A persistência de Clarice

Amanda Mazzei
Eu Lírica
Published in
2 min readMar 1, 2017
imagem: http://bhakri.deviantart.com/

Nasceu. Que pena!
Papai não conseguiu dessa vez seu parceiro
de futebol, bar, piadas, líder da casa.
Somente fadas, princesas e banco do carona.

Teimosa, Clarice!
Começou a crescer e já queria aparecer!
Não, não vai sair com teu irmão
é perigoso pra você.

Mal sabia, nem imaginava,
tudo que o mundo lhe tiraria.
Só por ter querer
Só por querer ter
Só por querer ser
mais do que deveria.

Seus olhos vieram errados.
Enxergava bem mais que
o rosa da boneca
o cinza da panela
o vermelho do batom
e o preto da lingerie.

Seus ouvidos estavam trocados.
Não sabia ouvir um “eu te amo”
e achar que sua vida está completa
que nada mais a afeta
se tiver a seu lado o tal oposto
gentil e cavalheiro,
que acha que ela não pode pagar
por um simples jantar
(apenas se debruçar e cozinhar)

Era tão gananciosa!
Não queria menos dinheiro,
menos amigas e só um parceiro,
menos palavras para poder falar.

Aliás, para que falar?
Fique calada!
Mulher é mesmo uma matraca.
Fica tão mais bonita com a boca fechada…
Será que você não percebe isso, Clarice?
Você está errada.

Se não queria ser exposta, por que se expôs?
Se não queria cantada, por que se arrumou?
Se não queria virar piada, para que opinar?
Se não queria apanhar, por que provocou?

Você sabe que ele não gosta de ser contrariado.
Sabe que não pode andar desse jeito
para todo lado.
Lado…
Não vá por aquele lado,
mude seu caminho
(o vizinho está olhando, que saia é essa?)
é só um assovio, não faz mal.
Para que se estressar?
A revista que te dei já ensina o que fazer:
“Sexy sem ser vulgar”

Felicidade, Clarice, é coisa secundária.
Amor-próprio, relativa.
Liberdade é utopia.
Mas o medo não,
o medo é dia a dia.

Que persistência, Clarice!
Você quer
ainda,
ser mais que uma casca vazia?

--

--