#01, A$AP Ferg “Still Striving”

Tales Marques
experimentales
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5 min readSep 1, 2017

A música trap domina os Estados Unidos, e até uma boa parte do mundo, e é difícil ver um fenômeno tão forte na cultura pop atual quanto a do som surgido em Atlanta. Artistas como Migos, Rae Sremmurd e Lil Uzi Vert, tiveram grande responsabilidade em transformar um som muito característico da cena de hip hop atlantense, em um produto musical popular e lucrativo. Uma das bancas de rap americanas mais envolvidas com essas mudanças na cultura hip hop, tem sido a A$AP Mob, que conta com artistas como A$AP Rocky e A$AP Twelvyy.

Essa aproximação ficou mais clara ainda, com o último lançamento em conjunto da banca, “Cozy Tapes Vol. 2: Too Cozy”, que pode ser resenhado em breve por aqui. Além desse disco, a mixtape lançada por Darold Fergunson Jr, cujo nome de palco A$AP Ferg referencia seu sobrenome de pai, também representa uma aproximação ainda maior com essa pegada no som. Não só pelas participações, que conta com os já citados Migos, A$AP Rocky, mas também com rappers presentes na cena desde antes do surgimento do trap, como Busta Rhymes, Snoop Dogg e Cam’Ron, e também grandes apostas da indústria como Lil Yachty e Dave East. Com exceção dos rappers já clássicos, todos envolvidos com a cena do Trap, que cresce cada dia mais lá fora e aqui dentro.

Capa da mixtape, “Still Striving”, 2017.

Ferg é um tipo de artista que aparece cada vez mais na cena do hip-hop, ele é multiartistíco, não é só capaz de rimar ou produzir, é o tipo de cara que consegue trabalhar com áreas ainda mais distantes da música. Ele começou sua relação com a cultura hip-hop com uma marca de roupas, a Devoni Clothing, vendendo já na época, a 10 anos atrás, para artistas de renome internacional, como Chris Brown e Swizz Beatz. Além de sua proximidade com a moda, Darold, também já realizou trabalhos como produtor audivisual, como no clipe, nunca lançado, de “Thought it was Drought” do Future em que foi responsável pela direção.

Tem se tornado cada vez mais comum encontrar artistas do tipo na cena hip-hop, o exemplo mais clássico é Kanye West, que passou de produtor, a rapper e hoje é tudo isso, e ainda produz sua própria linha de roupa. No Brasil temos alguns exemplos, Emicida além de fazer música e gerenciar a carreira de outros artistas, também produz moda, com a Laboratório Fantasma, e Beni, além de ter gravado um dos melhores discos dessa década no Brasil, também produz e dirige diversos clipes para outros músicos da cena.

No entanto, mais importante do que ser um artista capaz de produzir em diversas áreas, ele demonstra em “Still Striving” que é capaz de desenvolver uma atmosfera e um conceito dentro do que produz como músico. A$AP Ferg disse em entrevista ao Complex, que “trapping means hustling”.

Ralph Colson, eu te amo.

Para entender melhor o significado real de hustling, fui buscar a imagem que está aqui ao lado, em um dos mais importantes e interessantes sites para entender o hip-hop e a cultura de rua americana, o fantástico Urban Dictionary.

Tudo nos leva a crer, portanto, que hustling aqui seria algo que poderíamos relacionar com o “sair por cima” e até com um pouco do que chamamos de “malandragem”. Essa atmosfera está sempre muito presente no álbum de Darold, Ferg rima muito sobre ser o melhor, sobre ser o “dono” da cena. Essas características são muito comuns no Trap, principalmente no mainstream, mas ele demonstra que pra isso ele precisa suar, precisa passar por todos os obstáculos, ele precisa sair por cima, he needs to hustle. No trecho abaixo, retirado da ótima música de abertura, “Trap And A Dream”, especifica o que esse “dar o seu todo” pode significar.

One trap with a big dream
I go hard, won’t ever settle
“Go in for the kill” what they taught me
Boy I’m movin’ that Shark Tank
In this bitch like I’m Clark Kent
Got a deal with the devil like y’all say
It’s for the love of the money, what y’all think?

O trapper deixa bem claro que vai dar seu todo, ele vai entrar pra morrer ou pra matar. Se compara ao alter-ego do Super-Homem e em seguida diz que tem um pacto com o diabo, deixando para o fim o questionamento, ele está ali pelo amor ou pelo dinheiro? Acho que quem quer que conheça o mínimo a cena do trap ou que escute esse álbum uma única vez, será capaz de responder, o que ele quer são notas.

East Coast Remix, A$AP Ferg ft. Bustha Rhymes, Dave East, A$AP Rocky, Rick Ross, French Montana & Snoop Dogg.

No entanto, o grande destaque do disco vai para o single de lançamento, “East Coast Remix”. Ferg produz um “trap egotrip, mano”, em cima de um beat do DJ Khalil, o artista traz diversos artistas de extrema importância para o cenário do hip hop na costa leste, como Busta Rhymes, A$AP Rocky e French Montana. No entanto, é até admirável a participação de outros dois rappers nessa música, Snoop Dogg representa o Oeste, e se distancia ainda mais da guerra Leste x Oeste da qual já fez parte, e Rick Ross representa o sul. A$AP Ferg demonstra então que é capaz fazer uma música que mostre como o seu lado é melhor, sem necessariamente iniciar uma guerra com isso, trazendo até seus “inimigos” para o seu lado. Uma atitude admirável de todos os artistas envolvidos na produção dessa ótima música.

Além de tudo isso, a atmosfera desse disco é uma das mais interessante dentre os álbuns que tenho escutado no gênero. Eu consigo me imaginar nas ruasdo Harlem, bairro natal de Darold, “hustling around” com Ferg e toda a Mob batendo cabeça com esses belíssimos beats, um dos destaques da produção. É o tipo de som capaz de te transportar para um outro lugar, com culturas e vivências diferentes, e ainda te manter confortável com esses sentimentos, de tão naturais que soam.

AVALIAÇÃO: ótimo!

ps: Tô testando esses métodos de avaliação ainda, pode ser que eles sejam transformados em numerações, ou que se mantenham com adjetivos como esse. Veremos.

STILL STRIVING, 2017.

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Tales Marques
experimentales

Música, cinema, quadrinhos e café. RP, produtor artístico e propagador de ideias.