A recompensa do processo

Camila Christine dos Santos Antão
EquitasVC
Published in
6 min readDec 8, 2022

Você já parou para pensar o porquê faz o que faz todos os dias? Quais são seus objetivos? Ambições? Sonhos? Talvez seja mais factível pensar em quais resultados você busca?

Caso a palavra “resultados” tenha despertado mais seu interesse em relação a essa discussão, muito provavelmente você está vivendo sua vida de forma menos otimizada. Arrisco dizer, de um jeito muito mais difícil e não sustentável a longo prazo. Quantos de nós fazem algo buscando uma recompensa específica e quantos de nós fazem algo porque amam e valorizam o fato de estarem simplesmente “fazendo” este algo?

Neste artigo, vamos tentar entender como dar mais valor ao processo e não ao resultado pode impactar diretamente sua percepção sobre realizar coisas que estão presentes no seu dia a dia.

É muito comum relacionarmos cada uma de nossas atividades a um resultado específico. Fazer aulas de inglês para falar como um nativo, fazer aulas de dança para não passar vergonha em eventos, exercitar-se para perder peso, tirar fotos bonitas em uma viagem para aumentar seu número de seguidores ou de curtidas nas redes sociais, estudar para tirar 10 em matemática, ou até mesmo, fazer aulas de retórica para aprender a falar em público.

Todas as atividades listadas acima são válidas e podem integrar o quotidiano de qualquer pessoa. Inclusive podem ser extremamente prazerosas, mas isso depende fortemente de nosso mindset. Em nosso penúltimo post conversamos sobre como indivíduos de mindset fixo estão bastante preocupados em manter seu status de “talentosos” e “impecáveis”, sendo extremamente sensíveis a resultados ou feedbacks negativos. Por outro lado, temos indivíduos cujo mindset é o de crescimento. Neste caso, o processo de aprender e a vontade de transformar erros em potencial de melhoria são elementos que integram sua forma de enxergar o mundo.

Mas pensemos sobre como essas atividades são concebidas por nossa mente e como percebemos sua importância em nossa vida. Pegando o exemplo de uma aula de dança, caso o objetivo seja aprender passos mínimos que se encaixem e que eliminem a possibilidade de “passar vergonha por não saber dançar”, em que momento você passa a se divertir e aproveitar a atividade em si (a dança)?

Vamos deixar o exemplo ainda mais claro desenhando uma situação hipotética, mas totalmente possível (espero do fundo do meu coração que não tenha sido o caso com você, querido leitor ou querida leitora). Você assinou um pacote de aulas de dança de salão para os próximos 6 meses. Você se prepara para as aulas que acontecem todas as terças e quintas-feiras, às 19h, e estuda o que foi ensinado nas aulas anteriores. Assiste vídeos e lê sobre os fundamentos da dança. Existe uma tensão que enrijece seus ombros e braços minutos antes de a aula começar, porque você precisa desesperadamente aprender a não pisar no pé de ninguém enquanto se movimenta de forma sincronizada com a música. Você está tão concentrado em conciliar todas as instruções que mal nota o rosto de seu parceiro ou parceira de dança. As aulas passam e, conforme você adquire novas habilidades, já se sente mais confiante. Os elogios dos professores fazem com que você acredite que há um talento escondido em você e que nunca tinha sido explorado.

O esperado momento chega e você simplesmente não consegue dançar. Nada. Nem um passo. O nervosismo toma conta de você e as gotículas de suor escorrem pelas laterais de seu rosto sem pedir permissão para fazê-lo. E agora? O objetivo não foi alcançado (não houve uma performance de dança) e você passou horas se dedicando sem aproveitar o momento de seu aprendizado. O resultado (fracasso) era seu foco, enquanto o processo (aulas) era algo secundário, que servia apenas para que a meta fosse cumprida.

Eu diria que essa situação é, no mínimo, decepcionante. É frustrante não conseguir o que se deseja, principalmente dentro de um contexto em que houve máximo esforço para que aquilo se concretizasse. Entretanto, será que existe um caminho alternativo para essa situação? E se ao invés de nos prepararmos para o “grand finale”, nos preparássemos para aproveitar cada um dos passos que foram aprendidos ao longo das aulas?

Uso este exemplo para chamar atenção à pouca importância que demos aos processos que envolvem a conclusão de atividades que permeiam nossas vidas. Será que é benéfico sairmos de casa pensando sobre o que temos que finalizar ou concluir naquele dia, sem ao menos pensar em aproveitar o processo em si? Repetindo a pergunta do parágrafo introdutório: quantos de nós fazem algo porque amam e valorizam o fato de estarem simplesmente “fazendo” este algo?

Em um contexto social em que há demandas recorrentes por boas performances, focamos constantemente em resultados e em recompensas. Isso faz com que refletir sobre possíveis melhorias e gastar energia implementando-as perca a prioridade. É bastante interessante pensar sobre o fato de que muitas vezes não buscamos melhorar em um determinado campo porque não conseguimos encaixar esse treino em nossa rotina.

Dado que não há espaço para analisarmos nossos pontos de dificuldade e de falha, não há espaço para o aprendizado, portanto, não há espaço para melhoria. Imagine que você começou a estudar inglês, mas ainda não domina com tranquilidade a pronúncia do famigerado encontro consonantal “th”. Ao pronunciar de forma incorreta uma vez, o ideal seria entender o erro e buscar corrigi-lo munido de ferramentas ao seu alcance, sendo a paciência a mais importante delas. Caso você opte por não focar neste treino, o que fará da próxima vez que aparecer a palavra “through” em um texto? E na próxima? E em outra?

A valorização do processo de aprendizado está intimamente ligada com o tipo de mindset que possuímos. O mindset fixo nos levaria a pensar que existem pessoas que nasceram com a morfologia necessária para pronunciar “through” sem muita dificuldade e desistiriam após o primeiro erro. Já o mindset de crescimento olharia este erro de pronúncia como uma ótima oportunidade para melhorar seu nível de inglês.

Josh Waitzkin, campeão mundial de xadrez e autor do livro “A Arte de Aprender” diz que, atualmente, “focamos tanto no resultado que os detalhes intrínsecos ao processo de aprendizado ficam perdidos em nós”. E eu concordo bastante com o ponto dele. Inclusive nosso sistema educacional é construído para que pensemos assim: o volume de conteúdo a ser absorvido é monumental e o tempo disponível para tal, extremamente reduzido. Além disso, os alunos não são estimulados a aproveitar ao máximo as aulas, nem a aprofundarem em seus temas favoritos. O movimento quase que diametralmente oposto acontece: os alunos focam em tirar boas notas, pois isto é visto como uma medida direta de seu esforço (ou como recompensa) e em nenhum momento os estudantes têm a oportunidade de mostrarem que aprenderam com seus erros e que adquiriram novos conhecimentos.

Assim sendo, dado contexto no qual vivemos, existe uma tendência a dificultar atividades naturalmente difíceis ao focar apenas no que devemos produzir a partir delas. Falhas e resultados inesperados dragam a motivação. Agir sempre buscando a recompensa não é sustentável. Josh Waitzkin ilustra essa ideia usando o conceito de “fortalecimento das bases”. O exemplo escolhido pelo autor é a tarefa de se construir uma parede. Enquanto você não aprender a posicionar corretamente os tijolos que pertencem à primeira fileira, não há chance alguma de sustentar uma parede. E assim funciona nosso processo de aprendizado também: não faz sentido em ter pressa para chegar ao seu objetivo, dado que ele exige etapas anteriores que são fundamentais para a sua conclusão.

Se aprendermos a valorizar os avanços e aprendizados provenientes de cada atividade, como colocar corretamente um tijolo que será capaz de sustentar os demais, temos maior chance de aproveitá-la. A verdadeira recompensa não chega no mesmo momento da finalização de uma tarefa, mas sim, de forma contínua, conforme entendemos o processo de realizá-la como o presente a ser recebido no final do dia. Acreditar no processo e respeitá-lo é a verdadeira recompensa.

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