LEGION é um grande avanço na qualidade de séries de herói

Roberto Honorato
Rima Narrativa
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5 min readMay 12, 2017

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Não entenda mal o título da matéria, eu fiquei muito animado com o que Demolidor fez para as adaptações em quadrinhos (conseguiu fazer melhor que alguns filmes do MCU até, me crucifique), mas Legion me traz uma sensação de algo diferente, ainda mais original. Tá, crucifiquem logo. Mas termine de ler o texto antes.

Por mais que eu ame um Agents of S.H.I.E.L.D. (a série deu um pulo estratosférico de qualidade, sério) e adore alguns episódios de Gotham, não deixo de notar que eles seguem uma linha bem padronizada. Nada de errado seguir uma fórmula quando ela funciona, é aquela coisa: eu nunca trocaria meu arroz e feijão bem temperado por um prato gourmet sem sabor algum.

Mas é aí que está o problema, não dá pra viver só de arroz e feijão, e por isso eu preciso de Legion, que é tipo a batata frita no meu prato, sempre bem vinda e pode ser feita de várias formas. Agora vamos falar da série porque eu já tô com fome.

Leia mais: “E houve boatos que Agents of S.H.I.E.L.D. estava na pior”

Já falei antes como Legion poderia ser uma das maiores surpresas do ano. Criada por Noah Hawley, responsável por Fargo, outra série maravilhosa que se tornou uma das minhas favoritas, Legion estava no topo da minha lista de espera para lançamentos de 2017.

A produção se passa no universo mutante dos X-Men e conta a história de David Haller. Cansado de ouvir as vozes em sua cabeça, Haller vive em um centro de tratamento da saúde mental, onde passa pela rotina diária de tomar medicamentos e ser avaliado psiquiatricamente. Mas algumas pessoas acham que ele tem mais do que um distúrbio mental, mas sim poderes impressionantes. Logo a série dá lugar para salas de interrogatório, agentes do governo, instalações militares e muitas, mas muitas duvidas na cabeça de quem assiste.

E agora que a primeira temporada acabou, posso dizer que valeu a pena esperar.

A temporada teve oito episódios, cada um mais intenso que o anterior. A jornada de David foi construída com cuidado, usando os três primeiros episódios dentro do instituto Summerland para desenvolver melhor os personagens antes que a ação tomasse conta. E o elenco é um acerto gigantesco. Dan Stevens como David consegue transmitir toda a paranoia que um personagem atormentado como este carrega, e quando ele tem que soltar sua raiva, é sempre lindo de ver.

Syd (Rachel Keller), Cary (Bill Irwin), Ptonomy (Jeremie Harris) e Kerry (Amber Midthunder) são alguns dos residentes de Summerland, cada um com habilidades e características interessantes que mantêm o público curioso. O que Ptonomy pode fazer? Com funciona essa relação Cary x Kerry?

Jean Smart é Melanie Bird, uma das personagens mais misteriosas da série, ao lado de Oliver (Jemaine Clement, excelente como sempre). A relação deles é a mais trágica da série, rendendo os momentos mais tocantes da temporada.

Mas é claro que a estrela da série é Aubrey Plaza como Lenny, a grande antagonista de David. Plaza tem carisma e atua bem o suficiente pra te cativar e assustar ao mesmo tempo. Sigo o trabalho dela desde Parks and Recreation e posso dizer que esse é facilmente o seu melhor, talvez melhor que o de muita gente nos últimos anos. Ela é assustadoramente convincente e se não levar um Emmy, NO MÍNIMO, é atestado de que o mundo já pode explodir.

Mas não é só no elenco que a série acerta. Toda a produção tem um ótimo tratamento, com direção de arte como poucas séries se dedicam a ter. Só posso comparar com algo no nível de Sherlock, com suas transições e escolhas criativas para execução de alguma cena. A forma como conseguiram transmitir a insanidade de David é bem convincente, ainda mais se você largar tudo que estiver fazendo e realmente prestar atenção em cada pedaço desse quebra-cabeça, cada vez que algo passa rápido na sua frente ou uma bola de pingue pongue está batendo ou uma caixa de música toca quando David está no seu limite. Muita gente ficou sem entender algumas partes da série, mas essa é a intenção de Legion, usando um narrador nada confiável, uma história contada de forma não linear e a forma como brinca com sua expectativa.

A escolha musical da série também deixa bem claro o que ela quer passar. Radiohead, Jane´s Addiction e Robert Plant fazem parte da trilha, eles casam perfeitamente com a atmosfera confusa de Legion. Vale mencionar que as duas melhores sequencias da série são ao som de Feeling Good de Nina Simone e Breathe da Pink Floyd.

E ainda sobre a questão da série ser “confusa”, considere isso: se uma série sobre um jovem atormentado mentalmente em um mundo cheio de pessoas com superpoderes seguisse um rumo narrativo mais óbvio, não faria sentido algum contar a história. E isso me lembra o que aconteceu esse ano com Punho de Ferro. Se você tem uma premissa interessante, aproveite ela. Enquanto Punho de Ferro traz vários elementos místicos e de artes marciais, saindo nada de original, Legion usa seu argumento de forma honesta, te deixa no lugar de David, você precisa prestar atenção e não esquecer o que foi aprendendo ao longo dos episódios. É sério, a série não vai te perdoar por não prestar atenção, mas se você fizer o que ela quer, a recompensa é gigantesca.

É uma jornada que pode te assustar (tem cenas que parecem tirada de um filme de horror) e embaralhar seu cérebro em alguns momentos, mas é uma que vale a pena seguir. Legion tem coragem para pegar todo o absurdo dos quadrinhos e transformar em parte do cotidiano, com poderes, viagens para o plano astral ou alteração de realidade.

É facilmente uma das melhores séries que eu já vi (de forma geral mesmo, tá ali com meus Hannibal, Breaking Bad e Fargo), e se continuar assim, nesse nível de qualidade narrativa e técnica, com atuações excepcionais e nenhum medo de ser completamente diferente de tudo, pode vir, meu corpo está pronto!

Nunca duvidei de você, Noah

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Roberto Honorato
Rima Narrativa

"Mad Mastermind". Eu gosto de misturar palavras e ver no que dá. Escrevo sobre ficção científica para o Primeiro Contato e cinema para o Rima Narrativa 📼