Depois do riso, o choro

After Laughter, disco da banda Paramore, mostra o quão agridoce a vida consegue ser

Juliana Ojuara
EUFORIA

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Paramore é uma banda que começou cedo. Os integrantes — Josh Farro, Zac Farro, Jeremy Davis, Hayley Williams e mais tarde Taylor York — eram muito jovens quando começaram a tocar juntos. Hayley, a vocalista, por exemplo, escreveu o primeiro álbum da banda com apenas 16 anos. O som deles passeava por diversos gêneros musicais, como rock alternativo, pop punk e rock pop, com letras sobre amor, amizade e sentimentos diversos. A banda passou por várias crises, saídas e retornos de integrantes, com a Hayley sempre encabeçando.

Integrantes do Paramore ao longo do tempo

Hayley e companhia despontaram mundialmente por volta de 2008 com o álbum Riot! As músicas “That’s What You Get” e “Misery Business” tocavam demais na antiga TV União. O auge da banda só ocorreu, porém, em 2013, com o autointitulado Paramore, que foi premiado com um Grammy Award na categoria Melhor Música Rock por “Ain’t It Fun”. Naquele momento, a banda utilizava elementos da música pop, já não era mais aquele grupo de adolescentes descolados, e mesmo assim não me chamou atenção. Para não dizer que nunca havia curtido nada deles até então, “Decode”, uma canção composta para o filme Crepúsculo, era a única música de Paramore que eu gostava bastante.

No entanto, durante a noite de um sábado de março de 2018, jogada na minha cama com o celular tocando músicas no modo aleatório, o aplicativo de streaming de música começou a reproduzir “Airplanes” do rapper e produtor musical B.o.B. Ela foi lançada em 2011, mas somente naquele momento eu percebi quem cantava aquele refrão: ela mesma, Hayley Williams From Paramore. Uma parceria no mínimo improvável, mas que aconteceu e deu muito certo. Depois disso, eu ouvi “Airplanes” repetidas vezes por uma semana, voltei a ouvir “Decode” e, de quebra, “The Only Exception”.

B.o.B. apresentando “Airplanes” ao vivo com Hayley Williams (Foto: Tim Mosenfelder/Getty Images)

Naquele mês, minhas atenções se concentraram nas músicas de Paramore, por isso o aplicativo sugeriu o álbum After Laughter (depois do riso, em tradução literal), lançado no ano anterior. Me lembrei quando um amigo meu me mostrou “Hard Times”, primeira faixa do disco. Não dei atenção, inclusive critiquei, pois me pareceu sem sentido e uma atitude desesperada da banda que não estava mais nos holofotes e que havia passado por crises internas, a ponto de apenas três integrantes da formação original terem restado.

Resolvi dar uma chance novamente e isso resultou em semanas inteiras ouvindo todas as músicas desse disco que, para mim, é genial. São canções animadas, dançantes e instrumentais incríveis. Demonstra uma banda madura com integrantes seguros de si e do que fazem. As faixas são realmente boas e instigantes. E a cereja desse bolo são as letras, pois todas são tristes, melodramáticas e para baixo. Hayley Williams, Taylor York e Zac Farro reproduzem músicas de ritmo alegre, mas que falam sobre depressão, tristeza, términos, incertezas da vida, hipocrisia, mentiras e auto-estima baixa. Os videoclipes são um show a parte.

After Laughter é o título do quinto álbum da banda Paramore (Foto: Reprodução)

Um bom exemplo é “Rose-Colored Boy”, um electropop que aborda pessoas que são otimistas e alegres o tempo todo. Hayley não é uma delas: “Apenas me deixe chorar um pouco mais/Não vou sorrir se eu não quiser/Ei, cara, nem todos nós podemos ser como você/Gostaria que fôssemos todos otimistas também/Meu garoto otimista”. No clipe respectivo, os integrantes da banda fazem parte de um programa de TV em que tudo é alegre e bonito, mas nos bastidores Hayley está perdida, sozinha, absorta na sua realidade, que não é nada feliz.

Outra música maravilhosa é “Told You So”, cujo videoclipe mostra Hayley, Taylor e Zac em um carro e usando trajes vermelhos — os clipes das principais músicas do disco sempre esbanjam cores vivas e muito chamativas. Durante a viagem, eles olham para trás, em volta, pelo retrovisor e repetem: “E eles dizem/Eu odeio dizer que te avisei/Eles amam dizer que me avisaram”. Quando cometemos nossos erros depois de rejeitarmos conselhos contrários, a tendência é nos acusarem depois. “Eu sei que você gosta/Quando eu admito que estava errada e você estava certo/Pelo menos eu tento/Manter a calma quando sou jogada no fogo”. Talvez quando alguém que nós amamos lhe pede um conselho e em seguida faz o contrário, ocasionando um erro, o melhor a se fazer é acolher e ficar ao lado ao invés de apontar e dizer “eu avisei”.

O período em que Paramore ficou longe dos palcos, durante 2015 e 2017, foi necessário para seus integrantes, que consideraram a possibilidade de encerrar as atividades da banda e seguirem caminhos diferentes. Inclusive, Hayley foi diagnosticada com depressão logo após o término turbulento de seu casamento com o guitarrista Chad Gilbert, da banda New Found Glory. “Fake Happy” é uma canção que expressa os momentos em que ela precisou fingir que estava bem para as pessoas ao seu redor. Para mim, é como se ela não visse felicidade em ninguém e enxergava tudo como mero fingimento assim como era com ela: “Oh, por favor, não me pergunte como eu estou/Não me faça fingir/Oh, não, qual é a necessidade?/Oh, por favor, eu aposto que todo mundo aqui é feliz de mentira também”.

A meu ver, After Laughter funciona como uma reviravolta na carreira de Paramore. Pessoalmente, ressuscitou a banda, pois a partir desse álbum conheci o trabalho do grupo de perto e passei a ouvir todos os lançamentos anteriores, os quais eu simplesmente ignorei na adolescência. Além disso, ele marcou o meu 2018, que foi da mesma forma agridoce: passei a coordenar um movimento social popular; viajei para Salvador para participar do Fórum Social Mundial; uma grande lutadora social e vereadora do Rio de Janeiro, Marielle Franco, foi brutalmente assassinada; me apaixonei novamente; o Movimento Feminista de Fortaleza lutou e conseguiu abrir a Casa da Mulher Brasileira; e, no fim, um fascista ultraliberal foi eleito Presidente da República. É como se o disco realmente marcasse um ano que, no começo, foi alegre e animador, como as batidas das músicas, e terminou com muita tristeza, medo e incertezas, como as letras.

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Juliana Ojuara
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