Como estamos formando profissionais de pesquisa de experiência?

Um resumo do que foi conversado na segunda palestra da Observe 2022

UX em Casa
Experiência Observe
11 min readDec 13, 2022

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Nesse artigo, vamos falar sobre os principais pontos discutidos durante a segunda palestra do 1º dia da Observe 2022. Uma discussão conduzida por Elenay Oliveira, e palestrantes, Denise Pilar, Priscilla Albuquerque e Sabrina Bispo. A produção e curadoria desse resumo foi realizada por Lucas Lopes, do UX em Casa.

Fotos em preto e roxo das pessoas participantes do painel. Elenay Oliveira, Denise Pilar, Priscilla Albuquerque e Sabrina Bispo, respectivamente.

Afinal, o que é necessário para atuar no mundo da experiência como uma pessoa pesquisadora?

Denise Pilar:

  • Comenta que começar na área de pesquisa de experiência não tem um único caminho, existem vários, e podemos construir o nosso próprio;
  • Acredita que, mais do que uma formação específica, é importante adquirir e desenvolver uma série de competências, e que elas podem ser construídas de diferentes formas, vindas de diferentes caminhos e entre elas, não somente a formação acadêmica, mas também as vivências que vamos tendo ao longo do caminho;
  • É muito importante ter conhecimento de produto! E às vezes adquirimos isso na vivência. Compartilhou que sua experiência com produto foi adquirida no mundo corporativo. Portanto, não existe uma fórmula, mas vários caminhos, e isso é muito bom porque torna tudo muito possível!

Priscilla Albuquerque:

  • Para Priscilla, precisamos ser pessoas curiosas. Ela acredita que ter essa sensibilidade de ir atrás, de conhecer pessoas e contextos diferentes, abre muito seu repertório. Não é só estudar a teoria, mas para o que é necessário para ser uma pesquisadora, desenvolver esse radar, tem muito a ver com essa sensibilidade, com esse tato e com o pensamento lógico;
  • Você tem que conseguir captar para extrair, mas depois, pra usar essa informação vai muito do repertório, de ter essa abertura para ver muitas coisas diferentes, de áreas diferentes, para conseguir fazer mix de informações!

Sabrina Bispo:

  • Complementando, Sabrina diz que é um pensamento lógico em conjunto um pensamento crítico. Acredita que é uma habilidade que você vai naturalmente construindo, e que são essenciais para a pessoa pesquisadora.

O que vocês querem dizer com repertório? Como construir um?

Priscilla Albuquerque:

  • Acredita que é necessário se colocar em situações diferentes. Vindo de consultoria, é algo que fazem o tempo inteiro, porque cada projeto é um mundo diferente, e que essas vivências múltiplas inevitavelmente te fazem cruzar as coisas;
  • Comentou também de estourar a bolha do design. Às vezes fazer um curso de outro núcleo, por exemplo, buscar conhecer mais da área de negócios, participar de algum evento que vai falar sobre marketing, etc, coisas que você consiga cruzar de áreas diferentes. Acredita que isso acaba ajudando bastante na construção do repertório

Denise Pilar:

  • Temos que ser muito flexíveis no trabalho de pessoas pesquisadoras! E pra gente poder flexibilizar em função dos recursos disponíveis, a gente tem que ter um repertório, ter vivido coisas diferentes, tem que conhecer métodos diferentes em profundidade para saber o que é negociável, o que não é negociável, o que dá pra flexibilizar, o que a gente tem que segurar. Então precisamos ir construindo, expandindo esse conhecimento de todas as formas possíveis. Quanto mais conhecermos, mais condições temos de tomar decisões, de flexibilizar!

Vida real versus as teorias. Na experiência de vocês, que exemplos vem na cabeça dessa parte da importância da base teórica para essa adaptação da vida real?

Sabrina Bispo:

  • Defende o embasamento teórico como esse caminho de repertório, de fazer essas conexões das coisas e de encontrar uma solidez num lugar que você consegue também trabalhar a flexibilidade.

Priscilla Albuquerque:

  • Em seu contexto, já havia feito muitos cursos e lido muitas coisas, mas queria mais. Se perguntou onde poderia encontrar uma coisa diferente do que tinha visto em eventos, quando foi atrás da academia pra fazer essa coisa mais profunda, mais lenta, mais demorada, e muito com essa expectativa de pegar um tema e mergulhar nele de um jeito que o mercado não permite, porque não dá tempo;
  • E como é que balanceia? Como é que adapta? Sentia muito isso, porque na empresa em que estava, vida real, trabalho, correria, entrega rápida, roteiro e na academia com uns prazos super maiores, mais lentos. Sente-se muito essa diferença e, inevitavelmente, traz um pouco da adaptação de um para o outro, nesse contraste entre o rápido e o devagar.

Denise Pilar:

  • Acredita que essa talvez seja a chave da área de pesquisa de experiência ter crescido tanto e tão rápido no Brasil, porque pelo que se lembra, há anos atrás, o problema era essa resistência muito grande nas empresas que via isso tudo como um processo muito lento, como se fosse uma academia, e no mundo corporativo, nas startups, isso não funciona;
  • Portanto, se adaptar é necessário e imprescindível para viabilizar. E é só tendo uma base teórica mais sólida em conjunto com a vivência, que é possível avaliar devidamente, como viabilizar, o que adaptar e como.

Que caminhos que antropólogos e outras pessoas com muita experiência de pesquisa acadêmica podem trilhar para poder migrar para UX?

Priscilla Albuquerque:

  • No Mercado de design, a gente precisa usar a pesquisa como objeto de solução para alguma coisa. Um membro da academia muitas vezes está querendo descobrir porque é um processo de descoberta, porque é um achado e um novo conhecimento. Já no mercado, a gente precisa sempre acionar, transformar esse achado em solução. O design faz muito isso. Qual é o problema, qual é a solução? Então, quando a gente traz da academia pra cá, precisamos sempre ter pensando pra onde que isso vai? Como é que vai ser usado? Como é que eu vou transformar isso em retorno pra quem tá pagando por essa pesquisa?

Denise Pilar:

  • A pesquisa na academia o foco é total no problema e entendê-lo. O que a gente vai fazer com isso não importa muito. Já no mundo corporativo, no mercado, a gente precisa fazer alguma coisa, pois a pesquisa é aplicada com objetivo de resolver algum problema;
  • Acredita que é uma lacuna do mercado, dos profissionais da pesquisa, de experiência, conseguir traduzir o que se encontrou na pesquisa, em recomendações, pra que isso seja transformado em solução. Só apresentar os achados da pesquisa, pra quem não é de pesquisa, não é suficiente. As pessoas de produto e de tecnologia precisam que a gente seja capaz de fazer algum tipo de recomendação que nos ajude a chegar no produto final, numa solução final. E isso é bem desafiador!

Existe a necessidade de uma formação tradicional para ser uma pessoa pesquisadora? Que formação seria essa? E que habilidades interpessoais precisamos?

Denise Pilar:

  • Destacou duas habilidades interpessoais: A primeira é a capacidade de escutar. Escutar de verdade, com atenção. Escutar para entender e não para responder, pois a gente tende a escutar já formulando o que a gente vai dizer de resposta. A famosa escuta ativa. Essa é uma habilidade indispensável numa pessoa pesquisadora;
  • A outra habilidade é o gerenciamento de conflito. Como é que a gente lida com o conflito? Porque na atuação como pessoas pesquisadoras, há muitas oportunidades de exercitar essa habilidade, pois a gente vai lidar com pontos de vista diferentes e interesses diferentes, e teremos de atuar em um papel meio de conciliador, mediador. Isso é muito importante até para a gente conseguir fazer o nosso trabalho, e se a gente não usar no trabalho, pelo menos a gente vira uma pessoa um pouco melhor!

Priscilla Albuquerque:

  • Presença e clareza. Presença na ideia de que às vezes você está aqui, mas está anotando o que eu estou fazendo, pensando em mil coisas diferente, não está totalmente presente e isso atrapalha! No contexto da pesquisa, por exemplo, se a pessoa pesquisadora estiver totalmente conectada na pessoa em sua frente, ela consegue pegar o gatilho e fazer uma pergunta linkada com outra;
  • E a clareza, porque tu tem que ter sempre em mente qual é o objetivo da pesquisa que você está procurando aqui, porque é fácil se perder também nesta conversa.

Sabrina Bispo:

  • A construção de rigor. Acredita que talvez não tenha uma formação específica, mas o que a formação tradicional colabora é esse rigor; seja ele da maneira mais adaptada, que a gente vai trazendo para o corporativo, o rigor ele vai sendo construído nessa formação tradicional, e é indispensável!

Priscilla Albuquerque:

  • Complementando, a academia, independente de sua área de formação, te dá muita estrutura de pensamento. Você consegue pensar de uma forma mais organizada!

Denise Pilar:

  • Também acredita que é bem importante, porque se aprende a fazer pesquisa, a seguir uma metodologia científica, seja lá qual for a tua área de formação, mas a universidade nos dá isso. Como é que eu começo? Qual a primeira coisa que eu tenho que pensar? Onde é que eu busco informações? Como é que eu defino quem vai participar da minha pesquisa? Quais são os métodos que eu vou usar? Por que eu escolho determinado método em detrimento de outro? Como é que eu vou tratar os meus dados? Tudo isso é importante saber e isso a gente ganha na academia.

Para os iniciantes, o que recomendam estudarem e praticarem? E como adquirir essas habilidades?

Priscilla Albuquerque:

  • Não tem jeito, é necessário prática e tempo para poder pegar algumas habilidades;
  • Às vezes aparece pessoas que estão começando comentam que não conseguem vagas por não ter experiência, e recomenda o que ela mesma fez no começo da carreira, que é fazer projeto por conta, um projeto fictício que você vai lá, faz, investiga, monta, e isso já vai ajudar a demonstrar uma série de habilidades!

Sabrina Bispo:

  • Recomendou resgatar aprendizados de vivências anteriores e ler livros de formação inicial, clássicos de abordagens metodológicas!

Denise Pilar:

  • Comentou que é ótimo esse resgate de aprendizados de vivências anteriores, e que ao fazer suas mentorias, sempre começa identificando quais são as habilidades que a pessoa já tem, coisas que a pessoa já sabe fazer e que podem ser usadas no mundo de pesquisa, pois a partir do momento em que se identifica essas habilidades, a pessoa pode identificar também as outras habilidades que precisa desenvolver, e esse é sempre um bom caminho para começar: o autoconhecimento!

Fazer cursos? Procurar um mentor? Qual é a melhor maneira de evoluir para ser uma pessoa pesquisadora?

Denise Pilar:

  • Vê a mentoria com um tipo de personal trainer de desenvolvimento de carreira e é uma forma bem focada e individualizada de desenvolver aquilo que você precisa. É claro que depende, mas o mentor pode te ajudar nesse caminho de identificar o que você precisa desenvolver e também desenvolver essas habilidades ou esses conhecimentos. É muito importante você se conhecer e conectar com uma pessoa que tenha condições de te ajudar nas tuas lacunas!

Priscilla Albuquerque:

  • Acredita que o mentor traz alguns atalhos também, que de alguma forma te dá o caminho das pedras, e consegue ser preciso na tua orientação, sendo esse o ganho da mentoria;
  • Em contrapartida, às vezes a pessoa não está numa maturidade adequada e ela não consegue aplicar aquilo.

Sabrina Bispo:

  • Vê no mentor, na mentoria, a oportunidade de diagnosticar os problemas. Traz os apontamentos que você precisa ou que você está trazendo como sua necessidade e montando esse mosaico com você.

Onde buscar conteúdos para evoluir? Como se manter atualizado?

Sabrina Bispo:

  • Comentou que acompanha diversas comunidades, então essa curadoria viva que acontece nas comunidades, de juntar o que está acontecendo nas empresas, tanto de tecnologia, de produtos e de vivências, e a tradução disso com o que acontece da aplicação da pesquisa, já trazendo esse acompanhamento de quem aplicou aquilo, tem sido sua principal fonte, além dos livros.

Denise Pilar:

  • Gosta da ideia de fazer cursos diferentes. Comentou que já fez um curso rápido de psicologia investigativa, e descobriu vários pontos em comum com a pesquisa de experiência;
  • Gosta também de observar pessoas, e comentou que também dá para aprendermos assistindo séries e filmes. Recomendou Lie to Me, e diz que tem tudo haver com o trabalho de pessoa pesquisadora;
  • Acredita que o fundamental é estar de olho no que aparecer. Aparecem coisas bem legais por aí.

Priscilla Albuquerque:

  • Comentou que onde trabalha, há um ritual em que uma vez por semana o time se reune e abordam um tópico, e vão co-criando juntos o conhecimento. Acredita que é uma forma boa de reciclar conhecimento e tentar trazer coisas diferentes;
  • Também é fã de comunidades, pois foi um dos espaços onde mais teve insights e essa troca entre as pessoas é essencial!

Denise Pilar:

  • Comentou que precisamos também ter um pouquinho de humildade, porque sempre tem algo que podemos aprender com as outras pessoas. E às vezes a gente está tão imerso na nossa área, no nosso dia a dia, que acredita que aquele é o jeito certo e às vezes tu vai ver outras pessoas fazendo uma coisa de um outro jeito, e isso é fantástico;
  • Temos que estar aberto para isso e ter pensamento crítico, e saber usá-lo para o que a gente está fazendo e também para o nosso próprio conhecimento, que é uma coisa viva e estamos sempre construindo!

"Tenho dificuldade na escrita, fica parecendo muito artigo acadêmico ou jornalístico". O que fazer em termos de escrita que pode ajudar?

Sabrina Bispo:

  • Comentou que também é o mais desafiador até hoje para ela. Disse que você quer cair um pouquinho neste lado de transpor termos, mas que é necessário ir tentando traduzir conceitos muito acadêmicos e juntar algumas iniciativas de abordagens que outras pessoas foram desbravando, para fazer esse novo alinhamento da narrativa. É importante porque é isso que vai construindo essa comunicação com as pessoas que estão lendo você e que, de certo modo, não estão na academia.

Priscilla Albuquerque:

  • Gosta de usar o termo de tornar fácil digestão! Até fugindo da escrita, como é que se deixa mais visual para alguém bater o olho e conseguir escanear? Então, não adianta escrever pra caramba para a pesquisa ir para a gaveta. É preciso se utilizar de outros recursos, tentar colocar vídeos, depoimentos, fazer jornadas, fazer coisas visuais que as pessoas consigam circular mais facilmente;
  • Infelizmente, por mais que a gente fale na escrita, as pessoas não querem ler. Em sua experiência, as pessoas querem passar, entender, digerir, e tocar adiante.

Denise Pilar:

  • Deu a dica de sintetizar a pesquisa e direcionar para outra página se a pessoa quiser ler mais detalhes.

Como a gente sabe que a pesquisa foi bem aplicada?

Priscilla Albuquerque:

  • Acredita que o feedback de quem contratou a pesquisa acaba sendo um ótimo indicativo.

Denise Pilar:

  • Você definiu claramente o que é que tu quer, qual a pergunta que tu queria responder? E se os dados te trouxerem uma resposta, mesmo que ela seja uma resposta ruim?
  • Contou um causo onde foi fazer uma pesquisa numa empresa e no fim das contas, a conclusão que chegou é que o processo acontecia num momento da jornada antes de chegar nos perfis que haviam indicado, e isso foi uma prova de que houve alguma falha metodológica, que o perfil não foi definido claramente e, portanto, não respondeu a questão que precisava. Isso também é uma resposta!

Sabrina Bispo:

  • Quanto de fato aquilo que você desenhou, quanto aquilo que foi planejado, foi satisfatório para o que foi desenhado?

E aí, curtiu?

A Experiência Observe e a comunidade UX em Casa se juntaram em uma iniciativa para tornar mais acessível o conteúdo da conferência brasileira de pesquisa de experiência. Iniciamos uma série de artigos que resumem cada apresentação da Observe 2022 onde você poderá rever os principais pontos discutidos durante as palestras, além de conferir uma curadoria de materiais para quem quiser se aprofundar um pouco mais nos assuntos. Confira os resumos de todas as apresentações da Observe 2022 aqui no nosso Medium.

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Comunidade e grupo de estudos para quem está começando agora na área, com intuito de democratizar o conhecimento em UX.