Enquanto houver sol

Dayanne Dockhorn
Estrangeira
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3 min readDec 31, 2019

Quero ser definida pelo que eu amo. Não pelo que odeio.

Demorei a sentir essa frase. Entender por entender, eu entendia. Mas sentir é diferente. A combinação de palavras ficou martelando na minha cabeça desde o meio do ano, até que finalmente tive a realização em uma noite de dezembro sentada no carpete que imita grama. E então pude sentir as folhas nos dedos e a verdade das palavras. Se você não entende, não vê.

Coloquei importância demais no que não sou. Fui me definindo por um prefixo de privação. Sem casa, sem lar, sem filhos, sem correntes, sem trabalho típico, sem objetos, sem roupas novas, sem presentes, sem dívidas, sem planos fixos, sem contratos, sem cartão de crédito, sem endereço, sem telefone, sem idioma correto, sem certezas, sem paredes para preencher, sem lugar pra onde voltar, sem filtro nas mãos, sem papas na língua.

Reavaliar o que me deram de graça no bandejão da vida foi indubitavelmente necessário. Mas quando terminei, esqueci de dar ao que sou importância maior diante do que não sou. Meus primeiros erros — só chove aqui, e todo mundo parece pior do que é. Até hoje me limito pelo que não sou, pelo que não faço. Isso é suficiente para construir uma vida? Não, claro que não. Mas só vejo agora o arco-íris que esteve em cima da minha cabeça todo esse tempo.

Há uma certa tristeza em não querer aquilo que dá sentido à vida de tanta gente. Mas basta. Hora de deixar o sem para trás. Tempo suficiente sendo subtraída. Quero lembrar o que ficou depois que tudo aquilo foi embora. E, principalmente, lembrar tudo que encontrou em mim espaço para fixar raízes. Toda a luz e vida e abundância que eu permiti entrar. Preciso lembrar pra não esquecer.

Com liberdade de ser e liberdade de amar, com pressa, com fúria, com paixão, com poesia e sempre com mais intensidade do que o necessário. Com mais certeza, um pouco mais de orgulho, com alegria, música, limites e surpresas cada manhã. Com abertura para gostar do que antes não gostava, com vontade de viver o que é diferente de tudo que eu já conheci, com atenção e esmero pelo que não é meu, com uma corda bamba debaixo dos pés e uma vontade insana de encontrar equilíbrio. Com todas as casas que já quis, com todas as famílias que já fui, com todos os mares que já abracei, com todas as personalidades que já abriguei, com todas as montanhas que beijaram meus pés, com todas as artes que respiraram através do meu corpo, com tudo que já cruzou o meu caminho. Sempre com movimento.

Não sou vazia. Sou cheia e vou deixando lágrimas onde passo. Transbordo pelos lados e preciso de mais horas de sono do que as tais 8. É caminhando que se faz o caminho. Se a sorte lhe sorrir, por que não sorrir de volta? Quero ser lembrada pelo brilho dos olhos, não pelas caretas e os comentários. Quero ser definida pelo que eu amo. Não pelo que odeio. Não por aquilo que me assusta. Não pelas coisas que me assombram no meio da noite. Eu acho que… você é o que você ama.

Beijos no coração de quem achar as referências musicais e principalmente taylor swiftínicas.

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Dayanne Dockhorn
Estrangeira

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