Feriado

isiscoelho
eu, mãe de 3
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3 min readNov 3, 2016

Feriado.

Acorda. Davi esta te chamando. Lute contra o sono, mulher. Você não pode mais dormir, seu filho está te procurando. Ah, as remelas. Mesmo produzidas em algumas poucas horas de sono, sismam em grudar os olhos, que precisam lutar contra a caca para abrir. Pronto. O bebê está ali, de braços abertos, pedindo colo. Eu estendo as mãos, faço um xiu xiu na esperança de que ele volte a dormir. Mas as risadinhas e os pedidos pelo café da manhã mandam meus desejos janela afora. A gente brinca. A gente morre de rir. Ligo a TV. Coloco num desenho x, o primeiro que aparece na programação. Cambaleando, saio pra preparar a mamadeira. O pai ainda baba no travesseiro. Antônio levanta me chamando. Mamãe, mamãe. Calma filho. Estou fazendo seu Tetê. Deita lá com o Davi que eu já vou. Falei sozinha. Ele grudou na minha perna e ficou choramingando para que eu o pegasse no colo — e eu ainda sem força nem pra abrir o olho direito. Agora que eu lembrei. O despertador tocou desesperadamente durante as primeiras horas da manhã e eu nem liguei. Por que esse lapso de atenção não funciona com choro de bebê? Enquanto os dois tomam leite, troco fraldas. Amor, acorda. Preciso ir ao mercado. Coloco o mesmo vestido de ontem. Decidi assumir o descabelado como estilo. Foda-se se eu pareço maluca. Talvez isso me conceda lugar especial na fila do açougue. Puta merda. Não são nem 8 horas da manhã e o mercado já está lotado. Tem gente se estapeando na banca da abobrinha. Mas pera: R$ 0,99/kg? Acho que tenho ânimo pra distribuir uns tabefes. Carne, hortelã, manga, sucrilhos, pão de mel, pão, suco de laranja. Limão — quem sabe rola uma cairipinha. Cerveja, se não rolar a caipirinha ainda sim tem birinaitis. Descarrega o carro. Mãe, quero pão. Toma, filha. Lavo a louça de ontem. Eu acho que elas devem seguir a mesma linha do milagre de Cristo. Mas quisera eu que se multiplicassem como peixe e vinho. Eu economizaria uma grana. Corta cebola, pimentão, abobrinha, berinjela. Pico a carne, que veio inteira. A panela chia e as crianças gritam. Mãe, me ajuda a pular a escada? Um, dois, três e …. Ai caraio. Mãe, tá doendo. Filha, calma. Respira com a mãe. Você só caiu de bunda. Vai dar tudo certo. (Levo pro hospital? Dou remédio? Choro de culpa até morrer?). Bora fazer arroz. Oi mãe, não ouvi você chegar. Cadê a vó? Ah. Que bom que ela veio. Senta aí. Tá quase tudo pronto. nossa! Mas a dona Sônia ja chegou também? Que coincidência! Amore, mas a carne já ta pronta? A churrasqueira é boa mesmo? Viu só? Eu sei bem escolher uma carne! Aí, filha, eu sei tá calor. Senta e almoça. Não, deixa que eu dou. Olha o aviaozinhooooo. Abre o bocão! Ah, que lindo! Muito bem, comeram tudo! Ufa, os meninos dormiram! Agora a gente pode brincar de água, filha. Vamos lavar o carro? Opa, hahahahahahahahaha a água tá fria? Corre pra dentro, toma um banho quente. Ave, que ideia de gerico inventar isso agora! Todo mundo dormindo?

Sentei no chão do quintal. O céu, com poucas nuvens, permite que o sol chegue ao solo, tocando minha pele e deixando que eu sinta o calor da felicidade.

Meus pés estão sujos.

Foda-se. Minha cerveja está gelada.

Que sol maravilhoso. Estava falando sol na minha vida. Puxa, algo tão simples, não é mesmo?

No verão, vou deixar todas as pelancas bronzeadas. Vai ter piscina de plástico, churrasco e melancia. Todo dia.

Só tá faltando uma rede… Eu dormiria 13 horas seguidas numa rede.

Mamãe! Opa. Deixa eu correr, que vai ter segundo tempo.

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isiscoelho
eu, mãe de 3

Jornalista que se viu publicitária e agora tenta o sonho adolescente: ser cronista.