manisfeto sacy

Lívia Aguiar
eusouatoa

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grito giratório contínuo que aparece quando um ouvido se conecta.

o pé é um, basta. pé-raiz, radical aérea. sola ancestral que transforma vestígios em alimento, antropofágico. perguntas? caminhos.

contra estradas repisadas, soluções prontas, asfalto sufocante, sacy!

contra obviedades retas, conexões catalogadas, trajetórias previstas, sacy!

contra espaços apertados, respostas decoradas, silenciamento de ideias, sacy!

contra controle! contra respostas! sacy é contra respostas especialmente contra as respostas com ponto final. sacy pergunta, asterisco de onde partem possíveis.

sacy inventa, in venta, venta dentro e fora, redemunho. processo. arteciência

força para parir, sacy!

tudo é processo até que chega o fim e o fim, o fim só aparece no final e o final não é agora, o final é amanhã, quando? não sei, amanhã! volte amanhã e amanhã será hoje e o final, amanhã.

liberta, sísifo, larga essa pedra pra lá, esse mármore mardição, deixa no chão e sobe a montanha leve, salta, transforma os dias em vida, vem pra floresta, rola a serra do mar do sul a norte, do monte roraima vê o equador e a ursa maior, vê tudo e desce mantiqueira, mergulha no vale do paty, sacy!

acorda urupês morto nas árvores, no chão concreto, nascido no oco do bambu, no oco da terra tomado de larvas, reencarna, vem brincar! transforma, transmuta, transcende, continua, pergunta, rodopia, deriva a perspectiva

come folha bicho-preguiça, tece aranha, sibila cobra, enrola tatu, sai rolando e salta, mico, até o alto, lá no mundo! volta sacy curumim língua chão do que é seu.

no gorro os segredos, os pensamentos espaços tempos desembolam cenhos. caixinhas contenedoras herdadas de aristóteles não cabem em terra de sacy.

sacy quer os por quês, esse espaço entre por e quê que diferencia o certo pelo in-certo, pela dúvida que abre a cabeça, aquece, ferve, borbulha, evapora fumaça arcoíris que sai do cachimbo de pau-brasil, vermelho como a terra de carajás, como o sol do sertão, como o sangue que corre dentro e escorre livremente das mulheres que fecundam fertilizam o solo quando criança não vem, como a pele queimada, tons de vermelho dos filhos brincantes ao sol.

fogo que arde e espalha pelo cerrado seco e do queimado as flores de raízes profundas brotam coloridas, brotam cantando no mesmo tom que iara, pachamama minha sua das águas que fluem da terra e viajam polindo pedras, abrindo sulcos, preenchendo ocos, limpando corpos, alimentando vidas dentro fora entre.

sacy sou eu, sou você, sou nós, nós nas crinas dos cavalos que galopam juntos e separados, desferrados selvagens, mulas das cabeças de fogo, cascos virados, caiporas caipiras mascando o mato que expande explode à noite na lua cheia os sussurros dos redemoinhos que passam sobre rios, rio alto, gargalho, assovios desencarnados ecoam perto longe atravessam sacy!

saber sa-cy pelo incômodo de não caber, de bordear, de transbordar, mudar, transmutar sacy!

Foto tirada por Miguel Aun na Livraria da Rua, Belo Horizonte, 27/10/2018

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Lívia Aguiar
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