Protagonismo feminino na história dos games

Projeto Etcetera
E Outras Coisas
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5 min readMay 31, 2022

Texto de Valeria Diaz e Ana Carolina Oliveira

Ao longo dos anos, os games foram majoritariamente desenvolvidos por homens e destinados ao público masculino. E isso não acontecia por acaso: a ideia de que jogos eletrônicos são “coisas de homem” foi construída a partir de uma visão muito masculinizada. Entretanto, a história mostra que há muitas mulheres por detrás desse desenvolvimento.

A participação das mulheres no universo dos games começou no final dos anos 1970, com Carol Shaw. Engenheira computacional, é formada em Ciências da Computação pela Universidade de Berkeley (EUA). Ela foi a primeira programadora de um game, e desenvolveu títulos como Polo e 3D Tic-Tac-Toe. Ao se destacar como programadora, foi contratada pela Activision, tornando-se a responsável por desenvolver o inesquecível River Raid, seu jogo de maior sucesso, vendendo milhares de cópias no mundo inteiro.

Carol Shaw com as premiações do jogo River Raid.

Já a primeira representação feminina nesse universo chegou em 1982, no jogo Ms. Pac-Man, lançado pela Namco. A personagem era simplesmente um Pac Man de batom e lacinho vermelho. Anos depois veio a primeira mulher humana como protagonista do jogo Metroid. A heroína do jogo era Samus Aran. No começo da partida ela aparecia vestindo uma bela armadura, portanto, o jogador não identificava que ela era uma mulher. É no final do jogo que o usuário descobre que Samus é uma personagem feminina. Entretanto, muitos desses personagens foram sexualizados ao longo dos anos.

Game Metroid (1986)

Outra protagonista no universo é a Yoko Shimomura, conhecida como “a mais famosa compositora de videogames do mundo”. Nascida em Hyogo (Japão), em 1967, é uma compositora japonesa de trilhas sonoras para videogames, sendo a responsável pela composição de trilhas sonoras de títulos de peso, entre os quais estão Final Fight, Street Fighter II, Kingdom Hearts e Final Fantasy.

Yoko Shimomura

No início dos anos 1990, mais precisamente em 1996, a personagem Lara Croft protagonizou o jogo Tomb Raider. A arqueóloga britânica fez tanto sucesso que se tornou uma história em quadrinhos e ganhou sua própria sequência de filmes, com Angelina Jolie dando vida à personagem.

Falando desse jogo, temos a Rhianna Pratchett, a designer por trás da personagem Lara Croft. Rhianna é uma escritora de videogames, designer narrativa e jornalista inglesa, teve o seu primeiro contato com o universo gamer durante seus trabalhos para veículos jornalísticos. Seu maior reconhecimento foi com a franquia Tomb Raider, ela foi quem elaborou, produziu e desenvolveu a Lara Croft no reboot Rise of The Tomb Raider, em 2013. Nas suas mãos, a personagem ganhou mais realismo e densidade, e além de ganhar emoções, também teve as suas roupas reformuladas. A roteirista também está entre as profissionais da indústria que mais buscam aumentar a representatividade feminina nos games, com personagens mulheres muito bem desenvolvidas.

Rhianna Pratchett

Outro nome de peso na indústria dos games é o da japonesa Rieko Kodama, também conhecida como Phoenix Rie. É uma das primeiras artistas femininas de renome, designer de arte de jogos eletrônicos, diretora e produtora pela gigante Sega. Kodama é conhecida principalmente pelo seu trabalho em role-playing games (RPGs), incluindo a franquia original Phantasy Star, a franquia 7th Dragon, e Skies of Arcadia (2000). É também conhecida pelas suas contribuições artísticas para jogos de Master System e Mega Drive, incluindo Altered Beast (1988), e Sonic the Hedgehog (1991). Além disso, é frequentemente reconhecida como uma das primeiras criadoras de jogos de sucesso, inclusive pela revista de jogos Nintendo Power, que a apelidou de “Primeira Dama dos RPGs”.

Rieko Kodama fotografiada por The Next Level

Alguns dos jogos com protagonistas femininas mais famosos dos últimos anos são: Tomb Raider, Silent Hill, Horizon Zero Dawn, Uncharted: The Lost Legacy, Resident Evil, Control, Final Fantasy, Heavenly Sword, Bayonetta e mais. O maior número de personagens femininos sempre foi em jogos de luta: Mortal Kombat, Tekken, Street Fighter e outros esbanjaram muitas mulehres poderosas.

Embora o público feminino tenha conquistado mais espaço, a presença de mulheres negras ainda é pequena, seja na indústria, seja na representação de personagens. A desigualdade social se faz presente, pois além dessa indústria ser majoritariamente masculina, é branca.

No ano de 2018, o estúdio brasileiro Long Hat House desenvolveu um jogo chamado Dandara. É baseada na guerreira negra Dandara dos Palmares, escrava fugitiva e esposa de Zumbi dos Palmares, que lutou contra o sistema escravista. Uma mulher negra brasileira, protagonista e não sexualizada, mudando toda a visão da sociedade.

A streamer Mawa contou que já recebeu ataques com palavras de baixo calão e racistas que duraram horas. Foi daí que resolveu fazer parte da Wakanda Streamers, que é um projeto que dá suporte a produtores de conteúdo negros e negras. Então investir em projetos sociais, abrir espaço para diálogo e discutir questões além de denunciar os casos e conscientizar a comunidade gamer sobre a desigualdade e respeitar são caminhos para mudar essa realidade.

As mulheres trans estão ganhando mais visibilidade, já é possível encontrar personagens trans, sendo a Poison uma das mais famosas, do Final Fight. Mas infelizmente acaba surgindo comentários maldosos e transfóbicos. Muitas afirmam preferir trabalhar de casa fazendo lives porque o mercado de trabalho lá fora é cruel e muito mais difícil para elas.

No caso de mulheres lésbicas, especificamente, as personagens eram masculinizadas nos games e tratadas com comicidade. Em 2018, no trailer de lançamento do jogo The Last Of US 2, a protagonista do jogo Ellie beija outra mulher e isso acabou gerando comentários de todos os tipos nas redes sociais. Essa representatividade se faz necessária para que outras referências sejam expostas de modo que naturalizem e assim combatam a discriminação social.

Gabriella Senra, de 27 anos, joga desde os 15 anos, e conta que evita falar sobre sua sexualidade, mas já presenciou homofobia nos chats de conversa. Ela contou também que foi chamada de “vagabunda” por conta de uma má jogada. Com a diversidade aumentando, ela acredita que os homens cis heteros podem ser sentir ameaçados. Além de jogadoras, o número de personagens está cravejado e é importante salientar que, há muito tempo os games do gênero RPG permitem que jogadores tenham relações entre personagens do mesmo sexo, com esses avanços consequentemente houve uma diminuição dos estereótipos.

Gradualmente, a indústria dos games está se movendo em direção a um ambiente mais inclusivo e representativo. enquanto isso, ainda há um longo caminho a percorrer para alcançar a igualdade. Priorizar ou atender a um gênero causando desvantagem a outro afeta a crescente popularidade dos jogos. Em um futuro não muito distante, o esperado é que as mulheres e o público LGBTQIA+ se tornem cada vez mais companheiras de jogos, ao invés de grupos marginalizados vistos de fora.

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Conteúdo jornalístico desenvolvido pelo curso de Comunicação Social da Uninassau João Pessoa