Relacionamento interpessoal: a comunicação acontece nos detalhes

Eduardo Kruger
Estação Asaas 🚀

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Depois que escrevi esse texto sobre relacionamento interpessoal na área de TI, fiz alguns bate-papos com amigos e recebi alguns feedbacks interessantes sobre o assunto.

Os mais entusiasmados, me disseram que todos os seus pares e gestores deveriam obrigatoriamente ler o artigo.

Já os mais incrédulos, me disseram que tudo isso é papo furado de autoajuda.

Habilidades de comunicação. Foto: Wikipedia.

Nos períodos mais confusos e enrolados da minha vida profissional, o que percebi é que a comunicação acontece nos detalhes: como formulamos as frases, quais palavras usamos, quando fazemos perguntas e como nos expressamos. A forma é tão importante quanto o conteúdo.

WHAT?!?!

Deixa eu tentar exemplificar.

Primeiro o porquê, depois o como.

Ninguém gosta de receber ordens. Principalmente quem tem um sentimento de ownership mais desenvolvido, pode se sentir bem desconfortável ao receber instruções em como realizar o seu trabalho.

Geralmente quando queremos mover as pessoas para a ação, por questões de simplificação, utilizamos frases como:

“Pessoal, vamos trabalhar 2 horas a mais por dia, para podermos entregar o projeto até o final da semana.”

Existem pelo menos 3 problemas com essa frase:

  • 1- Estou sugerindo "o como" (trabalhar 2 horas a mais por dia) antes do ouvinte ter a oportunidade de entender o problema.
  • 2- Estou perdendo a oportunidade de ouvir a opinião de quem provavelmente é o especialista no assunto.
  • 3- O porque (entregar o projeto até o final da semana) não é o real motivo pelo qual a maioria das pessoas trabalhariam 2 horas a mais por dia. Na verdade, não é o motivo pelo qual trabalham nenhuma hora do dia.

Quando você inicia o seu discurso dando instruções em como as pessoas devem fazer o seu trabalho, tudo o que você irá conseguir é resistência.

Não de ordens. Mostre o que as pessoas irão ganhar. Foto: Inc.

Agora imagine o seguinte:

1- “Existe uma grande expectativa de clientes com esse projeto que estamos desenvolvendo.”
2- “Se a entrega for realizada em breve, com certeza boa parte da empresa reconheceria os esforços de cada um de nós. Mesmo assim, me parece que a quantidade de trabalho seja muito maior do que podemos entregar.”
3- “O que poderíamos fazer para entregarmos esse projeto até o final da semana?"

  • 1: O porquê: Deixe as pessoas entenderem qual é o problema.
  • 2: Os Benefícios: Reconhecimento nos remete indiretamente a outros benefícios, que mesmo não sendo ditos, estão subentendidos, por exemplo: maiores possibilidades de promoção ou o sentimento de entregar uma ótima experiência para o cliente.
  • 3: A ação: Uma pergunta ao invés de um comando. Faça perguntas e deixe as pessoas livres para resolverem o problema da melhor forma possível.

Dá mais trabalho? Sim. Mas aumentam as chances das pessoas te escutarem e receberem a informação de forma menos desconfortável.

Deixar claro "o que as pessoas vão ganhar com isso" é a única chance de você promover engajamento ao seu discurso.

Primeiro escute, depois escute e depois pergunte.

O que a maioria das pessoas querem em uma conversa é se sentirem ouvidas. Isso não é novidade para ninguém. Dale Carnegie descobriu isso ainda na década de 30:

“Você pode fazer mais amigos em dois meses demonstrando interesse nas pessoas do que em dois anos tentando que as pessoas se interessem em você.” (Dale Carnegie, Como fazer amigos e influenciar pessoas)

Bons psicólogos em sessões de psicoterapia se utilizam de escuta atenta e estruturada para fazer com que seus clientes se sintam mais a vontade para falar sobre a sua vida.

A escuta atenta acontece geralmente numa razão de 80/20: 80% escutando e apenas 20% falando. Sabe aquela pessoa que você simplesmente gosta de conversar? É provável que ela priorize te escutar ao invés de falar.

Usar mais o ouvido do que a boca é, de forma geral, uma boa prática.

Primeiro escute. Depois Pergunte. Fonte: READIPOP

"Nós temos dois ouvidos e uma boca. Usá-los nessa mesma proporção não é uma má ideia!" (Richard Branson, Business Insider)

O poder do silêncio.

Outra forma simples e poderosa de conseguir se mostrar mais confiável para alguém é usar o silêncio a seu favor. Imagine o seguinte:

Seu amigo: Cara, acabei de pedir demissão...

Você: Sério? Achou outro emprego? Você estava ganhando pouco mesmo!

Vale lembrar que pedimos demissão de nossos empregos por inúmeros motivos. Insatisfação com a remuneração é apenas mais um.

Além disso, fazendo perguntas imediatamente você pode inibir a pessoa de continuar falando o que realmente aconteceu, principalmente se a sua pergunta estiver errada.

O poder do silêncio. Foto: ConferencesThatWork.

Seu amigo: Cara, acabei de pedir demissão...

Você: (Em silêncio, mas demonstrando preocupação…)

Seu amigo: Na verdade quero um tempo para cuidar da minha saúde.

Ops… as vezes, o silêncio é — por incrível que pareça — uma das melhores formas para manter o canal de comunicação aberto, principalmente quando você precisa que as pessoas compartilhem informações com você, sem influenciá-las e diminuindo o seu risco em falar alguma besteira.

Transforme uma negociação em brainstorming.

Existem milhares de livros sobre negociação e como utilizar os melhores argumentos em uma discussão. Mas quando você está no meio de uma reunião, com vários stakeholders, com muita "falação" e pouco consenso, é bem difícil manter o controle emocional e não acabar transformando a reunião numa verdadeira guerra de egos.

Ao invés de tentar aplicar dezenas de técnicas de negociação, para mim a estratégia de negociação que funciona de verdade é…

Nunca entrar numa negociação!

Pelo menos não de forma explícita.

WHAT?!?!

Evite entrar numa negociação de forma explícita. Foto: iPLeaders.

Imagine que você tem uma reunião importante para o final do dia. O tema da conversa vai ser — novamente — no estilo "Pessoal, precisamos entregar o projeto até o final da semana".

Você já sabe que o seu time não vai conseguir finalizar o projeto até o final da semana. Nem trabalhando 2 ou 1749 horas a mais por dia.

Stakeholder: Pessoal, precisamos entregar o projeto até o final da semana.

Você: É muito pouco tempo! Não vamos conseguir!

Stakeholder: Precisamos dar um jeito, esse projeto é importante!

Você: Precisamos de 3 semanas, no mínimo!

Se você aceitar o projeto até o final da semana, você irá fazê-lo contrariado.

Se você conseguir mais tempo para o projeto, o stakeholder irá ceder contrariado.

Em qualquer um dos casos, você sempre perde.

"Um homem convencido contra sua vontade continua com a mesma opinião". (Dale Carnegie, Como fazer amigos e influenciar pessoas)

Agora imagine o seguinte:

Stakeholder: Pessoal, precisamos entregar o projeto até o final da semana.

Você: (1) Me parece que esse projeto é muito importante para nós.
(2) Concordo que precisamos entregar o quanto antes. Até o final da semana seria o ideal.
(3) Mas como vamos fazer isso?

  • 1- Empatia: A primeira coisa que você pode tentar fazer é empatizar com o outro. As expressões "me parece" e "sinto que" funcionam muito bem nesses casos, pois mesmo que você fale algo errado, você ainda pode dizer "Ok, apenas me pareceu…". Criando empatia com o outro, você estará preparando o terreno para obter ajuda em como resolver o problema.
  • 2- Acordo: Concordando o mais rápido possível com o outro, você elimina o caráter de confronto da conversa. Isso economiza energia, "desarma" quem estava cheio de argumentos para convencê-lo sobre o seu ponto de vista e direciona a reunião para que todos foquem na solução do problema.
  • 3- Perguntas abertas: Como todos já concordaram que "é importante que o projeto seja entregue até o final da semana", o seu objetivo agora é engajar as pessoas para a resolução do problema.
    A melhor forma de conseguir isso é fazendo perguntas abertas do tipo "como podemos fazer…?" ou "o que podemos fazer…?".

Esses tipos de perguntas transformam sutilmente uma negociação em uma sessão de brainstorming para resolução do problema, em que todos — você, o stakeholder e todos os presentes — são co-responsáveis.

Empatia. Acordo. Perguntas abertas. Nessa ordem.

Transforme uma negociação em brainstorming. Foto: Business2Community.

Não subestime o alcance do seu discurso.

“Que diferença isso vai fazer? Ninguém dá a mínima para o que eu acho mesmo!”.

Em 2014 recebi um convite para fazer uma palestra na UDESC, universidade onde fiz minha graduação. Lembro que um dos palestrantes confirmados teria cancelado a presença e a organização precisava rapidamente preencher aquele horário. Eu nem gosto de falar em público e apenas o faço por necessidade. Mas enfim…

Naquela noite, foi quase tudo como eu imaginava: a plateia interagiu pouco e quase nenhuma pergunta relevante no final. Tudo dentro do previsto. Até seis meses depois… quando recebi essa mensagem:

Por incrível que pareça, a minha mensagem acertou em cheio alguém que eu nem conhecia. No meio de tanta gente que não deu a mínima”, uma pessoa entendeu a mensagem.

Naquele dia descobri uma das coisas mais importantes que alguém pode saber sobre comunicação e influência:

As suas palavras são uma das ferramentas mais poderosas que você tem.

“Somos o que expressamos. Melhor cuidar bem, portanto, daquilo que lançamos mundo afora.” (Alexandre Caldini Neto, Networking versus Notworking)

Suas palavras são uma das ferramentas mais poderosas que você tem. Foto: RobbieBach.

Resumindo:

  • Primeiro o porquê, depois o como: deixe claro “o que as pessoas vão ganhar com isso”. Essa é única chance de você promover engajamento ao seu discurso.
  • Primeiro escute, depois escute e depois pergunte: Aprenda a ser o último a falar na sala.
  • Utilize o silêncio ao seu favor: Muitas vezes a melhor forma de fazer com que as pessoas compartilhem informações com você é simplesmente ficando calado.
  • Evite entrar em uma negociação: Transforme uma negociação em sessão de brainstorming com a regra do "Empatia. Acordo. Perguntas abertas"
  • Não subestime o alcance do seu discurso: As suas palavras são uma das ferramentas mais poderosas que você tem. Cuide bem com o que você lança mundo afora.

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