Viajando Sozinho em Bucareste
Uma das grandes graças de viajar é experimentar situações que você não tem em casa, imerso em ambiente e cultura diferentes. Normalmente fazemos isso em duplas, trios ou grupos maiores. Dificilmente fazemos isso sem companhia. A ideia de viajar sozinho é horripilante para muitos. Não esqueçamos que humanos são, sobretudo, bichos sociais.
Para aqueles que estão na dúvida em se arriscar numa aventura solo, deixa eu contar um segredo: você não precisa estar sozinho o tempo todo. Existe mais gente na mesma situação que você do que se imagina. Um estudo feito com reservas em hostel sugere que na população entre 18–35 anos há uma parcela de mais de 70% de viajantes solitários.
Minha experiência pessoal talvez não tenha chegado a esses mesmos dados, mas posso dizer que no geral minha percepção é que os números são bem altos mesmo. No caso específico dessa história, meu quarto em Bucareste estava com dois terços de desgarrados. Das seis camas disponíveis, além de uma mãe com sua filha, ocupávamos o restante do espaço: uma norte-americana, um sueco, um canadense e eu.
Particularmente, sou bem fã desse tipo de hospedagem. Hostels são, no geral, baratos. E também propícios para socializar. Basta que alguém seja o gatilho para uma conversa começar. Nesse dia, foi a Renee. Quando ela entrou no quarto, falando pelos cotovelos, colocou todo mundo para interagir. Por causa dela, eu soube citar as pessoas ali em cima e, mais importante, não aproveitei sozinho a capital da Romênia de dia e a noite.
O dia
Eu não tinha muito tempo na cidade, então resolvi fazer um tour com o que me parecia ser interessante e factível no tempo que eu tinha. Isso incluiu, basicamente, 3 grandes áreas de interesse: o Museu Nacional da Aldeia Dimitrie Gusti, o Palácio do Parlamento e o centro histórico.
Começamos nosso passeio pelo prédio mais pesado do mundo. Construído no fim do regime de Ceaușescu, é uma obra de engenharia civil impressionante. Existem visitas guiadas que te levam a algumas salas e salões que impressionam pela amplidão dos espaços e pelo luxo que estava sendo instalado em cada um dos ambientes. Mesmo que nem todos os espaços estejam abertos ao público em geral, dado que efetivamente acontecem ali as sessões da câmara dos deputados e do senado romeno, vale muito a visita. Nessas quase duas horas se entende que não é a toa que quando caiu o ditador, a obra foi parada. Para um país pobre, aquela empreitada era realmente uma delirante extravagância.
Depois dali, fomos até o parque Herăstrău, que abriga um museu a céu aberto que mostra aspectos da vida rural e das tradições dos camponeses da Romênia. O Museu Nacional da Aldeia Dimitrie Gusti se estende por mais de 10 hectares e possui muitas casas extremamente bem conservadas por dentro e por fora, que ilustram cenas cotidianas dos séculos XVII ao XX. Várias delas são abertas e com isso você pode ter uma experiência um pouco mais concreta de como eram as residências de quem vivia no campo. Há também igrejas e prédios relacionados ao trabalho da época, como moinhos e oficinas.
O centro histórico é um clássico exemplar de cidade européia: cheio de ruelas e prédios antigos. Ali, pare para comer ou tomar um café e caminhe meio que a esmo que não vai ter muito erro. Agora, para investir um pouco mais de tempo, escolha alguns pontos de parada. Por exemplo, entre no Monastério Stavropoleos, um prédio criado em 1724 e que ainda é usado pelas pessoas no seu dia-a-dia. O culto principal na Romênia é Ortodoxo e a forma de oração é bastante distinta da que vemos no Brasil, então entrar numa igreja popular como essa é vivenciar — como observador — uma forma distinta de religiosidade.
Pra finalizar o relato do dia, um causo pitoresco. Eu ainda não tenho uma teoria bem formada sobre isso, mas brasileiros sempre se encontram no exterior. Esse casal (do Rio ou de São Paulo) que me identificou como conterrâneo acabou nos acompanhando pela visita guiada do prédio do Parlamento. Eles se propuseram a tirar várias fotos nossas, principalmente pela comodidade de não ficar precisando trocar a máquina um para o outro. E pegaram meu email para enviar os registros. Nunca recebi nada… O melhor do Brasil é o brasileiro.
A noite
Muito da boemia romena acontece na Old Town. E isso não é de se espantar, já que são inúmeras as opções de bares e restaurantes, um do lado do outro, em um espaço nem tão grande assim. Para quem conhece Porto Alegre ou o Rio de Janeiro, é como se fosse a Cidade Baixa ou a Lapa.
Nosso albergue era nessa vizinhança, o que nos facilitou muito a vida. Saímos caminhando a esmo, olhando as opções. Íamos conversando e decidindo: "Quem sabe esse?" ou "Aquele parece bom, não?".
Até que em um deles vimos um panda, na porta, chamando quem estava na rua para entrar. Sim, um panda dançante que acenava para as pessoas que passavam. Havia uma placa ao lado dele que informava a promoção da noite: uma torre de 5 litros de cerveja. Mentalmente fizemos a conta, cada um convertendo para sua moeda de origem, e demos o veredito: era ali o lugar. Mesmo em reais, o preço tava bem aceitável. E, francamente: como desperdiçar a oportunidade de beber cerveja barata com um panda?
Entramos e encontramos um espaço bem bacana onde não deixamos de notar que a noite era temática. O restante das pessoas do estabelecimento também estavam fantasiadas de algo. Entre uma mulher-gato e uma Frida da Oktoberfest, vieram os copos para acompanhar a bebida. Conversávamos sobre qualquer coisa até que as luzes diminuíram um pouco de intensidade. A preparação cenográfica nos deixou atentos para algo que não sabíamos o que seria.
A surpresa se desenrolou por uma escada que ficava do lado da nossa mesa — e que eu nem tinha notado que existia! Desceram duas dançarinas trajadas de bíquini e usando cabeça de macaco. Mesmo entre aplausos e assobios e pessoas que começaram a acompanhar a dança, elas ficaram concentradas na sua coreografia. Durante algum tempo fizeram isso nos degraus, até que se espalharam pelo bar.
Bem, se você acha que o panda, o elefante e as mulheres-macaco não eram non-sense o suficiente, tenho de dizer que não foi tudo. Achando que não havia mais nada para acontecer, o bar tirou um ás da manga. Não muito depois das gurias liberarem a escada, desceu os degraus um anão vestido de Super Mário.
Revisitando os lugares para escrever esse texto, descubro que o bar fechou. Que fique então um brinde saudoso a esse grande estabelecimento da diversão romena que não existe mais. E também aos amigos de viagem que são criados quando se resolve explorar o mundo sozinho!
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