Livro de Gina, Mulheres Inspiradoras, é o produto de tantas outras inspirações. Amanda Gil

As mulheres por trás da mulher

Amanda Gil
Esquina On-line
Published in
6 min readMay 4, 2018

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Conheça um pouco das histórias das mulheres que inspiram Gina Ponte Vieira de Albuquerque

Gina é a criadora do Mulheres Inspiradoras, um projeto escolar dividido em três partes. A primeira consiste na apresentação de livros de autoria feminina aos alunos: Carolina Maria de Jesus, Irena Sendler, Malala, Maria da Penha, Nise da Silveira e Cristiane Sobral. E aqui, você, leitor, irá conhecer um pouco mais sobre algumas destas mulheres.

Vamos começar com a já conhecida por todos, Maria da Penha. Ela era casada com um homem que estava com ela por puro interesse. Ele mesmo simulou um assalto na casa onde os dois moravam, e atirou na esposa enquanto ela dormia. Maria sobreviveu, mas perdeu os movimentos das pernas. Quando saiu do hospital, o marido proibiu que a família fosse vê-la. Ela dependia dele para tudo: alimentar-se, tomar banho, trocar de roupa, locomover-se... Um dia, na hora do banho, Maria percebeu que ele pretendia matá-la eletrocutada, e conseguiu escapar. Hoje, a proteção Lei Maria da Penha existe para proteger a segurança da mulher.

Para conhecer a história de Gina em detalhes, leia a reportagem da Revista Esquina.

Nise da Silveira estudou medicina em 1962 , e era a única mulher da turma de 156 homens. “Tentaram convencê-la a desistir do curso”, conta Gina. “Disseram ‘você não vai dar conta, isso não é coisa de mulher. É coisa para homem’.” E contrariando a tudo e a todos, ela fez medicina. Formou-se em psiquiatria e reinventou o ramo. “Hoje, a psiquiatria se divide em antes e depois de Nise da Silveira”, conta Gina. “Foi ela quem acabou com os tratamentos que representavam violação de direito, como o uso exagerado de eletrochoque, medicação psicotrópica e outras coisas.”

Anne Frank e Malala são outras autoras apresentadas no projeto. Amanda Gil

Carolina Maria de Jesus nasceu em Minas Gerais, mas teve de fugir para o Morro do Canindé, em São Paulo. Estudou só até a segunda série primária, porque não havia escola na região onde morava. Cuidou dos três filhos sozinha, porque nenhum dos pais quis assumi-los, e se tornou catadora de lixo. No trabalho, ela achava livros, cadernos, estudava por meio deles. A situação de pobreza na qual ela vivia, era tão absurda, que Carolina teve pensou muitas vezes em suicídio. Para não se matar, começou a escrever. Todos os dias, ela anotava em um caderno velho o que acontecia com ela (assim como a Gina).

Um dia, um jornalista foi para o Morro do Canindé produzir uma reportagem. Carolina, que era uma mulher muito atenta, estava discutindo com o repórter, que tinha invadido o parquinho das crianças e disse a ele, “se você fizer isso que você está fazendo, eu vou colocar seu nome no meu livro”. Ele ficou sem entender como uma mulher naquele lugar e naquelas condições tinha um livro e foi atrás para saber quem era ela. Ele foi ao barraco dela, olhou as anotações, ficou impressionado e transformou em um livro, hoje best-seller.

Na época, a primeira edição vendeu mais de 100 mil exemplares. Um dos livros foi traduzido na França antes de ser publicado no Brasil. Ela, no lugar de mulher negra, favelada, semi-alfabetizada, escreveu seu nome na história da literatura brasileira e deu voz a quem nunca era ouvido: os favelados.

Cristiane Sobral. Arquivo pessoal

Cristiane Sobral nasceu no Rio de Janeiro, em um bairro chamado Coqueiros. Ela é escritora, atriz, diretora e professora de teatro e mãe. Veio morar em Brasília no início dos anos 1990 e costuma dizer que divide a identidade entre o Rio e a Capital, cidade escolhida para viver. Ainda na infância, Cristiane já tinha o desejo de ser escritora. “Eu sempre fui muito apegada com a leitura, desde o meu processo de alfabetização. Fiquei encantada com o universo das letras e ali ainda nessa temeridade, eu comecei a pensar nas possibilidades de trabalhar profissionalmente como escritora”, relata ela.

No passar do tempo, foi fortalecendo essa minha perspectiva de colocar o meu ponto de vista tanto na literatura, como no teatro, em função do desejo de escrever histórias que representassem o povo negro, que representassem o universo feminino e que fossem contadas a partir do nosso ponto de vista, do meu ponto de vista enquanto mulher negra, mulher brasileira e isso me pautou.

Livro de Cristiane Sobral é o amarelo a esquerda: Não vou mais lavar os pratos. Amanda Gil

“Não vou mais lavar os pratos” é o título desta obra que levou uma moça a procurar Cristiane para pedir um autógrafo em São Paulo. “Ela me relatou que quando leu minha obra, trabalhava como empregada doméstica, e que aquele livro foi muito impactante”, é assim que a escritora começa a história.

A leitora era mãe solteira, com quatro filhos, que trabalhava em uma residência de luxo na Capital Paulista. Os patrões não permitiam que ela frequentasse a escola e ainda faziam com que ela dormisse na casa, deixando os filhos sozinhos para poder trabalhar.

“No momento que ela leu a obra, ela sentou no chão, começou a chorar e fazer uma revisão de vida. Decidiu que iria abandonar aquele emprego para poder voltar a estudar e fazer alguma coisa diferente daquilo que ela estava fazendo. Ela esperou o patrão chegar e com muita humildade foi pedindo desculpas, agradecendo por tudo que ela tinha recebido daquela família e pedindo a demissão”, Cristiane narra a história da ex-empregada, que se surpreendeu com a resposta do patrão, que foi a pior possível.

Segundo a escritora, a mulher contou que ele a humilhou. Disse que ela poderia sim estudar os manuais dos aparelhos eletrodomésticos, que ela era como um animal de estimação para a família e que achava muito triste perdê-la. E como se não fosse suficiente falou mais, “que, se ela fosse trabalhar, ela teria que fazer um currículo e ele achava que isso não seria possível, porque o currículo teria que ter uma foto 3x4, e o cabelo dela era muito feio, ela era muito feia, segundo ele, não caberia numa foto 3x4”, conta Cristiane, indignada.

A tal moça saiu da casa deste homem terrível de cabeça erguida. Foi atrás do que ela queria, conseguiu fazer um pré-vestibular oferecido para a população negra e pobre e começou a estudar. Segundo Cristiane Sobral, chegou um momento da conversa que, ela parou de falar, abriu a bolsa, tirou um cartão de visitas e a entregou. “Estava escrito o nome completo, ‘advogada’ e o número da Ordem dos Advogados do Brasil.”

A história desta mulher mostrou para Cristiane a importância do que ela escreve, desse tipo de representatividade, desse outro olhar para a história das mulheres negras e periférica. “Eu sempre gosto de compartilhar e eu deixo aqui como uma mensagem de esperança, uma mensagem de luta. Ainda temos muito a trabalhar, mas estamos aqui, estamos de pé.”

Pesquisas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), evidenciam a tamanha desigualdade de gênero presente no mercado de trabalho. Os dados de tais estudos estão explicados nos infográficos abaixo.

Fonte: PNAD

Note que as únicas categorias em que a porcentagem de mulheres é mais alta que a dos homens, são as de desemprego e assalariamento. De resto, os homens são sempre maioria ou recebem mais, no caso do rendimento médio mensal, que difere em cerca de quase R$500.

Já no infográfico seguinte, são apenas dois dados que mostram o claro contraste entre os gêneros. Os homens estão presentes em maior números nos cargos gerenciais, mas as mulheres são quem trabalha mais, em questão de horas de trabalho.

Fonte: IBGE, 2018

Sobre essas lutas das mulheres negras e brancas, ouça o podcast abaixo que aborda como é ser mulher no mercado de trabalho. Especialistas e mulheres discutem as dificuldades enfrentadas no dia a dia. Ouça abaixo:

Cristiane tem um recado importante para toda a sociedade: é preciso esquecer as ideias produzidas pelo preconceito geral e olhar o mundo com “lentes” mais humanas.

Cristiane Sobral recita um poema de sua autoria: Lente de Contato.

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Amanda Gil
Esquina On-line

Estudante de jornalismo. Amante do esporte. "Ideas are bulletproof."