#05, Baco Exu do Blues, “Esú”

Tales Marques
experimentales
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4 min readSep 6, 2017

Há cerca de um ano atrás, o rap nacional encontrava-se em um período onde era dominado por alguns grupos de regiões bem específicas, principalmente no Sudeste brasileiro. De um lado o Damassaclan dominava as produções no estado de São Paulo, e no Rio, o TTK dominava com o surgimento da Pirâmide Perdida e o fortalecimento da Tudubom Records.

Foi mirando nesse público formado por esses expoentes da cena na época, que Baco Exu do Blues e Diomedes Chinaski produziram o que pode ser considerado a “diss” mais importante da história do rap BR. “Sulícidio” não só serviu como uma música que depreciava os rappers do sudeste, não foi só um grande sucesso de público (atingindo até hoje mais de 6 milhões de views), foi principalmente um divisor de águas para a cena do rap nacional.

Baco Exu do Blues ft. Diomedes Chinaski — “Sulícidio” (2016)

O alvoroço causado por essa música foi tamanho, que foi capaz de virar olhares que a muito não estavam voltados para o que vinha sendo produzido na música da cultura hip hop. A mídia especializada passou a dar mais atenção a cena, os fãs de rap passaram a desenvolver interações cada vez maiores nas redes sociais e isso levou a um fortalecimento das produtoras, artistas, grupos e marcas relacionadas com a cultura.

Além de todo alvoroço causado por Sulícidio, por seu caráter polêmico, Baco surfou na onda de seu hype lançando alguns singles de grande sucesso como “999” e “Tropicália”, além de participar em cyphers que também se tornaram hits, como “Expurgo” e “Poetas no Topo 2”. O rapper baiano soube, a partir do seu primeiro hit, criar uma base de fãs que gera polêmica da mesma maneira que ele, tratando-o como o grande rapper da atualidade do rap nacional.

Esse então é o cenário do lançamento de “Esú”, praticamente um ano depois que todas essas mudanças começaram a acontecer na cena, Baco tratado às vezes como um Deus e às vezes como um ser medíocre, explora as nuances desse seu relacionamento com o público no seu novo álbum. O que dá um tom às vezes sombrio e às vezes narscisista ao que o artista canta, tendo sempre esse estilo bem representado pelas produção, tanto nos samples quanto na parte técnica.

Baco Exu do Blues, “Esú”, (2017)

A produção, aliás, é o ponto forte do disco, muito bem trabalhada tanto na parte instrumental feita por Nansy Silvs, com uma participação de Scooby com KL Jay nos scratchs na primeira faixa, e na parte técnica com a mixagem e masterização, feita por TAS do Cremenow Studio. No entanto, em relação a parte conceitual, de responsabilidade do artista, o que se destaca com certeza é a parte instrumental.

O talentosíssimo Nansy, que já havia se destacado com produções de grandes nomes do trap como Raffa Moreira, Blackout e até de uma música da Pinneaple, rouba a cena no álbum. Trabalhando muito bem os samples, que vão de Novos Baianos até Chico Science, passando por músicas trilha de Quentin Tarantino.

Já a mixagem e masterização é muito bem trabalhada, mas não é algo que pode ser destacado tanto quanto o instrumental. Com destaque para a faixa “En Tu Mira”, em que a produção de TAS dá o tom de sofrimento necessário para o vocal da música.

Outro ponto bastante destacável são às ideias conceituais trabalhadas entre o fotógrafo e os designers responsáveis pela produção das fotos que representam cada música no YouTube, elas ajudam bastante na imersão com a lírica sempre relacionada com a imagem que a simboliza. “Capitães de Areia” é o exemplo mais interessante, com diversos adolescentes negros, que espelham tanto os personagens da obra homônima de Jorge Amado quanto Baco e sua tribo nas histórias vividas na sua tenra juventude.

No entanto, cabe também pontuar que Baco poderia ter sido mais inventivo nesse álbum. Durante a primeira metade do álbum, o rapper parece manter-se em ideias de flow que se relacionam mais com as obras que havia lançado desde Sulicídio, do que com o que o álbum apresenta em sua segunda parte.

Para mim, tanto em relação a parte lírica, quanto em relação a flow e entrega, o álbum apresenta uma crescente muito grande. Começando no seu interlúdio, mas ganhando força essencialmente em “Te Amo Disgraça”, a faixa destaque do álbum em relação a maneira como Baco trabalha o seu vocal.

Fonte: Vice

Se a obra conversasse mais, em relação a como o artista transmite sua voz, com a parte final, talvez pudesse ser considerado o álbum do ano, como o próprio artista pontuou em entrevista à Vice. Mas devido a esse problema, mesmo com o instrumental mais bem produzido de 2017, o álbum fica atras ainda de obras como RPA, Vol.3, Galanga Livre ou Regina, que ouvi recentemente e é fantástico.

Ainda cabe-se pontuar, há de se esperar para se colocar tão definitivamente em relação a essa questão, afinal ainda temos lançamentos de artistas como Froid, Choice, Coruja BC1, BK, Ogi, Primeiramente e ADL anunciaram discos para os últimos meses de 017. Enquanto isso, Baco segue em sua eterna reflexão entre a prepotência e toda a pressão, de ser tratado como um deus por seus fãs.

AVALIAÇÃO: bom!

Mas eu esperava mais depois do lançamento do interlúdio.

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Tales Marques
experimentales

Música, cinema, quadrinhos e café. RP, produtor artístico e propagador de ideias.