Roberto Cláudio usa informações questionáveis para defender gestão Sarto e criticar governo Elmano

Maria Clara Carneiro
EntreFios - tecendo narrativas
7 min readMay 27, 2023

O EntreFios checou informações apresentadas pelo ex-prefeito de Fortaleza, no dia 20 de abril, em entrevista ao programa PontoPoder, do Diário do Nordeste

Por Ana Massonila, Ismael Camurça,
Helder de Sousa Sena Júnior,
Maria Clara Nascimento e
Yuri Gomes

Roberto Cláudio em entrevista ao PontoPoder / Reprodução

A equipe do EntreFios checou cinco declarações feitas pelo ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio, do Partido Democrático Trabalhista (PDT), em entrevista ao programa PontoPoder, do Diário do Nordeste, no dia 20 de abril.

Na ocasião, Roberto falou sobre as estratégias do PDT para o pleito municipal de 2024 e se utilizou de informações inconsistentes para defender o governo de seu correligionário e atual prefeito da capital cearense, José Sarto Nogueira, e para criticar a gestão estadual do governador Elmano de Freitas (PT), seu adversário nas eleições de 2022.

A checagem foi realizada utilizando as etiquetas e o método de checagem da Agência Lupa, uma das principais agências de fact-checking do Brasil.

Confira, a seguir, as checagens das declarações.

INSUSTENTÁVEL

“Tem um projeto lançado em parceria do Sarto com o ex-governador [do Ceará Camilo Santana, do PT] chamado Mulheres guerreiras de microcrédito (…) [que] tá interrompido pelo atual governo [do governador Elmano de Freitas, também do PT], o repasse”.

Coordenado pela Secretaria Municipal do Desenvolvimento Econômico, o programa conhecido popularmente como “Nossas Guerreiras” diz respeito a uma iniciativa da Prefeitura Municipal de Fortaleza em parceria com o Governo do Estado, na época sob o comando de Camilo Santana (PT), com o objetivo de fornecer crédito orientado para mulheres fortalezenses de baixa renda que desejam começar a empreender. A lei municipal nº 11.181, que se refere ao programa, foi sancionada em 5 de novembro de 2021 pelo atual prefeito José Sarto e segue o edital nº 7999, cuja validade entrou em vigor no dia 14 de dezembro de 2021.

Até maio de 2023, o programa já havia beneficiado um total de 7,5 mil mulheres em Fortaleza e os últimos registros de inscrições abertas para interessadas estão datados de março do mesmo ano. No dia 10 de março de 2022, a Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) tramitou a PL n° 34/22, um projeto de lei que autorizava a abertura de crédito especial, no valor de R$ 136,6 milhões, para o apoio de ações municipais, incluindo o Programa Nossas Guerreiras. Os recursos deveriam sair do Fundo Estadual de Combate à Pobreza (Fecop). O último reajuste de verba referente ao Programa Nossas Guerreiras de que se tem registro é o do dia 20 de dezembro de 2022, quando a Alece aprovou um projeto de lei complementar, a PLC nº 28/22, que visava ao reajuste do valor originário e do prazo para o repasse da verba destinada ao programa de empreendedorismo feminino. Não há registros de documentação pública que comprove a interrupção de repasses de verbas destinada à iniciativa pelo atual governo de Elmano de Freitas.

SUBESTIMADO

“Pro bem da saúde de Fortaleza, que é a saúde do (estado do) Ceará, são dez hospitais. Salvador tem um hospital municipal, as capitais de médio e grande porte têm um ou dois hospitais municipais, aqui (Fortaleza) existem dez”.

Roberto Cláudio está correto quanto ao número de hospitais municipais em Fortaleza e Salvador. Contudo, é bastante impreciso ao falar que as capitais de médio e grande porte têm um ou dois hospitais municipais, visto que existem casos em que este número é superior.

A princípio, o político cita o conceito de “capitais de médio e grande porte”. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio do relatório denominado de Regiões de Influências das Cidades 2018, definiu a hierarquia urbana em cinco níveis: metrópoles, capitais regionais, centros sub-regionais, centros de zona e centros locais. A concepção estabelecida por Roberto Cláudio se identifica com as noções de metrópoles e capitais regionais. São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre são exemplos da primeira. Cuiabá se enquadra na segunda, assim como João Pessoa.

Conforme apuração da equipe, a capital paulista conta com 18 hospitais municipais; a carioca, com 17; na gaúcha, são três, igualmente em Cuiabá, com três; por fim, na capital da Paraíba, são cinco. Desse modo, a informação, apesar de trazer dados reais sobre Fortaleza e Salvador, subestima o número de hospital de outras cidades brasileiras.

VERDADEIRO, MAS…

“(…) Hoje, o preço da tarifa que o prefeito Sarto conseguiu segurar com o apoio do governo [estadual] anterior [de Camilo Santana] a partir do subsídio que conseguiu aumentar o preço da tarifa, agora o convênio não foi pago”.

Quando Roberto Cláudio (PDT) afirma que o prefeito Sarto “conseguiu segurar” o preço da tarifa, ele se refere à proposta do sindicato dos ônibus (Sindiônibus) de aumentar o preço para R$ 5,40, onde ocorreram negociações entre a Prefeitura de Fortaleza, o Governo do Estado do Ceará e as empresas de ônibus para manter a tarifa em R$ 4,50 para a tarifa inteira e R$ 1,50 para a meia tarifa.

Em relação ao convênio não pago, Roberto Cláudio diz que o governo do estado não realizou pagamentos do subsídio avaliado em R$ 3 milhões/mês para o transporte público de Fortaleza, o que Sarto (PDT) afirma ser o motivo principal para o reajuste da tarifa em março de 2023.

Contudo, o governo estadual informou, em uma nota, que mantém um apoio ao transporte público de Fortaleza com o valor estimado em mais de R$ 30 milhões por ano, por meio da redução de 66% na base de cálculo do ICMS do Diesel pelas empresas de transporte urbano. Ele ainda acrescenta que não há convênio vigente com a Prefeitura de Fortaleza para repasse extra de recursos para essa área.

Na nota, também é informado que, em 2021, o governo do Ceará assinou repasses extras de recursos para a área do transporte público, o que foi cumprido integralmente. E que, em 2022, o governo do estado ampliou o suporte financeiro para outras áreas do município com repasses de R$ 72 milhões/ano.

INSUSTENTÁVEL

“(…) Fortaleza, hoje, só o IJF atende metade do público do interior. Se você for checar, os Gonzaguinhas e Frotinhas que fazem fronteira hoje com a Região Metropolitana [de Fortaleza], Nossa Senhora da Conceição, boa parte do público atendido é dos municípios da Metropolitana, aqui e acolá, do interior”.

A fala proferida por Roberto Cláudio sobre o Instituto Dr. José Frota (IJF) não é novidade. Em setembro de 2022, o vereador Danilo Lopes (Avante) usou da mesma argumentação para criticar o então governo de Camilo Santana.

Em sua crítica, Danilo apresenta argumentação semelhante à fala recente de Roberto Cláudio, ao alegar que o IJF atende, em sua grande maioria, pacientes vindos do interior do estado. O dado foi rebatido, logo em seguida, por uma nota da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), que afirma que, atualmente, pacientes do interior só precisam se deslocar para a capital, em busca de atendimento, em casos de extrema urgência.

Segundo a nota do Sesa, a realidade atual — com menor demanda da população do interior pelos equipamentos de saúde da capital — se deu pelo investimento do governo do estado na construção de quatro Hospitais Regionais (Cariri, Norte, Sertão Central e Vale do Jaguaribe), 22 policlínicas e 22 Centros de Especialidades Odontológicas e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) em 26 municípios, além da estruturação de uma Central de Regulação articulada.

Existe, ainda, a informação de que 6 mil pessoas dão entrada no IJF mensalmente, vítimas de graves ferimentos e vindas de todo o estado cearense, mas não há dados disponíveis que indiquem que a maioria são do interior do Ceará.

Além disso, há a ciência das situações de infraestrutura e capacidade de Frotinhas e Gonzaguinhas, mas, quanto à fala sobre atender a população metropolitana e interior, nossa equipe de checagem não encontrou informações que comprovem essa declaração.

Tentamos contatar a responsável pelo serviço de informação ao cidadão da Sesa para realizar a confirmação do dado, porém não obtivemos retorno da Secretaria até o momento (15 de junho de 2023).

FALSO

“(…) Entreguei as obras da Copa [do Mundo, realizada em 2014 em Fortaleza e outras capitais brasileiras] sem ter desapropriação, sem ter nada. Entregamos em cinco, seis meses”.

Para esta declaração de Roberto Cláudio, nossa equipe de checagem se dedicou à apuração da informação sobre o prazo de entrega das obras.

De acordo com a Matriz de Responsabilidade do Ministério do Esporte, estavam previstas nove obras em Fortaleza para a Copa do Mundo de 2014. Dessas, quatro eram de responsabilidade do município. As ações previstas para serem executadas pelo Paço Municipal eram todas na área de mobilidade urbana, os BRTs (“Bus Rapid Transit”, corredores expressos para ônibus) nas avenidas Dedé Brasil (atual Silas Munguba), Alberto Craveiro e Paulino Rocha e o eixo Via Expressa/Raul Barbosa.

Ainda durante as obras, os projetos dos BRTs foram descartados e substituídos por melhorias em suas respectivas vias. Apesar disso, apenas as obras nas avenidas Alberto Craveiro e Paulino Rocha ficaram prontas antes da Copa. Elas passaram por serviços de alargamento, drenagem, pavimentação, meio-fio, calçadas, ciclovias e outras melhorias.

As obras do Eixo Via Expressa/ Raul Barbosa ficaram prontas em dezembro de 2016, 30 meses após o início da competição. As ações no trecho se concentraram no cruzamento entre Raul Barbosa e Murilo Borges, no bairro Alto da Balança. Foram feitos dois viadutos, o içamento de uma ponte existente, uma rotatória e passarelas na comunidade do Lagamar.

A avenida Dedé Brasil, hoje Silas Munguba, recebeu drenagem, terraplenagem, pavimentação, padronização de calçadas e canteiros centrais e sinalização. Era previsto ainda o “Complexo Viário da Parangaba”, que consistia na construção de viadutos nos cruzamentos com as avenidas Osório de Paiva e Germano Frank, obra essa nunca iniciada.

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Maria Clara Carneiro
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Jornalista, apaixonada por música, esportes e livros. Gosto de textos e de descobrir as diversas formas que posso pertencer a esse mundo.