Pesquisa em comunicação: o que os estudantes de Jornalismo estão produzindo em seus projetos

Arthie Almeida
EntreFios - tecendo narrativas
4 min readNov 18, 2022

Alunos de Jornalismo da UFC podem defender trabalhos de conclusão de curso (TCC) em formato de monografia ou de produto jornalístico, a exemplo de livros-reportagem e documentários audiovisuais

Por Francisco de Assis Sales

Livro-reportagem feito por Gabriela Almeida e Juliana Teixeira / Reprodução: Site Meninos do Curió

O curso de Jornalismo da Universidade Federal do Ceará (UFC) determina como atividade obrigatória do currículo a apresentação de um trabalho de conclusão de curso (TCC) ao final do 8º semestre. Esse trabalho pode ser apresentado no formato de monografia ou de produto jornalístico. Sem apresentar essa atividade final, o aluno não pode colar grau.

Além disso, é comum que professores das disciplinas dos semestres finais solicitem aos alunos produtos jornalísticos como atividade para a avaliação. Assim, disciplinas de jornalismo audiovisual pedem produtos construídos naquele formato específico que tanto podem ser feitos individualmente, como em grupo. Jornais impressos, revistas impressas, programas de rádio, podcasts, documentários, crônicas jornalísticas são então produzidos em laboratórios do curso e orientados pelos docentes.

A ideia desta reportagem é identificar o perfil das pesquisas realizadas pelos concludentes, apresentando como as escolhas acontecem, como são estabelecidos os critérios metodológicos, o recorte abordado e a participação dos professores do curso. Vamos destacar aqui dois trabalhos recentes e que foram bem avaliados pelos professores nas bancas de TCC.

Muitos estudantes têm escolhido apresentar seus trabalhos nos semestres finais do curso no formato de livro-reportagem. Esse formato pode ser definido como um produto impresso ou digital, podendo ser apenas textual, fotográfico, gráfico ou ainda equilibrar em um mesmo projeto esses três gêneros. É um formato que cresce em interesse a cada ano. Quando examinamos o site do curso de Jornalismo da UFC, na aba produções, por exemplo, observamos 59 livros-reportagem feitos durante o período de 2010 a 2018. Se em 2010, primeiro ano da estatística, anotou-se a defesa de um livro-reportagem apenas, foram registrados, em 2017, dez trabalhos nesse formato, ganhando, portanto, preferência entre os estudantes.

O transporte público como objeto de estudo

Alexandre Valério Ferreira é um dos concludentes que optou pelo livro-reportagem para seu TCC. Em 2021, utilizando recursos próprios e um financiamento coletado por meio da internet, Alexandre produziu o livro “028: Antônio Bezerra, Papicu e outras histórias”. Sensível e poética, a reportagem registra a vida de usuários de uma linha de ônibus que cobre parte significativa da cidade de Fortaleza e que era o meio que o estudante utilizava para se deslocar para o Centro de Humanidades da UFC, no bairro Benfica. O livro apresenta ricos depoimentos com fotografias, tudo muito bem embalado em um projeto gráfico sofisticado, idealizado e realizado pelo próprio Alexandre.

Alexandre lembra que o trajeto que fazia foi ganhando dimensão a partir dos estudos na graduação a respeito do que pode ou não pode ser registrado jornalisticamente. “Inicialmente, eu pensei que esses meus registros não teriam consistência para ser nem uma pequena reportagem. Olha no que deu, virou um livro”, relata ele.

Meninos do Curió

Em 2021, Gabriela Almeida e Juliana Teixeira apresentaram como TCC o livro de crônicas “Meninos do Curió — crônicas de memória e resistência’’. As estudantes partiam de um fato jornalístico específico, a Chacina do Curió, como ficou conhecido nacionalmente o episódio em que policiais descaracterizados assassinaram 11 pessoas e deixaram sete feridas no bairro Curió, bairro periférico de Fortaleza, em 12 de novembro de 2015. As crônicas têm por base os relatos de dor e de revolta daqueles que perderam filho, namorado, amigo ou irmão.

Segundo as autoras, o livro foi escrito com o claro objetivo de fazer juz à memória dos jovens assassinados, memória essa que resiste graças à força da dor e do desejo de justiça das mães dos chacinados. A história tão bem escrita por Gabriela e Juliana se agiganta porque elas não aceitam o silêncio imposto pela mídia e pelo poder público ao acontecimento que matou os jovens e porque abre espaço para a dor e o clamor das pessoas próximas à Jardel, Alef, Alisson e Renayson, quatro das vítimas da Chacina. São 129 páginas de descrições afetuosas, saudosas, cheias de precisão e cuidado literário e jornalístico.

Os desafios de quem precisa conciliar aulas, estágio e pesquisa acadêmica

Quando conversamos com um estudante concludente ainda no meio do trajeto de construção de seu produto, podemos observar os desafios e a atuação do orientador na escolha do tema. Danrley Pascoal, aluno do 8º semestre, inicialmente pensou para o seu TCC a discussão e a análise, através de um estudo de caso, da campanha comunicativa de um candidato nas eleições de 2022.

Seu orientador, ao saber da proposta, colocou algumas questões de natureza ética que fizeram Danrley repensar seu tema. O professor temia que o resultado da pesquisa pudesse ser usado no futuro para fins eleitoreiros, o que seria ruim tanto para o candidato como para o próprio aluno. Levando em consideração essa ponderação, o estudante então resolveu mudar de tema e passar a discutir os efeitos da mídia nas campanhas eleitorais e no voto do eleitor, decisão que foi acolhida por seu orientador.

Além dos desafios próprios de uma pesquisa, o quixadaense que mora numa residência universitária da UFC no bairro Benfica, reclama do pouco tempo que tem para trabalhar e pesquisar outras produções sobre o tema. Danrley, além de estudante, é estagiário do Jornal O Povo e, como todo concludente nesse período da vida acadêmica, precisa equilibrar tempo, saúde e disposição para a conclusão de sua graduação. Frequentar aulas, cumprir horários de estágio e ainda pesquisar um TCC exigem muito dele, que não desanima: “Quero fazer mestrado no exterior estudando comunicação e política”.

Edição: Stella Almeida

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