[1722] Brás, Bexiga e Barra Funda

Arthur de Siqueira Brahm
Prosa distraída
Published in
2 min readApr 16, 2022

Antônio de Alcântara Machado

Em algum momento da leitura desse livro me acertou em cheio a lembrança de “Malagueta, Perus e Bacanaço”. Nada relacionado à estrutura tripla do nome do livro, mas a mesma preocupação aparece no fundo de ambos os livros. Claro, o que chamamos de preocupação do autor é nada mais o que uma meia-dúzia de sugestões no texto que o leitor encadeia em um sentido maior.

Porém, a comparação é válida porque esse sentido facilmente permeia ambos os textos. O livro do Alcântara Machado pode ser entendido como precursor tanto na questão da narração da vida popular de certos moradores de São Paulo quanto na questão do estilo, extremamente colado à linguagem cotidiana e informal, e marcado pela concisão de fatos narrados.

Há também o ângulo mais comum de comparação, feito a partir da chamada Geração de 22 e das preocupações daqueles primeiros modernistas. Mas a verdade é que nada disso importa de verdade. O que importa é que o que existe nessas páginas é ficção de verdade, aquela recriação da vida feita de tal forma que o leitor não consegue não enxergar os personagens, não sentir seus anseios ou conhecer seus detalhes. Isso passa pela linguagem humana (mesmo com quase um século de distância) e pela habilidade da narração, mas parte antes de tudo com o compromisso com aquilo que o Érico Veríssimo chamava de ser um “contador de história”. O início e o fim de todo escritor, por supuesto.

O próprio Alcântara Machado chamou os textos mais de “jornalismo” do que “ficção”. Talvez fosse o escudo do desinteresse que um jovem escritor usava para aliviar o olhar crítico dos seus leitores. Pois bem. Não deveria. Aqui há o um grande exemplo da prosa das nossas cidades, sem a obsessão pela miséria do que seria chamado de “realismo social”, nem a indiferença social que marcava a prosa do século XIX. Há aqui a semente de um escritor que se foi cedo demais, mas nos deixou fragmentos vivos de um mundo que não existe.

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