Durante a Lua Cheia me tornei Deméter

Guta Dagnino
ExtranhaMente
Published in
4 min readApr 16, 2018

Passei um bom tempo sem escrever, porque nesses último mês eu estava me transformando, vivendo mudanças.

Nós estamos sempre nesse ciclo lilás de transformações e creio que esse seja o grande intuito da vida, algumas vezes vêm pela dor mas dessa vez as mudanças que vi em mim vieram por amor.

E se a cada fase da lua, nós olhássemos para as nossas mudanças

Eu estou morando no Canadá há 7 meses, e nesse tempo em que estou aqui já mudei muito e descobri forças e sentimentos interessantes sobre mim, que provavelmente só teriam se despertado daqui há alguns anos se eu estivesse no Brasil.

Ajudo o meu pai com as aulas de judô para crianças de 3 à 11 anos, o que significa que eu passo bastante tempo em um ambiente em que jamais pensei que tivesse paciência e tato para estar, não que eu não gostasse de crianças, sempre quis ser mãe e tudo mais, entretanto nunca foi um sonho ficar rodeada por elas e ter que lidar com falatório o tempo todo, choro, machucados, dúvidas que parecem absurdas, mal criação e tudo isso acompanhado de uma língua que eu ainda não domino.

Eis a minha surpresa ao me ver completamente apaixonada pelas turmas, ficando feliz com cada progresso, conhecendo cada um deles, me divertindo com o falatório, com as perguntas absurdas, ficando preocupada com os choros e machucados e tendo paciência para lidar com a mal criação de alguns, continua não sendo o meu sonho ser professora e ficar rodeada de crianças (eu não sou a minha mãe). Mas eu descobri toda uma nova faceta, que sim me deixou surpresa e deixou os outros surpresos também.

Toda essa transformação teve uma crescente considerável nessas duas últimas semanas, aceitei ser babá de uma menina de três anos, e convenhamos se eu estivesse no Brasil isso jamais seria uma opção, eu não conseguiria me imaginar tomando conta do filho de alguém, porque além de envolver muita responsabilidade também envolveria uma carga emocional que eu não sabia que era capaz de existir em mim, mas que hoje graças as aulas eu sabia que poderia tentar. Tentei e consegui, nós passamos duas semanas aos trancos e barrancos, mas eu e ela sobrevivemos e estamos bem.

Sim, foi difícil. Eu e a coelhinha feroz não fomos um mar de amor e tranquilidade, eu tive que me virar pra fazer com que nossas duas semanas não fossem regadas a birras e manhas, pois ela no alto de seus 3 anos conseguia ser extremamente articulada e mandona, e eu com os meus meros 21 era a massinha de modelar sem experiência que ela achou que poderia jogar. Nos primeiros dias eu cheguei a pensar que ela me odiava, e a cogitar largar mão e deixa-la assistir Caillou o dia todo, mas então nós tínhamos alguns instantes de riso e tranquilidade que me faziam ficar encantada com a inteligência, sorriso e inocência e seria impossível desgostar dela.

A coelhinha feroz (grrrrr) voltou para Montreal e eu estou aqui sorrindo ao lembrar de cada momento com ela, até das birras. Vou sentir saudade das horas de pintura, das histórias que contei com ela em meu colo, dela correndo e sorrindo enquanto imitava algum animal selvagem como dinossauros, leões e lobos mesmo tendo o tamanho de uma pequena coelha fofa, sentirei saudades até dos banhos desnecessariamente longos.

Esse texto todo é sobre transformações e descobertas. Eu que sabia das minhas facetas Catrina e Sukubus, descobri que existe Deméter dentro de mim. -Deméter que é considerada uma deusa grega com o foco na agricultura, mas que também ficou conhecida por ser Mãe e amar tanto sua filha, Perséphone, que fez um trato com Hades para que ambos tivessem seu tempo com ela. Deméter também faz parte de uma das Três Faces da Deusa, ela é a MÃE. *leiam os links*

Também entendi o que a tempos era uma dúvida para mim, ser filha de Yemanjá consiste em ser também acolhedora e maternal, e hoje morando numa cidade banhada pelo mar consigo exercer essas características.

Toda a minha história de uma descoberta e transformação entre tantas, serviu para que eu precisasse sentar aqui e escrever para incentivá-los a se abrir para coisas, momentos e oportunidades que muitas vezes parecem não nos caber, mas que podem ser uma grande surpresa se nos permitirmos. A cada dia passamos por transformações mínimas que nem nos importamos, mas que sim são importantes e nos fazem crescer. Estejamos mais dispostos a aceitar nossas mudanças, a deixar o barco seguir seu curso aceitando o que o mar tem pra dar, que a cada fase da lua seja um momento novo para novas descobertas internas, que a gente entenda que é preciso se transformar para nossa essência continuar a existir, somos seres fluidos precisamos que haja movimento para que a nossa existência aconteça, que recebamos as transformações como uma conhecida antiga que jamais envelhece e é sempre bem vinda.

Eu precisei mudar de país para descobrir uma coisa que parecia meio óbvia, mas que foi algo grande para mim, me vi doando afeto, acolhendo, me preocupando, entendi como é exaustivo cuidar do outro e quão gratificante pode ser, me percebi almejando ainda mais, algum dia ser mãe e hoje sabendo que sim eu sou capaz,que eu vou errar e que algumas vezes vai ser frustrante, mas que vale a pena só pelo som do riso. Essa experiência serviu para que eu entendesse que a vida adulta está aqui batendo na minha porta, que sim é assustador, mas se eu encarei uma coelhinha feroz que me ensinou muito sem nem ao menos saber, então sim eu posso muito bem encarar tantas outras oportunidades de transformações que aparecerem em minha vida.

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