Por que as startups morrem?

Felipe Sertorio
EquitasVC
Published in
6 min readMay 19, 2022

De acordo com pesquisas recentes, 90% das startups acabam ficando pelo caminho. Apesar de haver uma série de motivos que possam explicar essa alta taxa de mortalidade, separei, a seguir, os que mais vemos no nosso dia a dia e, como nós, EquitasVC, fazemos para mitigar potenciais riscos das nossas investidas.

Fator 1 — Não atacar o problema “cabelo pegando fogo”

Para começar, o problema do tipo “cabelo pegando fogo” remete a uma dor urgente, bastante latente e que, com frequência, atrapalha o dia a dia dos clientes. Ao resolver problemas com essas características, a startup terá consumidores felizes pagando pelo produto / serviço.

Apesar de parecer óbvio, na prática, há uma grande dificuldade em descobrir qual é essa dor top 1 da lista dos clientes. Muitas vezes, nem mesmo os próprios clientes sabem identificar qual é o principal problema que eles possuem, o que torna o processo de discovery bastante complexo.

Aqui no fundo EquitasVC, frequentemente nos deparamos com times excelentes atacando dores fracas. Principalmente considerando a nossa proximidade com fundadores de perfil mais técnico, o que acontece é uma confiança muito grande deles na capacidade de desenvolver produtos, porém com um distanciamento, quase mortal, dos clientes.

O impacto de não focar no problema correto são as vendas abaixo do esperado, o que faz com que esses times voltem a pensar que o produto não está bom o suficiente, entrando em uma espiral negativa de tempo e dinheiro (dois recursos escassos para a grande maioria das startups) sendo gastos de forma incorreta, quando, na verdade, o grande ponto é que a dor resolvida não é forte o suficiente para que os clientes queiram pagar pela solução.

Dessa forma, o que fazemos, aqui no fundo, junto aos nossos times investidos, é procurar validar, em todos os estágios da empresa, se o cliente pagante tem ou não a dor, se a solução faz sentido e se ele está satisfeito com o produto.

Fator 2 — Mercado potencial pequeno

Outro ponto comum que aparece para gente é no contexto de times que resolvem um problema relevante, porém de um nicho muito específico de clientes, o que dificulta quando começamos a projetar a expansão da empresa.

Vale um parênteses aqui, de que não há nenhum problema em começar com um nicho mais específico, dominar o mercado e depois expandir para nichos complementares. Porém, essa estratégia precisa ser muito bem planejada e, em adição a isso, esses nichos complementares têm que ter características parecidas entre si, não só das dores, mas também da dinâmica de aquisição do produto / serviço.

Por exemplo, uma academia e uma escola podem até ter algumas dores parecidas, porém a forma de vender para um e para outro, dependendo do produto, pode ser bem diferente. Portanto, no momento de planejamento, é fundamental levar esses aspectos em consideração, à medida que isso impactará time, ciclo de vendas, etc.

Aqui em EquitasVC, quando estamos olhando uma nova oportunidade de investimento ou mesmo validando algum possível pivô para nossas investidas, sempre fazemos a seguinte conta: quanto de participação de mercado a empresa precisará ter para faturar R$200 milhões ao ano? Se a resposta for mais do que 20% de mercado, apesar de possível, o tamanho de mercado já passa a ser um yellow flag.

Fator 3 — Falta de diferencial do time para atacar o problema

Ponto importantíssimo. Aqui, gosto de quebrar em duas partes. A primeira, mais tangível, diz respeito a quais experiências ou conhecimentos prévios aquele time possui para trabalhar com o problema em questão. Isto é, em termos de diferenciação, o que aquele time possui que o capacita a ser O TIME vencedor.

Como exemplo, gosto de citar uma empresa do nosso portfólio, que foca no segmento de DevOps, em que os três fundadores trabalham no setor há mais de 10 anos, sendo provavelmente um dos que mais entendem do assunto, e com experiências prévias de consultorias e trabalhos em grandes empresas.

A segunda parte desse fator leva em conta a paixão pelo problema. Apesar de ser menos tangível, nas conversas que temos, fica claro qual é o apego que o time tem em relação ao problema. Obviamente, tendo uma visão mais pragmática, é possível que empreendedores, mesmo com pouco apego ao setor em questão, consigam desenvolver soluções e ser bem sucedidos. No entanto, quando encontramos fundadores apaixonados, vemos com ótimos olhos.

Fator 4: Modelo de negócios insustentável

Em geral, no mercado de VC, falar em empresas que geram caixa chega a ser um insulto. No entanto, aqui no nosso fundo, sempre prezamos por modelos que sejam sustentáveis do ponto de vista financeiro.

É claro que, no início, é super difícil que a startup consiga se manter no azul, à medida em que ela está na fase de investir em construção de MVP, contratar times, testar canais, etc, sem que haja muita entrada de receita vinda do cliente (muitas vezes zero entrada).

No entanto, desde o começo, é importante ter um caminho para o break-even, isto é, para a geração positiva de caixa, pois, mesmo com o mercado de VCs bastante ativo, não são todas as empresas que conseguem levantar capital e, contar com esse fator externo é extremamente perigoso.

Mesmo empresas que conseguem levantar capital, como as nossas investidas, por exemplo, nós sugerimos que haja essa busca pelo break-even, pois, nesse cenário, levantar mais um round de investimento se torna estratégico, mas não necessário, permitindo que os fundadores possam negociar termos muito melhores do que se estivessem com a corda no pescoço.

Aqui em EquitasVC, para mitigar esse risco, focamos em times fundadores técnicos, que sejam capazes de construir MVPs rapidamente, sem necessidade de contratação de mão de obra externa. Além disso, investimos em modelos asset-light (pouca necessidade de alocação de capital), o que permite testar e validar diversas hipóteses com pouco capital, diminuindo consideravelmente o risco de falta de caixa.

Fator 5: Foco apenas no produto e não nos canais de distribuição

Como disse Morgan Housel, autor do famoso livro Psicologia Financeira, “Muitas vezes há uma grande lacuna entre mudar o mundo e convencer as pessoas de que você mudou o mundo”. O que quero dizer aqui é que, mesmo que a startup tenha um produto revolucionário, se ela não tiver uma forma de entregá-lo, de nada adiantará.

Dado o nosso posicionamento de investir em times técnicos, vemos com certa frequência um desdém pelos canais de distribuição, focando apenas no produto, o que é um erro bastante perigoso, à medida que, desde o início, é FUNDAMENTAL entender como a distribuição será feita.

Obter a distribuição correta não é fácil. Primeiro, é necessário identificar quem são os clientes que apresentam a dor mapeada, depois onde encontrá-los de forma recorrente e, por último, como alcançá-los de forma eficiente e escalável.

Com as nossas investidas, gostamos, desde a concepção do produto, de trazer os canais de distribuição para a discussão, evitando que tenhamos ótimos produtos que não possam ser comprados pelos clientes.

Fator 6: Desalinhamento entre times e investidores

Apesar de sermos um fundo de Venture Capital, nós realmente acreditamos que, no início, ter um fundo de VC por trás pode ser danoso, por dois motivos: (i) muito dinheiro, na etapa inicial, traz uma necessidade de consumo de caixa (para justificar todo o dinheiro levantado), que muitas vezes faz com que a empresa queime etapas importantes e perca o foco; (ii) receber investimento de VCs pode significar uma pressão externa por crescimento de receita e clientes, no intuito de mostrar melhores números para rodadas subsequentes de capital, para que o fundo possa mostrar retornos aos seus LPs (quem coloca dinheiro no fundo).

Aqui em EquitasVC, temos por princípio que o melhor dinheiro que existe é o do próprio cliente, e, portanto, o ideal é construir o negócio com foco neles e não nos investidores. Por isso, dentro do nosso playbook de Product-Market Fit, gostamos de passar por cada uma das etapas de validação do mercado, problema, produto, canal de distribuição, etc, entendendo que há um tempo de maturação para cada uma dessas fases e, discutindo a importância de cada uma delas.

Apesar de não haver uma “receita de bolo” para construir uma empresa, existem alguns erros que vemos com bastante frequência e que culminam na morte prematura de startups, muitas vezes com um potencial enorme. Ao evitar essas armadilhas, a chance de sucesso aumenta consideravelmente. Como gostamos de dizer, a jornada é dura, mas VALE A PENA.

--

--