Cavalos a bordo

Experiências viajando com bebê em aviões

Munike Ávila
Exploradores
3 min readOct 22, 2022

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Sempre encarei aqueles saquinhos de papel para vômito com desconfiança. Parecem frágeis demais para exercer sua função. Perdi as contas de quantas vezes voei, e para minha sorte, nunca vi alguém precisar de um desses no avião. As vezes me questionava se era para isso mesmo que deixavam aqueles sacos fáceis de romper em frente às poltronas. Até que minha filha me ensinou: saquinhos de vômito foram feitos para serem rasgados em pedacinhos e colocados dentro de uma garrafinha pet de água, daquelas que custam mais que brinquedo no aeroporto.

A brincadeira estava tão divertida a ponto de a criança na poltrona da fileira ao lado renegar um brinquedo de verdade e ficar encarando o pobre pai que não sabia mais o que fazer. Pra ele, a tela resolveu. Para minha filha, não. A distração do papel na garrafa durou uns dez minutos. O voo durava quatro horas. Ela nem ensaiava dormir. Com seus experientes um ano e quatro meses, saiu corredor afora para catar outra garrafinha de plástico e dar um upgrade no jogo. As pessoas cediam suas garrafas com um sorriso. Davam seus saquinhos de papel sem pestanejar. Provavelmente também desconfiavam da sua utilidade. Melhor regalar a um bebê, ele certamente tirará mais proveito disso.

Acredito que o maior motivo de pais evitarem viagens de avião com crianças é o medo de ficarem mais de hora dentro de um espaço apertado sem estímulos para elas. Pois se tem uma coisa que venho aprendendo a cada voo com minha filha é que um avião tem recursos infinitos de imaginação e brincadeiras. Leia isso de quem já passou mais de dez horas dentro de um voo com um bebê de um ano.

Atar e desatar os cintos, abrir e fechar as cortinas entre os corredores, explorar o banheiro, tirar e colocar os manuais de segurança nos bolsos a frente da poltrona, “ler” os manuais, inventar histórias com as imagens — por exemplo, Valentina adora demonstrar interesse pelo escorregador inflável do avião enquanto eu digo “que legal esse escorregador!” mas o que estou pensando é “espero que nunca precisemos descer nesse troço minha filha”.

Ao contrário do que muito se propaga na internet, as pessoas que torcem o nariz ao ver um bebê a bordo não chegam nem perto do número de passageiros que abrem sorrisos e interagem com a criança, ajudando inclusive os pais a terem uma folga na logística de distração. Entre as frestas das poltronas de um avião é possível sumir e reaparecer “cade? achou!”, arrancando risadas de quem participa.

Bebês também fazem sucesso com as comissárias de bordo. Provavelmente pelo fato de serem os únicos a prestarem atenção nas instruções de segurança. Imagina, ver aquela pessoa vestir um colete, depois pegar uma máscara e se transformar num mergulhador, super herói ou um ser de outro planeta.

Em nossa última viagem, ao notar uma senhorinha usando chapéu dentro do avião, Valentina pediu para vestir o seu também. Olhou para o braço da poltrona em que estávamos sentadas e encontrou um cavalo. O botão para reclinar eram os olhos, o braço era o corpo, fez de um lenço de papel a crina. Decidiu montar no cavalinho. O alimentou com comida imaginária. Fez carinho. Sabe-se lá por onde galopou.

Fato é que quando me dei conta, já estávamos prestes a aterrisar. Com o avião em terra firme, enquanto as pessoas levantavam desesperadas para pegar as bagagens, como se isso fizesse o tempo passar mais rápido, minha filha voltou a cavalgar. Ao olharmos para trás, um homem usando um chapéu de cowboy a cumprimentou. Valentina não pensou duas vezes, foi logo cedendo espaço em seu cavalo, apontando para o cowboy e então para o cavalo, o convidando a galopar.

Ele achou graça. Eu concordei com minha filha. Afinal, por que diabos alguém vestiria um chapéu de cowboy dentro do avião se não para montar em um cavalo a bordo?

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