Sobre as muitas portas que a educação pode abrir com garra e determinação

Bernardo Maciel
EntreFios - tecendo narrativas
4 min readAug 11, 2022

Estudante de ciências biológicas na Uece, Maria Nilza conta como a educação a fez alçar voos antes nunca imaginados

Por Bernardo Maciel

Maria Nilza é estudante de ciências biológicas na Uece / Arquivo pessoal

Mais de 6 mil quilômetros separam o bairro Lagoa Redonda, na periferia de Fortaleza, da cidade de Granada, na Espanha. Até o momento, essa foi a maior distância já percorrida por Maria Nilza Souza Moura graças à educação. O maior trajeto feito até o momento, mas não o único.

Desde o seu ensino médio, ela já vinha se destacando, quando seu trabalho desenvolvido em grupo com outros colegas para a Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB) foi selecionado para concorrer a etapa final em Campinas (SP) e lá eles conquistaram a medalha de prata, destacando o Ceará e ajudando a questionar os estigmas que recaem sobre a escola pública.

Nilza Moura (3ª a partir da esq.) com sua equipe e professores na ONHB / Acervo Pessoal

Ainda no ensino médio, a jovem não parou. Manteve-se focada nos estudos, mas dessa vez com um objetivo diferente: ingressar na universidade pública. Para isso, sabia que não podia contar apenas com o que aprendia em sala de aula.

Logo, criou uma rotina para alcançar seu objetivo. Durante os dias úteis, estudava as disciplinas na escola e revisava os conteúdos em casa. Nos fins de semana, desdobrava-se em dois cursinhos públicos.

O primeiro era oferecido na biblioteca do bairro vizinho e preparava os alunos para melhorarem suas redações.

O segundo é oferecido pela Prefeitura de Fortaleza, o Academia Enem, para jovens, principalmente os de escola pública, estudarem os conteúdos abrangidos pelo exame aos finais de semana e com todas as despesas pagas.

Além do custeio das passagens de ida e volta para o local das aulas, o projeto oferece material de estudos, lanche e fardamento. As aulas seguem até o fim de semana que antecede as provas.

Com essa rotina seguida rigorosamente durante o ano de 2018, não apenas para realizar a prova do Enem, mas também o vestibular da Universidade Estadual do Ceará (Uece), os resultados não poderiam ser diferentes para Nilza.

Em 2019, ela conquistou o que para ela foi a “realização de um sonho”, a tão sonhada realização de um intercâmbio. Ainda no primeiro semestre, o programa Academia Enem oferecia para seus participantes que tivessem participado do exame nacional do ensino médio a oportunidade das 100 melhores pontuações de concorrerem a um intercâmbio para a Inglaterra ou para a Espanha.

Sem titubear, ela rapidamente se inscreveu e foi uma das aprovadas para passar oito semanas na cidade de Granada, no sul da Espanha. A notícia foi recebida com grande alegria por familiares e amigos. A educação, mais uma vez, estava abrindo portas nunca antes pensadas e proporcionando experiências únicas.

Foto do dia da viagem para a Espanha / Acervo Pessoal

“Essa viagem foi algo que mudou minhas perspectivas de mundo, porque percebi que é muito importante agarrarmos cada oportunidade e era algo fora da minha realidade que se tornou real, porque eu não sabia que dava para conseguir tantas coisas através dos estudos, mas a verdade é que podemos ir além das nossas fronteiras”, relata.

E a alegria veio em dobro. Já na Espanha, ela foi agraciada com a notícia da aprovação no vestibular da Uece. Havia passado para o curso de ciências biológicas. Ela relata que quase perdeu a vaga, pois a universidade não queria aceitar que um terceiro realizasse sua inscrição. Contudo, com o apoio do secretário da Juventude de Fortaleza à época, Julio Brizzi, e da sua família, a matrícula foi efetivada com sucesso.

Ao retornar para o Brasil, iniciou os estudos e se engajou em projetos de extensão e de pesquisa. No entanto, com a chegada da pandemia, a universidade parou, obviamente, deixando em aberto um período de mais ou menos seis meses sem aulas.

O momento foi difícil, pois, além do medo de perder pessoas próximas para a doença que estava se espalhando cada vez mais rápido, a pandemia a paralisou. “Eu não conseguia estudar ou pensar em realizações futuras”, relata.

A volta às aulas de maneira remota também não foi suficiente para motivá-la, tendo em vista que muitos professores não compreendiam a realidade de cada aluno e aplicavam suas metodologias de ensino como se todos estivessem munidos de uma boa conexão com a internet e com o equipamento adequado. Apesar do retorno ao presencial, “ainda não foi fácil”, tendo em vista que, agora, teria de arcar com custos de deslocamento e alimentação fora de casa.

Apesar disso tudo, Nilza segue estudando e se mantendo focada no objetivo final: concluir o curso de ciências biológicas e aproveitar o caminho até a conclusão, seja através das aulas de campo e dos amigos, seja por meio das memórias relacionadas aos frutos que os estudos já lhe renderam.

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