Um Ávila em Ávila

Gustavo Ávila
Exploradores
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5 min readFeb 11, 2019

Cada viajante tem sua forma de colecionar memórias de uma viagem. Uns colecionam fotos, outros broches. Tem os que compram chaveiros, cartões-postais ou qualquer outra lembrancinha que remeta à lembrança o lugar onde esteve. Me chamo Gustavo Ávila, e eu também tenho a minha, bem particular, que uniu duas paixões: futebol e viagem.

Coleciono camisas de futebol. De preferência, o mais desconhecido possível. Algumas dessas camisas compro em viagem, outras ganho de viajantes, mas todas elas tem sua história. Nesse post quero compartilhar uma delas: A saga pela camisa do Real Ávila.

Consegui essa camisa em uma viagem que fiz com minha família no ano de 2011 pela Espanha, na qual tive a oportunidade de conhecer a cidade de Ávila, sua muralha e seu time de futebol.

Para situá-los, essa cidade espanhola com pouco mais de 50 mil habitantes, traz consigo um conteúdo histórico muito grande. Sua muralha cercando a parte antiga da cidade, juntamente com as igrejas conservadas tal como foram construídas, fazem de Ávila um Patrimônio Histórico da Humanidade. É fácil se surpreender ao andar pelos 2516m de muralha, considerada por muitos como a mais conservada da Europa.

Devido a sua localização estratégica, a cidade mais alta da Espanha, passou por diversos conflitos e batalhas. Reinaram por lá Visigodos, Romanos, Árabes e outros povos. Com tantos conflitos, a cidade passou por uma fase decadente, e só veio a se reerguer com a construção da muralha no século XI, trazendo pessoas de diversos cantos, sendo eles católicos, mouros e judeus, com o objetivo de erguer a muralha e a economia da cidade.

Além de ser caracterizada por essa miscigenação cultural, Ávila é também famosa devido ao misticismo que envolve a cidade, sendo palco de diversas discussões e convenções tratando desse assunto. Santa Teresa de Ávila, a religiosa que fundou a Ordem das Carmelitas Descalças e que é considerada a Doutora da Igreja e padroeira dos professores é responsável por algumas dessas obras místicas. Suas ideias podem ser vistas até hoje através de suas obras e pensamentos. Nascida em 1515 em Ávila, Teresa traz consigo uma história muito interessante e que vale a pena ser pesquisada.

Deixando a história de lado, vamos para a história que prometi no início do texto: A saga pela camisa do Real Ávila.

Chegando à cidade de Ávila num domingo à noite, demos uma volta rápida pelas redondezas do hotel, próximo a muralha, jantamos e fomos dormir. No dia seguinte, nos animamos ao ver um cartaz se referindo a uma partida de futebol, convocando a torcida do Real Ávila para comparecer. A animação veio tão rápido quanto foi embora: a partida havia sido no dia anterior. Jogo perdido, mas um objetivo nos veio à tona. A partir daquele momento era dever nosso encontrar a camisa desse bendito time chamado Real Ávila.

Voltando ao hotel, fomos dar uma pesquisada para ver qual a situação desse time. Descobrimos que o Real Ávila Club de Fútbol foi fundado em 1923 e que atualmente joga a terceira divisão do futebol espanhol. E um dado curioso que até então eu desconhecia é que os times que tem o Real no nome são assim denominados após o Rei dar a Ordem Real ao time. Então o Ávila FC acabou virando Real Ávila CF depois que o Rei Alfonso XIII concedeu tal honraria, no ano de 1925.

Sabendo um pouco mais do time, fomos atrás da camisa. Passamos por algumas lojas esportivas e pedíamos, num portunhol forçado, por camisas de times de futebol.

As atendentes das lojas nos indagavam:

- Real Madri? Barça? Espanha?

E eu e meu pai com cara de quem foi comprar eletrodoméstico numa fruteira dizíamos:

- Real Ávila?!

As atendentes se olhavam e não entendiam, e a única resposta que ouvíamos era:

- Perdón, no hay.

A surpresa dos atendentes era tanta que começamos a desconfiar de que éramos os primeiros a procurar por tal camisa.

Até que chegamos numa loja próxima do Estádio Municipal Adolfo Suarez, na qual o atendente nos informou que o time costuma treinar no período noturno e quem sabe poderíamos adquirir alguma camisa com eles, porque em lojas seria difícil. Passamos no estádio e recebemos a informação que a loja do clube só era aberta em dia de jogos, o que impossibilitaria a nós conseguir a camisa, pois estaríamos de partida antes de acontecer o próximo jogo. Só nos restou uma única solução: aparecer no treino e pedir uma camisa diretamente à alguém do clube.

Carregando nas mãos uma camisa do meu time, o Criciúma, lá fomos nós em busca de quem sabe uma troca. Chegando lá, avistamos um homem que parecia fazer parte da comissão técnica. Falamos com ele sobre a nossa busca pela camisa e sobre a identificação com o time devido o nosso sobrenome. O homem por certo estava surpreso com aquela situação, mas resolveu nos ajudar. Nos levou até o vestiário e de lá nos trouxe duas camisas do Real Ávila. Nós perguntamos ainda quanto ia nos custar e ele simplesmente disse que não havia necessidade de qualquer pagamento.

Desconfio que aquelas camisas sejam mais antigas e já inutilizadas pelos jogadores, mas naquela situação em que nos encontrávamos não tinha do que reclamar. Pelo contrário, depois daquele presente que o Real Ávila nos deu, fizemos questão de presentear o Clube com uma camisa do Tigre, fechando assim a nossa busca incansável pela camisa.

Desde aquele ano o Real Ávila não subiu de divisão, mas se mantém ainda lá tal qual a muralha de Ávila.

E eu fico na torcida, para que algum milagre de Santa Teresa de Ávila leve o time azul-grená para posições de maior destaque no futebol espanhol.

Por fim, se você estiver visitando Ávila e avistar essa camisa do Criciúma, você já sabe como ela foi parar lá.

Avante Real Ávila!

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