A política de remoção de favelas no passado.

A relação dos governantes do Rio de Janeiro com as áreas mais pobres da cidade no século passado tem um histórico de comportamento oscilante: ora fizeram vista grossa ao crescimento e consolidação de áreas desassistidas, ora optaram pela destruição e remoção. Por motivos sanitários e urbanísticos, o prefeito Pereira Passos (1902–1906) colocou abaixo diversos cortiços e desalojou seus moradores na grande reforma que promoveu no Centro. Com isso, deu um empurrão no incipiente processo de favelização. Sem ter para onde ir, muitos desabrigados acabaram aumentando a população em favelas como as da Providência e do Morro de Santo Antônio. A reforma de Pereira Passos não foi uma ação isolada. Nos anos 20, o Morro do Castelo foi aterrado por motivos semelhantes e seus 4.200 moradores foram desalojados.

Outro processo de remoção ocorreu entre 1941–43, quando o prefeito Henrique Dodsworth elaborou um projeto de higienização das favelas, durante a abertura da Avenida Presidente Vargas. Mas houve uma preocupação em abrigar os moradores que ficaram sem casa. Foi a primeira tentativa organizada de uma política habitacional para comunidades mais pobres. Quatro favelas foram destruídas e 8 mil pessoas foram transferidas para três parques proletários, na Gávea, na Praia do Pinto (Lagoa) e no Caju. Pouco depois, em 1948, foi feito o primeiro censo oficial a levantar a população das favelas, que contabilizou 138.837 moradores em 105 comunidades (7% da população total do então Distrito Federal). A política de remoção continuou nesse período. Nos anos 50, no entanto, houve uma experiência um pouco diferente com a Cruzada São Sebastião, conjunto habitacional no Leblon criado pela Arquidiocese do Rio para abrigar moradores de favelas removidas da mesma área, na Praia do Pinto. A Arquidiocese também realizou melhorias de serviços básicos em 12 favelas. Mas foi uma iniciativa isolada e bastante criticada pelas autoridades. Nos anos 60, junto com o governo federal, o poder público na cidade do Rio de Janeiro, então Estado da Guanabara, colocou em prática uma operação gigantesca para remover todas as favelas da cidade e transferir seus moradores para conjuntos habitacionais na periferia. As favelas eram vistas como se fossem uma questão meramente habitacional e um problema de uso do solo. O objetivo não era integrá-las à cidade, mas remover as comunidades e despachar seus moradores para locais ermos, sem acesso a transporte eficiente nem a infraestrutura e serviços adequados, longe dos olhos do resto da sociedade. Se o governador Carlos Lacerda removeu 41.958 moradores (1962–1965) de 27 áreas, seu sucessor, Negrão de Lima removeu ainda mais: 70.595 pessoas (1966 a 1971). Isso representava, à época, cerca de 12% da população dessas comunidades em toda a cidade. Os moradores eram, na grande maioria, enviados para conjuntos habitacionais localizadas em regiões distantes do centro, nas Zonas Norte e Oeste ou na periferia, sem transporte eficiente. Os moradores do Morro do Pasmado, em Botafogo, por exemplo, foram enviados para a Vila Kennedy, às margens da Avenida Brasil, a 50 quilômetros de distância de onde estavam. A partir de 1971, a CHISAM (Coordenação de Habitação de Interesse Social da Área Metropolitana), órgão do então Ministério do Interior que passou a cuidar da questão na Guanabara, planejava remover 92 mil pessoas por ano e acabar com todas as favelas até 1976. Mas a política agressiva de remoções de favelas não chegou perto de atingir seu objetivo. Nem mesmo impediu o surgimento de novas comunidades. Entre 1970 e 1974, no período final do programa, o número de favelas no Rio passou de 162 para 283. E sua população aumentou 36,5%.

A postura do poder público mudou completamente nos últimos anos, com a inclusão e urbanização das comunidades já consolidadas. Se antes a política era de remoções, agora é de integração delas ao resto da cidade. E isso está previsto inclusive em lei. A Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, em seu artigo 429, VI, prevê que a política de desenvolvimento urbano respeitará os seguintes preceitos: “urbanização, regularização fundiária e titulação das áreas faveladas e de baixa renda, sem remoção dos moradores”. Com isso, o poder público se esforça para garantir melhorias urbanísticas e de serviços para quem vive em comunidades.

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