Estábulo de Elefantes

Escapando de Bangalore: Hampi

Émerson Hernandez
Exploradores
Published in
8 min readAug 11, 2017

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Quem abre um guia de viagens da Índia, certamente não abre na página de Bangalore. Ela é uma grande cidade, com várias opções “ocidentais” — o que torna a vida do dia-a-dia mais fácil — mas não tem atrativos turísticos que chamem atenção tanto quanto possuem as regiões de Delhi, Rajastão ou Himalaia. No entanto, se você estiver por Bangalore, quero te apresentar um grande lugar não tão conhecido ao olhos do mundo ocidental e que está a algumas horas de viagem de trem ou ônibus.

Patrimônio Mundial na lista da Unesco, Hampi é o tipo de lugar que tem gente que vai dizer que você pode ver tudo em um dia enquanto outros vão dizer que é na verdade um mês inteiro ou múltiplas visitas. Eu particularmente acho que mais tempo vai fazer você aproveitar melhor e essa primeira visita o que tive a disposição foi um final de semana. Para mim, o maior motivador para visitá-la foi seu grande conjunto arqueológico. Muitas das ruínas estão em muito bom estado, sendo possível ver grandes detalhes em templos, estátuas, pilares e outros monumentos do antigo Reino de Bisnaga (Vijayanagara). Para quem se interessa por história, é um lugar imperdível!

Alguns pontos específicos dessa viagem, quero compartilhar agora. Apenas para você entender um pouco como foi minha viagem, deixa eu explicar como foi o final de semana sem entrar em muitos detalhes. Saímos (eu e dois colegas de trabalho) de Bangalore pelas 22 horas de sexta e pelas 7 da manhã o trem chegou a Hospet. Dali, negociamos[1] nosso translado até Hampi, via rickshaw. Cerca de treze quilômetros depois, chegamos à nossa hospedaria, o Padma Guest House, onde encontramos um terceiro colega de equipe e sua esposa.

Nesse primeiro dia, contratamos um serviço do governo de van (com roteiro definido [2]) com guia para nos acompanhar. Infelizmente ele falava pouco inglês e eu não falo hindi. De todo modo, ele se esforçou bastante para tentar fazer com que eu entendesse tudo o que estava se passando ali. No domingo, ficamos com a agenda mais livre e acabamos usando bicicletas para nos locomover aos pontos de interesse que não foram visitados no sábado.

Carruagem de Pedra e Pilares Musicais

A Carruagem de Pedra é provavelmente o ponto turístico mais popular de Hampi. De panfletos sobre o local até a busca no images do Google, esse é provavelmente o monumento mais presente. Ele é, realmente impressionante. Cheio de detalhes esculpidos, a falsa carruagem dá a impressão para quem vê que é algo feito em uma única rocha. Na verdade, muitos dos segredos das emendas das diferentes rochas está justamente nesses detalhes. Algo que aprendi ali e acabei notando em outros lugares que visitei. No entanto, para mim, o templo que está na frente da carruagem é que é mais impressionante.

O Templo de Vittala (um dos avatares de Vishnu) é composto por vários pilares ricamente ornamentados. Os externos, além de esculpidos possuem aberturas que emitem sons quando se bate neles e por isso recebem o nome de "pilares musicais". Nosso guia nos mostrou o funcionamento (turistas não são autorizados a tocar) para complementar sua explicação sobre o uso do local por músicos e dançarinos nos anos de glória do império.

À esquerda, a carruagem de pedra. À direita o interior do Templo de Vittala
Um dos itens da nossa lista coletiva de coisas a fazer em Hampi era subir até o topo do morro Matanga e de lá assistir ao pôr do sol. Talvez depois da Carruagem de Pedra, é a atração mais popular em fóruns e guias de viagem. Ao final, sentado sobre a construção que existe lá em cima, a bela vista da região fez valer muito a pena ter subido os mais de 200 degraus depois de todo o dia de passeio.

Senhor, senhor, sabia que o seu ouvido está cheio de cera?

Você já se imaginou sentado no meio fio, na companhia de um total desconhecido com um pedaço de metal enfiado na sua orelha? Essa é uma cena possível de ser presenciada em várias cidades indianas e foi em Hampi que recebi essa oferta de serviço pela primeira vez.

Parado numa esquina, esperando por um dos meus colegas que entrou no bar para comprar uma água, fui abordado por um indiano que, portando uma pequena bolsa, me perguntou: “Senhor, senhor, sabia que o seu ouvido está cheio de cera?”. Pego de surpresa, minha resposta foi mais ou menos: "Oi?"… A partir daí ele me explicou um pouco sobre saúde auricular e seu ofício. Obviamente não via a minha cara, mas imagino que minha incredulidade o fez perguntar sobre minha origem. Ao responder ser do Brasil, rapidamente tirou um pequeno caderno de sua bolsa.

Folhou, folhou até que encontrou o que buscava, me mostrando uma página e pedindo para que eu a lesse. Cada página tinha uma caligrafia diferente e também a identificação de origem de quem escreveu. Nesse trecho em específico, era um comentário de um carioca que dizia mais ou menos assim: "Visitei Hampi e encontrei o simpático senhor Vinay que queria limpar minha orelha. Nem fu* que eu vou deixar ele enfiar essa p* de arame na minha orelha. Mas ele é bem gente boa e pediu para eu escrever, mesmo assim. Um abraço do Augusto."

Confesso que entreguei o caderno de volta segurando o riso. E educadamente, declinei do serviço.

Há mais de uma centena de pássaros distintos que podem ser observados em Hampi

Pedalando até o templo

Nos arredores de Hampi existe um templo em cima de um morro chamado Anjaneya. Ali, acredita-se ser o local de nascimento do deus Hanuman.

Para chegar até lá, alugamos bicicletas que foram entregues na nossa hospedaria. Como estávamos em uma margem e o templo fica na outra, tivemos de atravessar com elas. Primeiro aprendizado a ser compartilhado: se você resolver pedalar até lá, alugue a bicicleta do outro lado do rio. Na hora de embarcar, quem está a pé é priorizado e pode levar algum tempo (ou energia!) para convencer o barqueiro a te deixar subir e atravessar.

A estrada até o pé do templo é bem asfaltada no geral e sem muito movimento, então você não vai ter grande dificuldade para fazer o trajeto, mesmo que não tenhas pedalado há algum tempo. Ao chegar ao local, uma escadaria com mais ou menos um seiscentos degraus vai te levar ao topo. O seu preparo físico é que vai lhe dizer se a subida levará 10 ou 15 minutos. Ao chegar lá em cima, como todos os lugares sagrados da Índia, você vai ter de ficar descalço (não é a toa que eu tou na sombra de um monumento, para tirar a foto abaixo).

Por ser em cima de um morro, a vista do templo é ampla e muito bonita. Dali dá para ver alguns dos monumentos assim como as formações rochosas que tornam Hampi também popular entre escaladores. Além da vista, dois outros detalhes chamam atenção para quem visita esse templo. Os macacos que vivem livremente no local e que recebem muitas oferendas (principalmente em forma de banana) e a constante oração que acontece ali dentro. Ao contrário de alguns outros locais sagrados, nesse templo sempre vai haver algum sacerdote orando. Sim, isso acontece 24 horas por dia, nos 7 dias da semana.

Representação do deus Hanuman (topo à esquerda) e o templo em Anjaneya Hill, onde se acredita ser o local de nascimento do seu nascimento.

Finalizando…

A infraestrutura, no geral, merece algumas considerações para quem não está acostumado a fazer turismo em áreas mais rústicas.

  • A cobertura de celular é ruim. Não conte com isso para encontrar seus amigos. Também por isso, poucos lugares aceitam cartão de crédito ou débito. Ou seja: tenha dinheiro vivo.
  • O lugar é bastante turístico. Então existem várias opções de hospedagem, assim como uma vasta opção para alimentação. Não esqueça, apenas, que Hampi é um lugar sagrado, então ali não vai haver nem carne, nem álcool. Do outro lado do rio, esses itens são permitidos. Tendo a achar que é por isso que em Hampi tu vais encontrar mais turistas indianos e na outra margem, ocidentais. Principalmente hippies e israelenses.
  • Motos e carros também não são permitidos em Hampi. Alugue uma bicicleta e seja feliz.
  • Água quente e/ou chuveiro não vai ser, necessariamente, algo que você vai encontrar no seu banheiro. Esteja preparado para tomar banho como os locais, de balde e canequinha.
  • A vegetação local é rasteira e vários dos locais de visita são amplos. Esteja preparado para caminhar bastante nesse tipo de ambiente. Água, calçados confortáveis e roupas leves, assim como proteção para o sol são itens básicos para tua sobrevivência.
  • No sábado, depois do sol ter se posto, acabamos o dia comendo e bebendo no Mango Tree, com suas mesas baixas para se sentar em colchões no chão. Bons pratos (vegetarianos) disponíveis no que parece ser um dos restaurantes mais populares da região, principalmente entre estrangeiros.

Notas de rodapé:

  1. Sempre que possível, deixe que indianos negociem e não deixe que o outro lado veja que você faz parte daquele grupo. Ocidentais SEMPRE vão fazer com que os preços de produtos e serviços sofram ágio.
  2. O roteiro (mapa abaixo) foi: Royal Enclosure, Queen Palace, Queen Bath, pausa para almoço, Museu, Carruagem de Pedra e Palácio Musical.
Sim, todo mundo quer tirar foto com esse cara branco esquisito.

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