Por que devo trabalhar meu mindset?

Camila Christine dos Santos Antão
EquitasVC
Published in
7 min readNov 25, 2022

Nosso mindset nada mais é do que um conjunto de valores e de percepções que guiam a forma como enxergamos determinadas situações e nos comportamos no momento em que elas acontecem. Por mais genérico que isso pareça, é como se tivéssemos pequenos filtros dentro de nós que (i) classificam todos os acontecimentos que permeiam nossas vidas, e (ii) nos retornam uma resposta de como devemos agir diante de cada uma delas.

Ainda confuso? Vamos a um exemplo mais concreto. Suponhamos que o programa de hoje à noite, após um expediente cansativo, seja jogar boliche com seus colegas de trabalho. Imaginemos que você saiba jogar boliche muito bem. Neste caso, você:

(a) sente a obrigação de se destacar e terminar como líder do ranking, principalmente porque o reconhecimento dos seus colegas de equipe é extremamente importante

(b) sente que há um desafio por trás de jogar com pessoas diferentes e que há potencial de aprender coisas novas jogando mais uma vez

Indo um pouco mais longe nessa reflexão, caso você termine nas últimas posições do ranking, você:

(a) sente que fracassou completamente, pois o seu talento deveria te garantir mais pontos na partida

(b) sente-se satisfeito pelo esforço aplicado e acredita que, com um pouco mais de treino, pode se sair melhor da próxima vez

Se você escolheu as duas opções (a), muito provavelmente seu mindset seja do tipo “fixo”. No caso de haver escolhido ambas as opções (b), estamos falando de um mindset “de crescimento”. Mas vamos entender melhor do que isso se trata antes de analisarmos o quadro e suas potenciais consequências.

A psicóloga Carol S. Dweck, autora do best-seller “Mindset: A Nova Psicologia do Sucesso”, indica que, segundo seus estudos e pesquisas com indivíduos de diversas idades, inclusive crianças, existem dois tipos principais de pessoas: aquelas que possuem um mindset fixo e aquelas que possuem um mindset de crescimento.

De forma simples, uma pessoa de mindset fixo acredita que suas habilidades naturais, tais como seu nível de inteligência, não podem ser alteradas; enquanto as de mindset de crescimento acreditam que podem evoluir e se desenvolver caso se esforcem para isso. Ok, em um universo em que não temos discrepâncias de acesso a oportunidades (o que definitivamente não é o caso do Brasil), isso pode até parecer intuitivo, mas existem muitas sutilidades que levam à construção desses dois tipos de personalidade.

De um lado, temos as pessoas de mindset fixo, que tendem a ser extremamente focadas nos resultados obtidos. Para esse grupo, o resultado de uma prova é absorvido como determinante de sua capacidade ou como rótulo de seu esforço. Então, avaliações padronizadas são visadas como deleite, pois representam o quão qualificada essa pessoa seria dentro de um determinado assunto. Sugiro aqui um ponto de reflexão: notas escolares, por exemplo, são realmente parâmetros que medem de maneira justa e adequada as capacidades de um estudante? Não há resposta certa. Mas uma pessoa de mindset fixo, muito provavelmente, diria que sim.

Tirar 10/10 em matemática seria a materialização perfeita de sua inteligência e destreza, principalmente caso essa nota não tenha exigido muito de sua capacidade cognitiva. O universo perfeito se dá quando a nota máxima é atingida sem muito esforço, é reconhecida e ainda, é aplaudida pelas pessoas que estão ao seu redor. Neste caso, poderíamos considerar a missão como “cumprida com sucesso”. Isso é necessariamente ruim? Infelizmente, não tenho a resposta para isso. Carol Dweck também não tem, mas ela nos propõe alguns debates interessantes ao redor deste tema.

Ao ler seu trabalho, entendo que as pessoas de mindset fixo estão muito próximas do que a sociedade entende por “sucesso imediato”, “zona de segurança” e “reconhecimento”. Em um de seus exemplos, Carol cita um grupo de crianças que foi exposto à atividade de resolução de quebra-cabeças. O objetivo era entender como elas reagiriam a situações nas quais elas deveriam encontrar as respostas por si mesmas, sem receber ajudas externas.

Ao começar com quebra-cabeças tidos como “fáceis”, algumas crianças já demonstraram muita dificuldade em sua resolução, perdendo interesse rapidamente pela proposta. Não houveram novas tentativas ou vontade de continuar nos casos em que a resposta não era óbvia nem imediata. Essas crianças normalmente estão acostumadas a serem constantemente elogiadas e congratuladas pelas habilidades que possuem, seja por pais, parentes e professores. Assim, não desenvolvem uma percepção completa da situação: o que ganha destaque é sempre o fim, e não o meio pelo qual ele foi atingido.

Ainda neste exemplo, outros participantes, mesmo sentindo-se desafiados, estavam animados com a perspectiva de encontrar a solução por si mesmos. Ao terminarem o exercício, alguns chegaram a dizer que “tinham se divertido com a proposta”. Outros, foram mais longe e aceitaram o desafio de resolver um quebra-cabeça cujo nível de dificuldade era superior ao anteriormente resolvido. Uma das meninas chegou a pedir o nome da marca que os fabricava, pois gostaria que sua mãe lhe comprasse novos exemplares!

Aproveito esta ilustração para apresentar o conceito de mindset de crescimento. Neste caso, as palavras-chave que podemos usar seriam “aprendizado”, “esforço” e “processo”. Caso a diferença entre ambos os grupos não esteja clara, voltemos à nossa partida de boliche com os colegas da empresa.

Aqueles que possuem mindset fixo não aceitariam não estar na primeira colocação da competição, pois é o resultado o que importa no final das contas. Tomei o cuidado de, na segunda situação, não dizer que você estaria na “última posição do ranking”, mas sim, “nas últimas posições”. O que mostra que essa situação definitivamente não é a pior existente. E mesmo que fosse, o quão razoável é dizer que você fracassou completamente pura e simplesmente porque perdeu uma partida de boliche?

Por outro lado, aqueles cujo mindset é o de crescimento, teriam se divertido com a rodada e saberiam reconhecer que o resultado da partida não os define, pelo contrário: teriam valorizado seu esforço e identificado lacunas onde melhorias podem ser feitas em oportunidades futuras. Claro que essa busca pela melhoria deve ser precedida por uma vontade ou desejo de ser melhor, senão, não há sentido em continuar. Fundamentalmente, este pensamento é baseado no fato de que todos possuem potencial para aprender algo novo, independentemente do que seja. Mesmo que você não vá se tornar o Leonardo da Vinci contemporâneo, todos têm um lado artístico adormecido e que pode ser trabalhado ao longo dos anos (sou fã de carteirinha de da Vinci, mas não podemos dizer que São João Batista e Mona Lisa correspondem aos padrões de beleza atuais).

“Poder errar é uma benção! Não deixe que eles acreditem que fracassar é algo horrível.” — Carol Dweck.

Quando colocamos os dois perfis lado a lado, tenho a impressão de que a competição torna-se até injusta, pois nossa sociedade, mesmo valorizando bastante a ideia de “esforço” e “superação”, reserva espaços especiais para aqueles que nascem com um “talento natural que não é acessível para qualquer um”. Então, qual dos dois está certo?

Nenhum! Não há melhor ou pior opção neste caso, existem apenas formas diferentes de encarar e absorver informações. Nossas percepções são originadas de diversas maneiras, sendo formadas principalmente pela cultura na qual estamos inseridos e as condições de nossa criação. Crianças que são reconhecidas como inteligentes e talentosas desde o início, tendem a ser recompensadas com elogios infinitos, que reforçam o fato de que suas características foram as verdadeiras responsáveis pela produção de resultados positivos.

Estas crianças crescerão pensando que sua inteligência as define, e, dado que nasceram assim, morrerão com o mesmo nível de sofisticação e bênçãos com as quais nasceram. Isso não é necessariamente verdade. Sempre há espaço para fazermos mudanças e propormos evoluções na forma como agimos e como interpretamos o que acontece ao nosso redor. “Basta” saber se estamos contentes com o que somos atualmente ou se buscamos algo mais (usar a palavra “basta” é quase uma licença poética neste caso, dado que este é um processo intenso e longo de autoconhecimento e autoanálise).

“Estudar a si mesmo é a arte mais difícil”.

Assim, no caso de elogios, procurar valorizar o processo no lugar de destacar o resultado pode ser uma estratégia valiosa, tanto na educação de crianças quanto no enfrentamento de dificuldades em sua carreira. O resultado é com certeza muito importante, mas o que foi feito para que ele fosse atingido pode ser olhado com mais cuidado.

Apesar de possuirmos um mindset que melhor nos represente na maior parte das vezes, podemos apresentar traços de ambos. Então não se preocupe caso você tenha escolhido (a) e (b) ou (b) e (a): isso é completamente normal. Podemos nos comportar distintamente a depender do contexto e do nível de exigência, por exemplo, de uma dada tarefa. Lembre-se de que seu diagnóstico atual, não é determinante pois, além de mutáveis, os mindsets não te tornam melhor ou pior que ninguém. Mas vale lembrar que podemos sempre evoluir a forma como pensamos e reagimos. Não podemos subestimar nossa capacidade de aprender nem de melhorar nossas habilidades, pois nossos “talentos escondidos” podem nos surpreender!

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