Tire os olhos da bola #5 —TD corrido Ravens

Cassia Pires
Esportismo
Published in
5 min readOct 23, 2019

Há algumas semanas recebemos uma sugestão de tipo de jogada para ser analisada. A seguimora Gabriela Jorge nos pediu para analisar uma corrida. Claro que em algum momento o ataque terrestre apareceria, mas confesso que eu atrasaria o quanto fosse possível, porque é onde eu tenho mais dificuldade.

Eis que essa foi a sugestão de jogada que Deivis Chiodini me passou para esta semana:

Uma corrida linda do quarterback dos Ravens, Lamar Jackson, que acabou em TD.

Deixe de lado (quase) tudo o que vimos até aqui

Qual foi a primeira coisa que eu fiz quando comecei a analisar a jogada? Identificar personnel. Fui lá contar quantos RBs e TEs estão na formação ofensiva. Nesse momento, entra o Faustão na sua cabeça gritando “errrrou”. Hoje não, jovem. Quem está ao lado do QB é Hayden Hurst, o número 81, um tight end. Além disso, eles acrescentam mais um OL na linha ofensiva. O nome dessa formação é “jumbo”.

Formação Jumbo

Também chamada de goal line, é uma formação para conquista de poucas jardas, utilizada próxima à endzone. Não há wide receivers na jogada e geralmente são empregados três TEs e dois RBs. Outra opção, como é nesse caso, um jogador mais pesado ocupa a posição do RB, para funcionar como um bloqueio extra. Nessa jogada é um tight end, mas também pode ser um OL ou até mesmo um DL.

A defesa aqui se posiciona posiciona próxima à linha de scrimmage, para conter essa formação. Vamos focar muito no ataque no Tire os Olhos da Bola de hoje.

O jogo está empatado no finalzinho do 3º quarto. O HC do Baltimore tinha chamado um FG, porque era uma 4ª descida para duas jardas, na linha de 11 do campo da defesa. Mas daí, John Harbaugh pergunta ao Lamar Jackson se ele quer arriscar e o quarterback diz: “Hell yeah, Coach! Let’s go for it!”. Então vem o pedido de tempo, sai o time de FG e volta o ataque.

No vídeo abaixo, o momento que eles decidem arriscar a 4ª descida. Spoiler alert: a empolgação do Lamar é uma coisa de arrepiar.

Tá, mas e a jogada?

Ok, voltemos para a jogada.

Antes do snap tem um motion do número 42, que é um running back de posição. Ele leva a defesa para o lado direito, porque mesmo que ele não receba a bola, ele vai bloquear daquele lado (e é o que ele faz mesmo).

Na imagem abaixo, está destacada a movimentação de bloqueio de cada um dos jogadores ofensivos.

O RB faz um bloqueio chamado trap: ele se move lateralmente e bloqueia algum jogador mais próximo à linha de scrimmage. Nessa jogada aqui, ele pega o jogador mais aberto.

O left guard (77) faz um bloqueio chamado pull. Ele funciona como um lead block, fazendo o bloqueio no segundo nível da defesa (linebackers).

Parece um bololô, mas é balé

O TE 81 também tem a função de lead block. Junto com o LG, ele vai abrir o caminho para que o quarterback ganhe as duas jardas necessárias para o first down. Veja na imagem abaixo que isso funcionaria. Indiquei os lead blockers com setas vermelhas e o ball carrier está circulado em vermelho.

Agora vem o pulo do gato do Lamar Jackson. A jogada foi desenhada para ganhar as duas jardas necessárias e já seria sucesso. No entanto, ele percebe que a defesa abre um buraco do seu lado esquerdo. Então, ele faz um corte rápido e chega à endzone.

Oi oi oi oi (Avenida Brasil)

Outros pontos que merecem atenção

Nas linhas ofensivas e defensivas o alinhamento e a forma de bloqueio são muito orientados pelo ombro dos jogadores. Esse conceito é importante para que os jogadores direcionem o adversário para o lado que eles querem. Se eles erram o ombro (interno ou externo), a chance da jogada dar errada, aumenta.

Como hoje estamos focando no ataque, note que os bloqueadores das extremidades ganham o ombro interno dos seus defensores (imagem abaixo, círculos azuis). Isso é importante para que a defesa não ganhe o meio, caso eles vençam os bloqueadores. Dessa forma, o caminho para chegar até o QB é maior (por fora).

A movimentação lateral para a realização dos bloqueios ajudam o alcance do ombro interno, mais do que se eles bloqueassem quem está diretamente à frente, além do fator surpresa da movimentação.

Por último e talvez nada importante, você pode ver que o RB, durante o play action ergue os braços. Sabe por que? Não? Nem eu! Provavelmente ele se assustou com o snap e ergueu os braços para evitar desviar a bola, hahaha!

Que susto!

Pronto. Agora é só dar o play no vídeo abaixo e tirar os olhos da bola para enxergar tudo isso.

No jogo corrido existem muito mais análises que podem ser feitas, principalmente nas trincheiras, mas vamos devagarinho, ok?

Essa coluna conta com a colaboração do Deivis Chiodini, analista no @OntheClockbr, podcaster do @MileHighBrasil e redator no @profootballbr.

Para ler as outras análises, clica aqui.

*Tire os Olhos da Bola* é o título de um livro escrito pelo ex-técnico de futebol americano Pat Kirwan. O autor explica, de maneira bem completa, que para entender o esporte é preciso tirar os olhos da bola. O nome dessa coluna se inspira no livro.

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