E as Africanas tomaram a pluma!*

Danielle Takase
escola do mundo ao avesso
15 min readApr 17, 2018

História de uma conquista

Angèle Bassolé-Ouédraogo **

Universidade de Ottawa

Comecemos por uma anedota. Eu completei meus estudos do ensino básico ao ensino superior em Letras na África (Costa do Marfim e Burkina Faso) sem jamais ter visto sequer uma obra de autoria feminina inscrita no programa. Eu sabia, no entanto, que as mulheres escritoras existiam, afinal, eu as lia. É uma escrita recente, dizem (ainda que os primeiros escritos datem de 1958). Talvez. Mas nascida uma década após as independências africanas, eu não conheci a era dos “nossos ancestrais, os Gauleses”*** figurando em nossas cartilhas de história africana! Então, por que é que os únicos escritores sobre os quais me falavam eram Senghor, Césaire, Sembène, Tchicaya, Lopès e outros? Contudo, as mulheres, não menos relevantes, já escreviam, eram reconhecidas internacionalmente através de prestigiados prêmios e permaneciam, todavia, ausentes da instituição literária africana. A maioria das múltiplas antologias de literatura africana ignoravam sua presença e, no campo do saber (universidades e escolas), observava-se um silêncio total sobre seu trabalho de criação.

Depois de 1994, um aumento de interesse parece se manifestar sobre a escritura feminina africana, com a publicação de antologias e de estudos que integram as criações das africanas, mas são, em sua maioria, provenientes de universidades ocidentais e de alguns raros africanos de fora do continente. Mas dentro do próprio continente, permanece o silêncio, a tal ponto que, assim que iniciei minha tese de doutorado tratando da escrita poética das Africanas, meus professores, com um tom de pilhéria, me indagavam: “o que há para dizer sobre esse tema?”. Reação que teria me desencorajado, se eu não estivesse determinada e convencida de que eles estavam completamente enganados. Minha determinação me daria razão 5 anos depois, quando os mesmos professores me diriam com felicitações: “o seu tema vale ouro”.

Esta anedota não tinha como objetivo colocar em foco minha modesta pessoa, mas sim esboçar os contornos do contexto em que as Africanas chegam à escrita. É uma escrita que emerge do silêncio e reencontra ainda outro silêncio, silêncio este institucional. Neste artigo, eu tentarei demonstrar como as mulheres buscaram apropriar-se da palavra, até então, um privilégio dos homens, que falavam e escreviam em seus nomes. Como se efetua sua busca por identidade nesse contexto social que as ignora? Que África estas mulheres projetam através de seus escritos?

De 1930 a 1960, a literatura africana subsaariana é majoritariamente feita por homens. Da época das reivindicações sociais conduzidas pelo movimento da Negritude à conquista das independências em 1960, não se via nem se ouvia ninguém, senão os homens. Nas esferas decisivas, estão sempre eles, falando e atuando em nome de todos a ponto de estarmos tentadas a questionar se as mulheres realmente existiam nesse meio!

Contudo!, o continente africano é numericamente dominado pelas mulheres há muito tempo e a sua história está repleta de altos feitos cujas protagonistas são mulheres. Se a este contexto coubesse evocar grandes nomes femininos da história africana: a Princesa Yennenga (Burkina), a Rainha Pokou (Costa do Marfim), a Rainha Sarraouinia (Niger), estaríamos, em contrapartida, pouco inclinados a reconhecer o mérito das mulheres como um todo, empenhadas nas lutas sociais e no crescimento do continente. As mulheres são a força motriz desse desenvolvimento, mas são militantes da penumbra.

Uma vez que a literatura africana emerge, são os homens que a apresentam ao mundo e é através dos olhos deles que nós descobrimos as Africanas.

A ausência destas na produção literária deve-se, por um lado, aos fundamentos socioculturais das sociedades africanas e, por outro, a fatores externos. Com efeito, educadas em um meio social que lhes impõe tamanha discrição, a ponto de apagá-las, as mulheres quase não aparecem como protagonistas.

Contudo, a escrita é um gesto público. Como as Africanas que não tinham sequer direito à voz teriam esse direito à palavra escrita?

É exatamente por isso que seu início nessa arena se fará de maneira tímida. Assim, os primeiros escritos de mulheres passam praticamente despercebidos, mesmo sendo publicados em Paris. É este o caso dos poemas de Annette M’Baye e da autobiografia da adolescente Marie-Claire Matip .

Foi necessária a chegada do ano de 1975 (Ano Internacional das Mulheres) para ver emergir aqui e acolá algumas vozes femininas. Com o ano oportuno, a produção de mulheres aumenta consideravelmente, entram em cena a maliana Awa Kéita, as senegalesas Nafissatou Diallo, Kiné Kirama Fall, Aminata Sow Fall, Awa Thiam, Mariama Bâ, a camaronesa Wèrèwèrè Liking, a congolesa Clémentine N’Zuji, etc.

Mais de duas décadas depois, uma nova geração de romancistas e de poetas surge para dar continuidade a este legado e numerosas obras excepcionais foram publicadas, mas ainda existe um desequilíbrio notável entre o número de obras publicadas por mulheres e por homens, e um ainda mais gritante entre a seriedade e a atenção crítica direcionada aos primeiros e às segundas, o que acontece em detrimento dos inúmeros prêmios por elas conquistados em diversos concursos literários (Bernadette Sanou : Prêmio de Poesia Jean Cocteau, em 1995; Calixthe Beyala : Grande Prêmio do Romance da Academia Francesa, em 1996; Fama Diagne Sene : Prêmio do Presidente da República [Senegal], em 1997, etc.).

Se as estruturas das sociedades africanas fizeram com que as mulheres tendessem a desempenhar papeis secundários, há também os fatores externos, como a proibição do acesso à escola às mulheres, desde o começo da colonização, pelos missionários católicos pouco abertos à emancipação feminina. As dificuldades ainda em nossos dias encontradas pela escola africana — como descrita, por Ambroise Kom em “Educação e democracia na África: tempo de ilusões”, sobre a escola camaronesa, não muito diferente da de muitos outros países — não favorecem a educação e escolaridade das garotas, pelo contrário, são sempre largamente negligenciadas. Sendo a instrução um pressuposto para qualquer pretensão literária, passa a ser compreensível por que as mulheres excluídas do processo de escolarização não podiam acessar facilmente à escrita.

A segunda causa da entrada tardia das mulheres à escrita é a divisão sexual do trabalho, que confere às mulheres muito pouco tempo. Torna-se cada vez mais numeroso o número de mulheres que ocupam altos postos na África, mas essas novas ocupações, por mais importantes que sejam, não liberam jamais a mulher de seu dever de mãe, de esposa, e é a ela a quem se incumbe todas as tarefas domésticas. Surge então um problema de disponibilidade, quando se sabe que a escritura requer necessariamente tempo, concentração e tranquilidade.

A terceira causa está ligada às obstinadas raízes das tradições. Na África tradicional, as mulheres não têm direito à esfera pública. Não se encontram sob a árvore da palavra onde tudo se decide****: “Neste mundo, os grupos de mulheres têm três nomes que possuem o mesmo significado: resignação, silêncio, submissão” (KOROUMA, 1990, p. 130). Ao mesmo tempo que aumenta o número de mulheres a assegurar, em todos os níveis, a sobrevivência tanto econômica quanto social da África, as forças tradicionais recusam-se a evoluir e obstinam-se em manter a mulher numa condição subalterna.

Nesta lógica, parece evidentemente inadmissível que elas atuem como protagonistas da escrita, o que explica as reticências que enfrentam, da criação à difusão de suas obras:

Eu não posso mais tolerar esse secreto terror que os críticos suscitaram na minha alma. Eu estou verdadeiramente assustada pelo fardo desses ataques. Além do medo, eu experimento também a raiva. (AÏDOO, 1988, p. 170)

Ao tomar a pluma, as mulheres africanas transgridem também uma lei tácita de suas sociedades. Através da escrita, elas assinalam seu primeiro ato de rebeldia contra sociedades que sempre fizeram delas singelas espectadoras. Elas usurpam a palavra proibida para não mais se deixar contar, e sim para contarem, por si mesmas, sua história. Como seriam elas percebidas socialmente? Mariama Bâ nos dá a resposta :

Em todas as culturas, a mulher que reivindica ou protesta é desvalorizada. Se a palavra passageira marginaliza a mulher, como será julgada aquela que ousa fixar pela eternidade seu pensamento? (BÂ, 1981, p. 6)

As escritoras africanas aparecem como personagens que desobedecem à ordem antiga, o que não agrada a qualquer um. O testemunho de pioneiras como Kaya ou Aidoo é revelador :

Uma mulher que apresenta um manuscrito percebe muita ironia a seu respeito. Le Prix d’une vie foi muito lido por mulheres de todas as idades […]. No entanto, muitos homens me expressaram seu desconforto e, no lançamento do livro, alguns jornalistas praticamente me insultaram. (KAYA, 1994, pp. 81–82)

Quase todo o mundo toma as mulheres escritoras por um simples capricho ou ainda pior. Isto vale também para os editores, os agentes literários e todos aqueles que lucram com nosso labor. (AÏDOO, 1988, p. 165)

Ao tomar a pluma, as Africanas romperam o as amarras de seus próprios medos e quebraram o pacto de silêncio que elas observavam até então. No entanto, nada lhes foi ainda efetivamente conquistado, pois hoje, tal qual ontem, as dificuldades se amontoam e as vitórias do ontem e do hoje não fazem mais que desenhar os contornos da batalha a ser enfrentada no amanhã:

Pelo próprio ato de escrever, a mulher rapidamente toma consciência de que ela adentra um mundo fechado, por muito tempo construído por e para os homens […]. A escrita enquanto instituição e não enquanto prática não se oferece jamais à mulher. Ela deve sabotar este enorme bloco de concreto em sua base para poder obter esse direito. (GARCIA, 1981, p. 29)

Vencer seus medos, enfrentar o que quer que digam sobre elas e romper o silêncio revela-se insuficiente para garantir às escritoras africanas um lugar no bojo da instituição literária. Elas devem então ainda batalhar para destruir este silêncio outro que acolhe sua criação:

Mulheres Escritoras da África são outras vozes, as vozes não-ouvidas, raramente discutidas de escassos espaços nas repetitivas antologias e nos previsíveis estudos de perspectiva masculina do campo. (BROWN, 1981, p. 67)

Essa constatação data do início dos anos 80, portanto, bem anterior às publicações dos trabalhos das mulheres críticas sobre a temática, e é interessante que advenha de um homem. O silêncio da crítica literária africana, por mais que pudesse justificar-se de início pela ausência das Africanas na cena literária, é mais dificilmente explicável no começo dos anos 1990, já que:

Ainda que numericamente limitada, a proporção de mulheres escritoras não é a esta altura negligenciável. Entretanto, passa despercebida nas antologias e revistas críticas. O mundo emudecido da edição não faz muito melhor, graças à censura que de fato exerce na ocasião das publicações, pois assegura ao corpus canônico uma homogeneidade praticamente unívoca. (ALMEIDA; HAMOU, 1991, p. 42)

Hoje, não há justificativa cabível para o que se poderia tachar de “culto às celebridades masculinas”, isto é, para a marginalização da escrita feminina que se perpetua na atualidade, ainda que as mulheres desejem sair da periferia de onde emergiu seu discurso. Mas como deixar este lugar à margem, no qual foi forjada sua palavra, quando o centro não as escuta?

Reiterar a preocupação com o silenciamento das mulheres é reconhecer o fato de que, por mais que as mulheres tenham obtido significativos avanços sociais por provocação e ajustamento, por oposição, resistência e subversão, seu silenciamento forçado — e, em particular, a negação ou limitação da sua expressão literária — permanece contudo uma comum e dolorosa realidade. (ALMEIDA, 1994, p. 1)

A palavra que combate o silêncio não acaba por se extinguir, farta de todas as tentativas infrutíferas? A determinação demonstrada pelas escritoras serve de fortaleza contra o desencorajamento. Essa exclusão não as impede de continuar a escrever, porque elas compreenderam que a escrita pode ser uma arma eficaz contra o fardo da tradição que pesa sobre elas. A mensagem de Mariama Bâ ainda ressoa nelas:

Como não tomar consciência desse estado de fato agressivo? Como não estar tentada a levantar esse tampo social? Cabe a nós, mulheres, tomarmos nosso destino em nossas mãos para subverter a ordem estabelecida às nossas custas e não sucumbirmos. Nós devemos usar como os homens essa arma, pacífica, sem dúvida, mas certeira, que é a escrita. (BÂ, 1981, p. 7)

Continuar a escrever, então, é o único modo de essas mulheres experimentarem sua existência. Assim, escrever torna-se para elas uma verdadeira liberação e é nessa perspectiva que a maioria das mulheres enxergam sua prática de escrita. Tanella Boni, à questão de saber por quê ela escreve, responde: “Eu não sei ao certo. Talvez para não morrer” (BONI, 1994, p. 49). A escrita torna-se então um modo de sobrevivência. Escrever para sobreviver diante de um cotidiano hostil, escrever por se fazer reconhecer socialmente, o desafio é enorme, mas essas mulheres parecem determinadas a vencê-lo. Matar pela pluma o silêncio que as oprime, essa parece a missão a qual se entregam na trajetória em busca da escrita. Elas nos falam delas, mas também do continente africano que tanto trazem no peito:

Ce continent le leur avec sa forme en hache
surréelle ou une houe de labour dans la boue
dans le sable bavait sous leurs yeux angoissés
partagés en quatre en cinq cinquante
minuscules gâteaux de fête ce continent le
leur faisait figure de foire sous leurs yeux éplorés (BONI, 1993, p.11)

[Este continente, o deles\ com sua forma de machado\ surreal\ ou uma enxada de labor\ sobre a lama\ sobre a areia\ escorria de seus olhos angustiados\ divididos em quatro em cinco\ cinquenta\ minúsculos bolinhos de festa\ este continente, o deles\ fazia figura de festa\ sob seus olhos enlutados]

Solução para um contexto de exclusão, a escrita das Africanas é forjada nos moldes de reivindicação de um simples direito: falar em seus próprios nomes. Essa reivindicação flerta com os contornos de uma busca inicial: a de sua identidade:

J’aimerais être moi tu aimerais être toi
nous aimerions être nous être nous être
nous au nom du chaos casse-cou

(BONI, 1993, p. 56)

[Eu gostaria de ser eu tu gostarias de ser tu/ nós gostaríamos de ser nós ser nós ser nós/em nome do caos destemido]

Essa identidade se constrói ao escrever num espaço social deflagrado. Efetivamente, o espaço social africano se revela restritivo, desfavorável às mulheres devido aos inúmeros tabus e proibições que pesam sobre elas. Um território onde vigora o sistema patriarcal. É, portanto, um espaço hostil que as escritoras transformarão ao criar e ao sobrepor, por via da escrita, um outro espaço, apropriado à sua necessidade de liberdade e de criação. Este novo espaço é deflagrado à vontade, infinito, e simboliza sua recusa às balizas impostas pela tradição.

Ainda que haja razões para serem amargas, as escritoras africanas não seguem a linha de uma escrita vingativa. Se elas se servem da pluma como de uma arma, é no sentido da construção. Ao denunciar o silêncio que as cerca e também a atmosfera nociva que permeia todo o espaço social em que elas vivem (injustiças, corrupções, ditaduras), elas carregam as pedras para a construção de uma sociedade onde o sol brilhará para todos enfim:

Je voudrais être foudre et éclair
Avoir pouvoir de mettre
L’espoir là où l’espoir manque

(FALL, 1979, p. 38)

[eu gostaria de ser raio e trovoada\ ter poder de levar\ esperança onde esperança não há]

Nous bâtirons pour lui
Des fermes claires
Et des maisons en dur
Nous ouvrirons les livres
Et soignerons les plaies
Nous donnerons un nom
À chaque mendiant du coin
Et habillerons de basin
Les plus petits d’entre eux
Il faut savoir bâtir
Sur les ruines des cités
Savoir tracer
Les chemins de liberté.

(TADJO, 1984, p. 22)

[Nós construiremos\ fazendas claras\ e casas sólidas\ nós abriremos os livros\ e curaremos as pragas\ nós daremos um nome\ a cada pedinte das esquinas\ e vestiremos com basin\ os mais pequenos dentre eles\ é preciso saber construir\ sobre as ruínas das cidades\ saber traçar\ os caminhos da liberdade.]

A missão que essas escritoras reivindicam para si é do tamanho de sua ambição: reconstruir a África, participar do desenvolvimento de seu continente, fazer ouvir um pouco mais do que o eco dos “miseráveis que não tem voz” ao denunciar com firmeza os males que freiam esse desenvolvimento, tal é a cláusula do contrato que as liga às suas sociedades. Elas se sentem num grande dever de solidariedade com suas companheiras desfavorecidas em todos os planos, as esquecidas pela história, cujo único mal, aparentemente, é ter nascido mulher num mundo de homens. Elas não são se encontram em melhores condições, e isso explica que seus cantos assemelhem-se a longos lamentos:

Mais tu es encore là la mémoire en lambeaux
Sur cette Terre en poussière et tu murmures
il y a des misères partout tu passais par là
un de ces jours tu pensais immobile
comme le Pouvoir il y a des misères partout
alors les misères t’ont répondu en choeur
comme des mains ouvertes oui bien sûr il y a des femmes partout comme des nuages
dans l’air du Temps

(BONI, 1993, p. 51)

[Mas tu ainda estás ali\ a memória em retalhos\ Sobre esta Terra de pó\ e tu murmuras\ há misérias por todo lado\ tu ali passas\ dia desses\ e pensas\ imóvel\ como o Poder\ há misérias por todo lado\ ainda que as misérias tenham respondido\ em coro\ como as mãos abertas\ sim certamente\ há mulheres por todo lado\ como nuvens no ar do Tempo.]

A problemática da existência de uma escrita feminina africana não pode ser analisada sem levar em conta seu contexto de emergência. Esse contexto de emergência encerra um topos, o do silêncio, e delimita um espaço, o da marginalidade. O discurso feminino que se elabora depois de um longo período de silêncio carrega as marcas do ostracismo e confronta-se com o discurso hegemônico patriarcal. Lembremos que:

A hegemonia não é apenas aquilo que, nos vastos rumores dos discursos sociais, externaliza-se mais alto, mais forte ou nos mais variados locais. Também não se trata de uma dominância quantitativa. A hegemonia é um conjunto de mecanismos que impõe, sobre o que se diz e sobre o que se escreve, aceitabilidade e estratifica as gradações e as formas de legitimidade. Assim, a hegemonia, em síntese, age formalmente como um cânone de regras e de imposições legitimadoras, e, socialmente, como um instrumento de controle, como uma vasta sinergia de poderes, de restrições, de meios de exclusão, ligados a arbitrariedades formais e temáticas. (ANGENOT, 1988, p. 300)

Ainda que não haja leis que proíbam as mulheres africanas de se expressarem, as condições para uma liberdade total de expressão ainda não foram atingidas e as escritoras frequentemente apreendem seu estatuto de mulher como uma limitação à prática da escrita. O mundo da edição e as estruturas de difusão permanecem verdadeiros labirintos para elas. Esperamos que a palavra das mulheres possa desabrochar, liberta de todos os tabus e que a sua presença na cena literária africana seja melhor apreciada e reconhecida.

OUÉDRAOGO, Angèle Bassolé. “Et les Africaines prirent la plume! Histoire d’une conquête”, Mots Pluriels, n. 8, out. 1998. Disponível em: <http://www.arts.uwa.edu.au/MotsPluriels/MP898abo.html>.

Notas da tradutora

* Segundo o Dicionário de Expressões Lintern@ute, a expressão “tomar a pluma” (‘prendre la plume’) é uma metáfora que designa o ato de escrever. “Na verdade, originalmente, os ;homens de letras; escreviam com uma pluma encharcada na tinta. A expressão é empregada nesse sentido desde o século XVII, e aproxima-se de outras expressões tais como ‘ter uma bela pluma’, ‘saber manejar a pluma’.”

** Dra. Angèle Bassolé Ouédraogo é mestra (Université de Ouagadougou) e doutora em Letras (Université d’Ottawa), e graduada em jornalismo (Université de Montréal). Ela lecionou em Burkina Faso e no Canadá. Conjuga seu trabalho de professora com sua atividade como repórter e colunista. Seu interesse pela literatura feminina africana e, particularmente, pela poesia de autoria feminina data de muitos anos. Ela contribuiu, entre outros projetos, para o desenvolvimento do site Ler as mulheres (Lire les femmes).

*** “Nossos ancestrais os gauleses” (‘nos ancêtres les gaulois’) faz referência ao “mito originário” do povo francês, que figurava também nas cartilhas escolares das colônias, forjando no ideário histórico dos estudantes dos territórios coloniais uma “ancestralidade” comum entre os colonizadores e os colonizados.

**** A autora aproveita-se do conceito de “l’arbre à palabre” que é tido como espaço de discussão dos problemas internos da comunidade, onde eram tomadas pública e coletivamente as decisões. Segundo o Frei Benu Penoukou, “simboliza o lugar da palavra livre, retirada do domínio primado para ser entregue a todos. A comunidade regula nesse espaço todas as diferenças que perturbam a paz social. A ‘palabre’ é então um processo de diálogo abrangente em busca de um consenso permanente — mas sempre aberto — e construtivo. Esse diálogo pela ‘palabre’ é de tal modo imperioso na vida de uma comunidade que tudo se passa em conjunto: come-se, bebe-se, educa-se, intrui-se e inicia-se à sabedoria ancestral num mesmo lugar”.

Importante ressaltar que todas as citações foram traduzidas sem o suporte do texto original, o que pode ter comprometido a fidedignidade da tradução, principalmente dos trechos literários.

Notas da autora (referências bibliográficas em ordem de aparição)

[1] Annette M’Baye. Poèmes africains. Paris : Centre national français, 1965.

[2] Marie-Claire Matip. Ngonda. Paris : Bibliothèque du jeune Africain, 1958.

[3] Ambroise Kom. Éducation et démocratie en Afrique : le temps des illusions. Paris : L’Harmattan, 1996.

[4] Ahmadou Kourouma. Monné, outrages et défis. Paris : Seuil, 1990, p. 130.

[5] Ama Ata Aïdoo. “To be an African Woman Writer. An overview and a detail”. Criticism and Ideology. Uppsala : Scandinavian Institute of African Studies, 1988, p. 170.

[6] Mariama Bâ. “Fonctions politiques des littératures africaines”. Écriture française dans le monde, v. 3. n. 5, 1981, p. 6 .

[7] Simone Kaya in Jean- Marie Volet et Ormerod Beverley. Romancières africaines d’expression française : Le Sud du Sahara. Paris : L’Harmattan, 1994, pp. 81–82.

[8] Ama Ata Aïdoo. op. cit., p. 165.

[9] Irma Garcia. Promenade femmilière. Recherches sur l’écriture des femmes. Paris : des femmes, 1981, p. 29.

[10] Lloyd Brown. Women Writers in Black Africa. Westport : Greenwood Press, 1981, p. 67.

[11] Irène Assiba d’Almeida et Sion Hamou. “L’écriture féminine en Afrique noire francophone : le temps du miroir” . Études littéraires, v. 24. n. 2, 1991, p. 42.

[12] Irène Assiba d’Almeida. Francophone African Women Writers : Destroying the Emptiness of Silence. Gainesville : University Press of Florida, 1994, p. 1.

[13] Mariama Bâ, op. cit., p. 7.

[14] Tanella Boni in Jean-Marie Volet et Ormerod Beverley. Romancières africaines d’expression française : Le Sud du Sahara, 1994, p. 49.

[15] Tanella Boni. Grains de sable. Limoges : Le bruit des autres, 1993, p. 11.

[16] Ibidem, p. 56.

[17] Kiné Kirama Fall. Les Élans de grâce. Yaoundé : Clé, 1979, p. 38.

[18] Véronique Tadjo. Latérite. Paris : Hatier, 1984, p. 22.

[19] Tanella Boni, op. cit., p. 51.

[20] Marc Angenot. “Pour une théorie du discours social : problématique d’une recherche en cours” . Littérature, n. 70, 1988, p. 300.

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