#08, Sain, “Dose de Adrenalina”

Tales Marques
experimentales
Published in
4 min readSep 9, 2017

O Catete provavelmente representa um dos fenômenos mais importantes da cultura hip hop no Brasil atual. Ocupado por skatistas, pixadores e grafiteiros, além de fãs de rap e dos próprios envolvidos com a produção do estilo, o lugar representa a cultura de rua do Rio de Janeiro de maneira muito concreta, como poucos lugares conseguem.

A Vice produziu uma reportagem muito interessante sobre esse bairro e a influência dele no que vem surgindo no rap carioca nos últimos anos. Essa postagem da revista já vai completar dois anos agora em novembro, mas continua muito atual, já que os selos e artistas vindos do KTT ou TTK, como no dialeto criado pelos frequentadores do local, tem dominado cada vez mais a cena da música hip hop.

Em novembro de 2015, a Tudubom Records, surgida por lá, começava a capitalizar de verdade em cima da música de Filipe Ret e começava a lançar outros artistas como Daniel Shadow. Hoje ela investe em novos artistas como Kayuá e Thiago Anezzi, e já não depende tanto de Ret para causar furor na cena do rap nacional.

Músicos do selo “Pirâmide Perdida” Fonte: Genius

Na mesma época, a Pirâmide Perdida vinha tomando forma, o selo que talvez possa ser considerado o mais influente no rap nacional atualmente. Tendo lançado em 2016 o disco considerado por muitos o melhor do ano, “Castelos e Ruínas” do BK, além da mixtape “Pirâmide Perdida vol.7” contando com todos os nomes do selo (Nectar Gang, Sain, Luccas Carlos, Akira Presidente e El Lif Beatz) e que foi muito bem recebido por público e crítica.

Esse disco de Sain é o terceiro lançamento da Pirâmide no ano, já tendo “Fa7Her” de Akira Presidente e “Um” de Luccas Carlos, esse último distribuído pela Warner Music em um acordo inovador para o rap nacional. E a terceira posição não é apenas pela data de lançamento, mas também na qualidade do trabalho apresentado.

Akira apresentou em seu disco uma maturidade das melhores, suas ideias de rima e flow se sobressaem sobre o que já tinha lançado em sua carreira. Já Luccas Carlos demonstra que não sabe fazer só refrão, apesar de com toda certeza esse ser seu forte, e que é capaz de fazer hits mesclando características do R&B, do rap e do pop, como muitos artistas tentaram fazer mas falharam. Projota, estou olhando pra você!

Sain, “Dose de Adrenalina” (2017)

Já “Dose de Adrenalina” é um trabalho que demonstra que talvez as ideias de Sain ainda não estejam muito bem desenvolvidas para a produção de músicas solo. Ele às vezes se perde no meio de seu egotrip e suas love songs, sem ter uma concisão sobre os temas que trata em sua música. Além disso, em relação a parte técnica o rapper muitas vezes não consegue desenvolver um flow que se encaixe com o clima das músicas, principalmente no primeiro terço do álbum.

Os instrumentais e a produção demonstram quão avançada a Pirâmide está em relação ao restante do rap, se utilizando de elementos de diversos tipos de rap, do boombap ao g-funk, passando até por rapjazz. Aliás, o grande destaque do álbum pra mim é uma faixa onde Sain não rima, o interlúdio muito bem produzido e que tem um nome muito bem pensado, “Mais Jazz, Menos Papo”.

Talvez esse seja algo que caracterize bem o álbum, quando a faixa que mais me chamou atenção é uma onde o rapper não rima nem um verso sequer, fica claro pra mim que o conceito ficou um pouco perdido durante todo o álbum. Sain precisava ter definido melhor o que seria esse álbum na sua carreira, e o que ele significaria para os próximos passos que quer dar. Fico no aguardo pro que ele venha a produzir daqui pra frente, mas com um pézinho atrás depois desse álbum.

AVALIAÇÃO: 6/10

O destaque do álbum para o instrumental me incomoda um pouco, ainda mais sabendo o potencial que Sain tem para rimar e desenvolver a estrutura de suas músicas.

--

--

Tales Marques
experimentales

Música, cinema, quadrinhos e café. RP, produtor artístico e propagador de ideias.