Foto de Keira Burton

Falando com Estranhos

Émerson Hernandez
Exploradores
Published in
5 min readOct 13, 2022

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O ano era 2013 e eu estava longe de casa milhares de quilômetros. Em uma mesa com colegas de empresa com quem eu não tinha muito contato, eu era mais ouvinte do que qualquer outra coisa. Estávamos lá pra um evento festivo e, além da gente, várias outras empresas e organizações tinham mandado representantes. E, por isso, um dos presentes falou para a colega:

— Eu acho que tu deveria falar mais com as pessoas, principalmente aquelas que tu não conhece. Esta é uma ótima oportunidade.

Fiquei pensando sobre aquilo no decorrer do dia. Na manhã seguinte, resolvi pegar o conselho (mesmo não sendo) pra mim. No transporte que nos levou do hotel até o evento, sentei perto, mas não junto, dos meus colegas e tentei conversar com as outras pessoas que estavam ao meu redor. Uma delas tinha trabalhado diretamente com George Lucas e nos contou vários casos sobre todo o universo dos filmes e do relacionamento do diretor com os atores e com a imensa base de fãs.

Depois desse dia, me interessei um pouco mais por essas “conversas aleatórias” e tenho lido alguns relatos, desde então, que apontam para a mesma direção: falar com estranhos pode ser, sim, uma experiência excelente. Então, por que as pessoas não fazem isso com mais frequência?

A resposta não é simples. Há questões relacionadas a cultura, gênero, idade, classe, etnia… Dependendo de quem você é e quem você aborda, existe o receio de “não passar a imagem errada”. Dos relatos e artigos que li (tirando as situações realmente conflituosas), o que parece acontecer na grande maioria das vezes é nós não esperarmos que os estranhos gostem da gente. E, pior, muitas vezes nós não esperamos gostar deles também.

É claro que nem sempre vai dar certo ou vai ser agradável. Mas, no geral, a comunicação vai acontecer e será positiva. Há milhares e milhares de artigos online que dão sugestões de como começar uma conversa, mas não vou por esse caminho. Quero apenas compartilhar três casos sobre recursos que eu já usei e fiz com que pessoas entrassem calorosamente em conversas.

Melhor São João do Mundo

O bairrismo não é exclusividade de um estado ou cidade desse nosso vasto território nacional. Ele está presente em muitos lugares e pelos mais variados motivos. E brincar com isso pode gerar boas conversas.

No nordeste brasileiro, há duas grandes festas de São João que rivalizam ano-a-ano: Campina Grande (PB) e Caruaru (PE). São eventos gigantes e super populares que não apaixonam só o morador da cidade. O carinho e a paixão pela festa são dignas do sentimento do mais fanático torcedor de futebol. Cada pernambucano e paraibano vai defender a sua festa ao menor sinal de perigo, mesmo que ele seja apenas uma frase quase sem maldade.

Então, para esses casos, a dica é a seguinte: ao encontrar alguém de Pernambuco ou Paraíba, sempre diga que a outra festa junina é a melhor do mundo. E divirta-se com a explicação.

São João de Campina Grande, 2013.

Chuck Norris Indiano

Muitas pessoas já ouviram falar de Bollywood. Mas poucas sabem que a produção audiovisual indiana é muito maior e descentralizada. Obras locais, com cultura particular e língua própria atraem milhões de pessoas. Por exemplo: no sul da Índia, nos estados de Tamil Nadu e Karnataka, há um ator de filmes de ação extremamente popular que se chama Rajinikanth**.**

O grande diferencial, nesse caso, é que não é só em cinema ou televisão que você pode vê-lo. Eu diria que do tempo que morei em Bangalore, um a cada três tuk-tuks tem um adesivo em sua homenagem grudado na carenagem do veículo. Por estar em atividade desde os anos 1970, além da adoração, há já um mitologia toda ao redor de sua imagem. Entre as histórias, uma fala sobre seus feitos assombrosos e sua capacidade de sempre conseguir superar qualquer desafio que seja. Este mito acaba sendo bastante similar ao conhecido meme do Chuck Norris. Obviamente, fazer uma comparação pura e direta é de um simplismo quase ofensivo. E qualquer fã vai, fervorosamente, te explicar por que você não deveria fazer aquela analogia.

Então, para esses casos, a dica é a seguinte: ao encontrar um originário do sul da Índia, comente que você gosta muito dos filmes de ação do Chuck Norris Indiano, o Rajinikanth. E divirta-se com a explicação.

Vestimenta de Time

Vários de nós que gostamos de futebol acabamos comprando produtos do nosso clube do coração. E adquirimos esses artigos para ajudar o time e usar em momentos de ida ao estádio. É muito comum passar por lugares turísticos e cruzar com torcedores orgulhosamente fardados com camisetas ou casacos de um dos grandes times da série A do Brasileirão.

Enquanto camisetas de times europeus acabam sendo mais genéricas quanto a procedência de quem a está usando, um manto colorado claramente te identifica como brasileiro. Uma vez, cruzando a fronteira para ver as quedas do Iguaçu do lado argentino, um motorista de ônibus me informou que Pato Abbondanzieri era o novo goleiro do Inter. Pra quê jornal, não é mesmo?

Há o outro lado, também. Em lugares bastante turísticos, vendedores mais atentos acabam usando essa informação a seu favor para te abordar e tentar te vender seus produtos. Uma vez, em Playa del Carmen (México), eu saí a noite para caminhar pelo calçadão, sem rumo e com o objetivo de, em algum momento, parar para jantar. Acabei sendo abordado, a cada vinte metros, por algum mexicano que me oferecia algum souvenir ou pacote turístico, sempre começando sua aproximação com um “Hey, amigo colorado! D’Alessandro (…)”

Desde então, não tenho mais levado comigo esse tipo de indumentária.

Foto de Đặng Thanh Tú

Conversar com estranhos é uma das coisas que, pra mim, ajuda a expandir o nosso mundo. No geral, nos expomos mais a essas oportunidades viajando, mesmo que pudessem também acontecer na nossa própria cidade. Geram boas histórias, criam novos amigos, nos fazem entender mais sobre a cultura local.

Você também faz isso? Quais suas técnicas? E suas histórias?

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