido dos Trabalhadores (PT), em entrevista ao Programa PontoPoder, do Diário do Nordeste, no dia 31 de agosto.

Ex-prefeita de Fortaleza, Luizianne falou sobre tópicos pertinentes ao seu governo e sobre sua pré-candidatura para prefeita de Fortaleza nas eleições de 2024 e citou informações inconsistentes sobre seu governo.

A checagem foi realizada utilizando as etiquetas e o método de checagem da Agência Lupa, uma das principais agências de fact-checking do Brasil.

Confira, a seguir, as declarações checadas.

FALSO

Fortaleza ficou 7 dos 8 [anos] que eu governei em primeiro lugar no Nordeste em turismo.”

Luizianne governou a cidade durante dois mandatos, de 2005 a 2012, e, em todos os oito anos, a cidade de Salvador, capital da Bahia, ocupou o primeiro lugar da região Nordeste nos Anuários do Turismo, disponibilizados pelo Ministério do Turismo. Fortaleza aparece na segunda posição em todos os oito anos do mandato de Luizianne.

De acordo com esses anuários, os dados são coletados a partir de diversas fontes, como órgãos oficiais de turismo, pesquisas de visitantes, dados econômicos e outros indicadores relevantes.

Esses anuários compilam informações de diferentes estados e municípios, fornecendo uma análise abrangente do desempenho turístico. No caso da ex-prefeitura de Fortaleza, a manutenção da Bahia como líder no Nordeste em turismo durante os anos em que ela governou é comprovada pelos números e pelas estatísticas consistentes disponíveis, refutando sua afirmação de que Fortaleza ocupou o primeiro lugar na maioria dos anos.

INSUSTENTÁVEL

[…] Nós estamos tentando juntar todas as produções acadêmicas que foram feitas durante o nosso governo. Eu comecei a olhar, eu fiquei muito impressionada. De índices dos mais significativos que baixaram, que não têm nada a ver diretamente com a prefeitura, como violência. Uma pesquisa feita na Regional 5, que é aquela região encostando em Maracanaú, mostra os índices de que é um dos lugares mais violentos, digamos assim, e o impacto das nossas políticas naquela região: o índice de violência caiu.”

A fala proferida por Luizianne sobre a queda da violência na Regional 5 de Fortaleza possui uma certa base, uma vez que, em 2010, foi realizada uma pesquisa intitulada “Cartografia da Criminalidade e da Violência na Cidade de Fortaleza”, realizada pelos pesquisadores Glaucíria Mota Brasil, Rosemary de Oliveira Almeida, César Barreira e Geovani Jacó de Freitas.

A pesquisa foi realizada por pesquisadores do Laboratório de Direitos Humanos, Cidadania e Ética (LABVIDA) e Laboratório de Estudos da Conflitualidade e Violência (COVIO), ambos da Universidade Estadual do Ceará (Uece), e do Laboratório de Estudos da Violência (LEV) da Universidade Federal do Ceará (UFC) com apoio da Guarda Municipal e da Defesa Civil de Fortaleza, contando com recursos da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) do Ministério da Justiça e da Prefeitura Municipal de Fortaleza (PMF).

Essa pesquisa, que possui como período de amostra os anos de 2007, 2008 e 2009, anos em que Luizianne era prefeita de Fortaleza, mostra que, apesar de bairros específicos como o Bom Jardim terem diminuído o número de mortes ao longo desses três anos, a Regional 5 como um todo não teve uma diminuição de casos de violência letal, e sim uma queda no período de 2007 para 2008, sendo 207 homicídios em 2007 e 196 em 2008, havendo, contudo, uma elevação no número de mortes por homicídio em 2009, com 237.

Nossa equipe de checagem, no entanto, não encontrou uma pesquisa que correspondesse à fala da deputada e que mostrasse os índices de violência na Regional 5 durante todos os oito anos de governo de seu governo; portanto, a declaração não pode ser comprovada, tornando-a insustentável.

INSUSTENTÁVEL

“Deixamos, na época, dez anos atrás, R$ 3 bilhões contratados dos bancos BID [Banco Interamericano de Desenvolvimento], Bird [conhecido como Banco Mundial] e a CAF [Banco de Desenvolvimento da América Latina], que é a Central Andina de Fomento, que foram os empréstimos que na época a gente fez para viabilizar as obras, inclusive a da Beira Mar […]”

Apesar das instituições financeiras citadas pela ex-prefeita de Fortaleza já terem de fato financiado projetos para a realização de obras na infraestrutura da cidade. Incluindo, em 2012, um financiamento de 50 milhões de dólares (cerca de 100 milhões de reais à época) por parte da CAF para realização de obras na Avenida Beira-Mar e na Praia do Futuro em um investimento total de 100 milhões de dólares. A própria prefeitura financiou a outra metade do valor.

Há também um contrato de empréstimo entre a CAF e a Prefeitura de Fortaleza feito em outubro de 2011 no valor de 45 milhões de dólares (aproximadamente 80 milhões de reais na cotação da época). O empréstimo foi solicitado pela prefeitura para, segundo o documento, financiar parcialmente o Programa Municipal de Drenagem Urbana de Fortaleza. A CAF considerou o projeto elegível para o seu Programa de Apoio a Governos Municipais (PRAM).

No entanto, não há nenhum documento de acesso público que comprove com precisão a realização de empréstimos desses bancos citados para os cofres da prefeitura que cheguem ao valor que a deputada afirma terem sido contratados, tornando, portanto, a declaração da prefeita insustentável, pela falta desses documentos que comprovem com exatidão o recebimento desse montante citado.

VERDADEIRO, MAS…

[…] Inclusive vou lhe dar um dado, que eu acho que vocês têm uma grande audiência, é bom que se diga. No poder 360, que é um de comunicação, de notícia e tudo, agora recentemente em julho [de 2023], eu acho, teve uma pesquisa, eu nem me lembrava mais dela, mas eu hoje, entre os prefeitos, os candidatos a prefeito das capitais brasileiras, o meu nome é o nome que aparece mais na frente do PT, do PT todo do Brasil, sai com 27% na pesquisa do Poder360.”

A pesquisa realizada pelo portal digital Poder360 trouxe à tona os nomes dos candidatos favoritos à eleição para o ano de 2024. A afirmação feita pela candidata é, de fato, verdadeira, porém, equivocada em sua interpretação. É possível verificar a presença da candidata na lista, com uma porcentagem de apoio de 27%, em comparação com outros candidatos do mesmo partido que possuem porcentagens inferiores. No entanto, o equívoco ocorre quando a entrevistada faz referência a números que não podem ser diretamente comparados, uma vez que não pertencem a uma única pesquisa unificada.

Os dados citados indicam a porcentagem de uma possível reeleição em comparação com outros candidatos à prefeitura de Fortaleza. Essa pesquisa foi realizada pelo instituto Paraná Pesquisas, com um campo amostral de 742 eleitores entrevistados durante os dias 20 a 23 de abril de 2023. O infográfico divulgado pelo portal de comunicação Poder360 foi criado a partir dessa pesquisa e outras de temática similar. Essas análises foram selecionadas com base em critérios rigorosos, dando prioridade à reputação da empresa responsável pela pesquisa, ao número de entrevistados, à data de realização da pesquisa, à margem de erro e ao grau de confiança.

Portanto, a informação fornecida pela candidata seria totalmente verídica em um cenário em que ela estivesse fazendo referência a uma possível reeleição para a prefeitura de Fortaleza. No entanto, ela não é correta quando se trata de comparar o favoritismo entre candidatos do mesmo partido ou em detrimento de outro candidato, uma vez que as porcentagens se referem a pesquisas diferentes, e não podem ser diretamente comparadas.

FALSO

“Nós diminuímos 50% da mortalidade materna, era praticamente o dobro do nacional.”

Luizianne Lins está se referindo, nessa citação, à sua gestão de oito anos como prefeita de Fortaleza, de 2005 a 2012, quando, de acordo com ela, foi reduzida a mortalidade materna em 50% na capital cearense. Embora ela não tenha especificado o órgão ou a instituição responsável pela pesquisa, e em que período exato essa redução da taxa de mortalidade materna ocorreu durante seu mandato, a afirmação acima é falsa, visto que os dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) demonstram que houve aumento de -11,02% da mortalidade materna em Fortaleza, em comparação ao mandato de oito anos do ex-prefeito Juraci Vieira de Magalhães (1997–2004). A nível nacional também houve um crescimento de -2,38% no índice de mortalidade materna em todo o país.

EXAGERADO

“[de 2005 a 2012, houve redução de] 75% da mortalidade infantil [em Fortaleza], praticamente o dobro [da redução] do nacional”.

Constatou-se que a citação acima é exagerada. Após a apuração e análise aprofundada a partir do Painel de Monitoramento da Mortalidade Infantil e Fetal (DATASUS) referente aos oito anos em que Luizianne Lins administrou a prefeitura de Fortaleza (2005–2012), em comparação à gestão anterior do ex-prefeito Juraci Magalhães (1997–2004), verificou-se que houve diminuição da mortalidade infantil em Fortaleza. Contudo, a porcentagem foi 40,09%, e não 75%. Com relação ao índice nacional de mortalidade infantil, entre os anos 2005 e 2012, em comparação aos anos 1997 a 2004, ocorreu redução de 31,47%.

Tabela feita por Alice Barbosa. Fonte: Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS)

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Gustavo Meneses
EntreFios - tecendo narrativas

Estudante de Jornalismo na UFC. Tentando aprender a viver. E falhando.