Me formei, e agora?

Pedro Mairton
EntreFios - tecendo narrativas
5 min readApr 13, 2021

As incertezas sobre o mercado convencional fez o jornalista recém-formado Henderson Levy Lopes enxergar um vasto caminho de possibilidades na área da comunicação como um todo

Por Pedro Mairton

Henderson Levy em sua passagem como estagiário da Rádio Band News FM / Arquivo pessoal

De casa, como mandam esses tempos de pandemia, Henderson cria artes digitais em seu computador para a divulgação de uma nova marca do contratante de seus serviços.

Trabalhando atualmente na área de marketing e social media, ele pretende se especializar em design digital, pois acredita que pode desenvolver uma carreira mais bem-sucedida do que sua formação atual: jornalista.

Apaixonado por futebol e principalmente pelo Ceará Sporting Club, ele sonhava em ser jogador de futebol ainda quando criança. Atualmente com 23 anos e residente do bairro Barroso, em Fortaleza, foi na adolescência que Henderson encontrou no jornalismo a possibilidade de ampliar suas fronteiras e abraçar o esporte como um todo, pois seu sonho de ser jogador havia se transformado em repórter de campo, almejando poder acompanhar a emoção de uma partida de futebol de uma perspectiva única e eternizá-la a partir de suas crônicas esportivas.

Estudante de escola pública no ensino médio e morador de periferia, Henderson conseguiu uma bolsa integral de estudos por meio do Programa Universidade Para Todos (Prouni) e ingressou na Universidade Estácio de Sá, onde se formou em 2020, em meio à pandemia.

Foi uma formação bastante gratificante, ele avalia, na qual adquiriu uma vasta experiência jornalística por meio de projetos de extensão, nos quais realizava a cobertura de jogos de basquete pelo NBB junto com outros colegas, além das demais atividades da área.

Em seu estágio obrigatório, teve a oportunidade de trabalhar na Rádio Band News FM, atingindo o ápice da chama que iluminava seu coração rumo ao jornalismo. Hoje, contudo, essa chama se encontra apagada e sem expectativas de reacender.

Foi durante sua transição de aluno para profissional que Levy se surpreendeu negativamente pela primeira vez com as perspectivas de sua carreira no jornalismo. Ele se deparou com a realidade que afeta quase 4 milhões de formados no ensino superior no Brasil desde meados da última década: a ausência de emprego de alta qualificação. Com a pandemia, o cenário só piorou.

Enquanto batalhava por uma vaga nos veículos de comunicação na capital, Levy também lamentava outra situação ainda comum na sua área de formação: o cargo de jornalista para indivíduos sem diploma. Desde 2009, quando o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), tornou inconstitucional o Decreto Lei n. 972/69, que até então regulamentava a profissão de jornalista, foi permitido que qualquer cidadão exerça essa atividade profissionalmente, mesmo sem qualquer tipo de especialização no meio. Uma medida questionável, para não dizer absurda, pois a intitulação de qualquer pessoa como jornalista ajudou a provocar os problemas de desinformação em massa que ocorreram na década seguinte e que seguem ocorrendo.

[…] o diploma deveria ser um ponto a mais para me garantir uma oportunidade de emprego. […] Se a própria área não valoriza o diploma, ninguém mais valorizará.

Essa frustração não atinge somente Levy, mas também outros tantos formados que desabafam sobre as grandes expectativas não correspondidas sobre o ramo jornalístico em fóruns do Facebook ou até mesmo em rodas de conversa com colegas do curso. Por conseguinte, a busca pela valorização do diploma acaba sendo desgastante e cheia de incertezas, acarretando um abandono da área do jornalismo rumo a outras profissões que concedam mais garantias.

A valorização do diploma e a ampliação de oportunidades para recém-formados são essenciais para a valorização da profissão de jornalista, argumenta Levy, que vê o curso como elemento fundamental para o exercício de uma atividade que trabalha com a verdade, principalmente em tempos de desinformação e polarização política.

De fato, quando uma empresa de comunicação arrisca contratar um funcionário não formado na área, ela corre o risco de não se comprometer com o exercício da informação de qualidade e com a ética jornalística, uma vez que o indivíduo não passou por um processo de formação que o fornecerá conhecimento para lidar com pós-verdades e situações em que a conduta jornalística deve ser bem aplicada.

Portanto, para mudar essa realidade, Levy aponta que os meios de comunicação são os principais responsáveis pela valorização da área, uma vez que, em tese, jornalistas seriam comprometidos com o exercício da verdade, indo de encontro à propagação de boatos e ao falso conteúdo jornalístico nos sites de redes sociais, potencialmente capazes de mover até mesmo eleições.

Embora não tenha os mesmos olhos para a área e nem acredite em uma mudança brusca a curto e médio prazo, Levy não incentiva que os estudantes do curso revejam seus conceitos sobre jornalismo, muito pelo contrário. Ele aconselha que os alunos aproveitem ao máximo a sua graduação, engajando-se em projetos de extensão e também usufruindo dos sites de redes sociais para divulgarem seus produtos jornalísticos, como blogs, vlogs, podcasts, entre outros. Quanto mais contato o estudante tiver com a profissão, mais próximo estará de alcançá-la. A prática, ele conclui, é aliada do bom profissional da comunicação, e com ela você adquire a experiência necessária para se destacar em um bom estágio e, consequentemente, em um bom trabalho.

A formação em jornalismo não foi um desperdício para Levy, uma vez que adquiriu técnicas de comunicação e condutas éticas ao longo de sua formação, o que colabora para seu emprego atual e para suas ambições futuras, que permanecem na área de comunicação social. Dessa maneira, embora desiludido com suas pretensões de quando era mais novo, ele não se deu por vencido e aprendeu a explorar as inúmeras oportunidades para as quais seu curso foi capaz de direcioná-lo: a um novo sonho.

Bastante cético em relação a seu futuro na profissão de jornalista convencional, somente com uma valorização significativa do trabalho ele reveria seus conceitos sobre a área à qual tanto se dedicou por quatro anos. Ele segue, contudo, deixando seu futuro em aberto para possíveis (boas) oportunidades. Enquanto não redige a história de sua carreira profissional no jornalismo, ele percorre esperançosamente o abrangente caminho de possibilidades que a área da comunicação é capaz de proporcioná-lo.

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