A Lógica de Ser Gente Boa

Leopoldo Jereissati
Fala Man
Published in
6 min readOct 18, 2020

Um olhar positivo sobre o dia a dia

Essa semana pude ter uma experiência nova. Vim parar em um lugar inusitado de uma ilha conhecida. O bairro chama-se Rio Tavares, a placa feita por crianças do bairro antes de chegar na restinga aponta que estamos em um trecho de praia chamado Rififi. Dizem que o nome pegou quando um surfista gago, ao expressar-se sobre o reef (banco de areia) daqui saiu um “rifi-fi”.

Sobre a vibe do lugar, aqui “todo mundo se conhece. É cheio de surfistas, praticantes de yoga, galera do rolê Zen. Ao caminhar na praia é comum ver casais super alongados de ponta cabeça, gente adulta dando mortais para trás, posando para suas contas no Instagram ao entardecer com uns puta corpos aproveitando a qualidade da luz, meditando, surfando, fotógrafos tipo Canal Off tirando fotos profissionais dos surfistas embaixo do guarda-sol no ponto mais alto da praia, salva-vidas bonita de roupa vermelha e amarela, homens e mulheres com peles tatuadas em preto e bronzeadas nível to nessa há meses.

A vendinha aqui do lado tem as prateleiras relativamente vazias de produto mas vive cheia de gente. Mesinha de sinuca, reggae, churrasquinho a tarde e um caldo de cana delicioso. O dono, Diogo, é dono de uma preocupação de dar inveja boa:

— Tem sal grosso e uma caixa de fósforo?

— Sal costumo ter. Deixa eu ver… não tenho não. Mas pera aí que vou pegar um pouco para ti.

Ele vai para a parte de trás, talvez ele more ali e traz seu próprio saco de sal grosso, coloca um punhado no saco plástico e entrega para mim.

— Para tu não ficar na mão. A caixa de fósforo é R$2,00.

Eu dou uma nota de dez reais para ele.

— Não tenho troco. Depois você me paga.

Acabei deixando os déizão lá e disse:

— Cara, deixa de crédito aí que volto certeza.

Agora sou eu quem está devendo R$2.50 pra ele.

Na cidade grande não tem mais isso. Isso faz falta. Ontem passou uma criançada correndo e brincado na rua e não estamos em um condomínio fechado. Onde tem obra rolando aqui, tem gente ajudando. Gente da própria rua. Um senso de comunidade que não tinha visto ainda ao vivo. Das três obras que pude observar, as três estavam sendo conduzidas pelos próprios proprietários, em conjunto ou não com os pedreiros. Cena rara, até certo ponto eu ficava pensando o porquê. Será que eles aqui tem tempo para isso? Gostam da pegada DIY (faça você mesmo)? Não parece faltar grana pela qualidade das construções para contratar pessoas e terceirizar o serviço… Depois eu respiro fundo pelo nariz, seguro 3 segundos e expiro por 6 e percebo que eles estão vivendo. Nada mais. Limpo minha mente, e volto para a casa.

Estou com a família em um airbnb, entre a praia e uma lagoa pequena. É uma casa agradável com redes, varanda e um jardim com variedade de fauna e flora. Tem sapatinho-de-judia em que beija-flores e outros pequenos pássaros e insetos vem beber o néctar diariamente, tem oliveiras e uma parreira com cacho de uvas em crescimento, uma bromélia gigante, palmeiras, pé de manga, bananeiras, dois teiús que moram embaixo do deck de madeira, um macaquinho que vem nos visitar de vez em quando, maritacas, canarinhos da terra, joão-de-barro, bem-te-vis, rolinhas, anus e talvez o mais exótico deles a aracuã — que canta bonito e aparece apenas entre 5 e 7h da manhã. Tem uns quatro ou cinco gatos também que disputam o território entre eles e comigo. Tem pernilongo a tarde e tem wi-fi bom!

Aqui faz sol e calor, venta forte (quase 30km/h essa semana) e faz frio. Em uma semana acendemos a lareira da casa e tomamos um torrão na praia de sol. A praia é extensa e vazia; paradisíaca. Uma pequena duna antecede a chegada e deixa muito charmoso o caminho até o mar. Mar agitado e gelado, gelado no ponto de eu me sentir como o cara que fez um amigo polvo no Netflix. Durante o documentário ele comenta que no começo, no Cabo das Tormentas, o frio da água próximo à 10 graus celsius toma o corpo de tal forma que ele mal consegue respirar. Depois, com o passar dos meses, o corpo sente falta e pede por aquele frio que traz vitalidade, incita adrenalina e o senso de presença absoluta. Esse negócio de que tomar banho gelado faz bem vem do meu sogro, passa por um maluco da barba branca do seriado da Gwyneth Paltrow (Goop Lab), o amigo do polvo e agora por mim. É bom mesmo. Saio do mar revitalizado a cada mergulho, e já começo a sentir falta dessa sensação pós frio intenso.

“Casa boa é casa cheia”. Nossa meta é estarmos sempre com companhia nesse mês com amigos e familiares. Quebrando completamente nossa rotina, tomamos uma garrafa de vinho todos os dias da semana em prosas boas e comida simples. Dormimos cedo, acordamos mais cedo ainda. “Miracle Morning” tá ligado? Ta dando para estudar, ler, meditar, já começamos aulas de beach-tennis em casal e semana que vem adiciono o fut-vôlei. Tudo isso antes das 9h da manhã. Gosto de fazer coisas novas, mas gosto de fazer direito — com professores e aula. Caminhada clássica na praia? Tem também. Lives da Race Bootcamp, Tonus e Vidya. Tamo vivendo o phygital (físico e digital) na prática. Na hora do almoço saio correndo para a praia dar um mergulho (físico) e volto pro Zoom, Meet, Teams e etc. (digital). Pós pandemia é isso: Adapt or Die.

Falando em gente boa, essa semana fiquei chateado com a história do Tadashi. Acabei de escrever uma crônica sobre a belíssima experiência com ele e saiu que ele é acusado de estupro. Cabe a justiça julgar, eu só fiquei pensando será que todo iluminado (João de Deus, Tadashi, etc) se perde nisso? Meu cunhado me mostrou hoje um video do Saulo Calderon e seu vídeo sobre a Lógica de Ser Gente Boa. Nos primeiros vinte minutos, deu para sentir que esse cara em si é gente boa. Fiquei pensando nas possibilidades que o Youtube traz. Nunca teria tido contato com ele se não fosse pelo YT. São mais de 130 mil inscritos no canal dele. A pegada ali é a projeção astral mas independentemente disso, o negócio dele é fazer o bem para o próximo.

Daí como de costume, domingo a tarde, fica tudo borbulhando na minha cabeça. Praia ou São Paulo? São Paulo 0 x 0 Grêmio — foi ou não foi pênalti? Tadashi cometeu o crime ou não? Contra-filet ou Entrecot pro churras? Fica evidente a minha necessidade iminente de me desconectar mais (ando ligado no celular entre 4 e 5 horas diárias entre trampo e redes sociais). Aí eu respiro fundo pelo nariz, seguro 3 segundos e expiro por 6. Limpo minha mente, e volto para a casa.

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