O Despertar de Uma Nova Era

Sob o olhar de um Vulcão Adormecido

Leopoldo Jereissati
Fala Man
9 min readNov 19, 2018

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Volcano Osorno — Puerto Varas, Chile.

Além do mais elegante, Osorno é também um dos Vulcões mais ativos da região Sul da Cordilheira dos Andes. São pelo menos 11 registros de erupções nos últimos 500 anos, sendo o último em 1869. Cinco séculos parece uma eternidade quando comparamos com tempo que temos de vida. A verdade é que isso não é nada quando comparado à idade do nosso planeta (4.5 bilhões de anos) e é sob essa nova perspectiva, de enxergar e entender o mundo por uma ótica mais ampla, que convido vocês aos principais aprendizados que tivemos no Encuentro B — promovido pela comunidade de Empresas, Acadêmicos, Advogados e outras frentes B da América Latina e de uma série de países de todo o mundo.

Foi no Anfiteatro de Frutillar, conhecido como Teatro del Lago, em seus 10.000 m2, que aconteceu um espetáculo digno de tamanha estrutura e beleza: o despertar de uma nova era promovido por pessoas de todas as idades, ou melhor, quatro gerações distintas.

Ao som persistente de uma música chamada Satchita cuja letra clama para que “os homens encontrem seus passos perdidos, que seus sonhos despertem seus olhos dormidos, que seu amor transborde e que vivamos em paz” que percebi que chegara à um evento de negócios diferente: um evento de impacto.

Clique Aqui para ouvir a música Satchita

50% dos palestrantes eram Mulheres e 50% homens. Uma forma tão delicada e eficiente de nos passar uma mensagem poderosa de reequilíbrio. É deliciosamente surpreendente essa experiência como espectador. Os textos apresentados utilizavam a “@” para neutralizar a linguagem. Por exemplo: “Car@s Empresári@s, como estão?”.

“O modelo de negócios como conhecemos precisa ser ressignificado.” — Jay Cohen (Cofundador B Lab)

Não se trata mais do viés de sustentabilidade que estamos acostumados a ver na maioria das empresas — aquela aba básica do site institucional com um parágrafo e a imagem de uma mão segurando uma árvore ou o planeta — mas sim de uma questão de sobrevivência e longevidade dos negócios. O foco mudou de “Maximização do Lucro para Maximização do Bem-Estar”. Pela primeira vez, assisti à um raciocínio lógico e estruturado que sugere uma mudança transversal e plena do capitalismo sem demonizá-lo: uma atualização do software apenas, como fazemos mensalmente em nossos smartcoisos.

A jornada começou com a apresentação do alemão Armin Steuernagel e seu modelo de Steward Company. Ao invés de trabalharmos para um dono, trabalharemos por um propósito. A liderança desta empresa deve ser profissional e não mais hereditária. Os colaboradores também serão sócios e aqueles que receberão dividendos das empresas não necessariamente irão deter o poder de voto (de decisão). Este último estará sob posse de quem vive ali no calor dia a dia e que possui as melhores habilidades e maior alinhamento com os valores da companhia. 1% da empresa fica sob responsabilidade de um terceiro ente (nem sócios nem executivos) que tem poder de veto e tem como papel principal garantir que a direção esteja no caminho do propósito original, sempre. Um baita começo!

TedX — Purpose.

Com base nessa primeira palestra, percebi que a necessidade de renovação e de ajuste passa por todas as etapas do ciclo capitalista, inclusive o perfil do investidor, para que possamos ter um ciclo mais virtuoso de desenvolvimento das empresas no longo prazo. O cenário atual não ajuda muito. Segundo o australiano Donnie Maclurcan “If Money accumulates in the system, debt accumulates somewhere else”, ou seja, se o dinheiro acumula em alguma parte no Sistema financeiro, a dívida também aumenta na mesma proporção em outra parte. Do jeito que estamos tem sempre alguém devendo e lascado em algum lugar enquanto outros enriquecem. A Banca Ética surge como pioneira em uma esperançosa batalha nos sistemas financeiros da América Latina.

Joan Melé

O dia seguiu com as palavras de Thais Corral, uma alma sensível, que nos propõe que compartilhemos o melhor que tivermos para compartilhar. Que cuidemos das nossas crianças e façamos nosso melhor para que elas sejam plenas, pois assim, por consequência teremos um futuro mais pleno também. Boa parte das competências que precisaremos no futuro como profissionais estão no nosso lado feminino — não necessariamente nas mulheres. Interessante né?!

Daí entrou no palco, com uma determinação e foco tremendo, Mireila Villar — representante espanhola das Nações Unidas — apresentando uma agenda consistente da ONU chamada ODGs ou “Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis”. 17 itens negociados com países de todo mundo e com as suas principais multinacionais, apontando para com o que nós devemos nos comprometer até 2030. Trouxe também o crescimento das empresas do 4º Setor: “é bom conhecê-las, pois as chances de você vir a trabalhar em uma delas no futuro são bastante palpáveis” — Gustavo Succi. São empresas com propósitos maiores que o lucro e que geram impacto positivo na sociedade e no planeta.

ODGs 2030

Gonzalo Muñoz, cofundador do Sistema B, nos chamou a atenção para a necessidade de agirmos agora nessa direção e começarmos a fazer as “perguntas difíceis de responder” se quisermos atrair os melhores talentos do mercado. Basta dois minutos de conversa com Heads de RH de grandes empresas tradicionais para escutar “- O perfil de talento que nos procurava antes já não nos procura mais. Estão todos no Google ou no Facebook”. Não é verdade… ainda estão por toda parte, mas sim estão procurando por mais e vocês não estão se mexendo o suficiente.

Pedro Tarak, cofundador do Sistema B, mediou um debate interessante e ressaltou a relevância dos papéis de agentes e atores da sociedade como um todo nessa renovação. Se de um lado, pequenas empresas tem o poder de aprofundar suas mensagens e a forma como impactam o meio em que estão inseridas, mensagens com alcance global são lançadas e coordenadas por fundações como a Ellen Macarthur, ali representada por Andrew Morlet. Você pode não ter ouvido falar sobre eles, mas já não encontra mais canudos de plástico nos restaurantes certo?! Foi deles a frase “Em 2050 vai ter mais plástico do que peixes no oceano”. Um golaço de redação. Um “Gangnam Style Effect” entre as agências de notícias do mundo inteiro. Foi uma aula de “testes e ajustes da mensagem e dos canais de comunicação para fazer com que o texto cuidadosamente evitasse expelir quaisquer grupos distintos por qualquer razão”, ou seja, atingisse e fosse aderente ao maior número de pessoas possível no mundo — literalmente.

Ellen Macarthur

Cases muito sólidos foram apresentados como por exemplo a história #Cool da marca de roupas Patagonia, do maior produtor de Berries do mundo o Hortifrut e da nossa brasileira com orgulho, Natura — ali representada pela Andrea Alvares — Chief Marketing, Innovation & Sustainability Officer. Todos reforçaram que o caminho novo já existe e que agora o que precisamos fazer é acelerar por essa estrada, sem cortar caminhos. Também curti muito a história da Guayaki — do Alex Pryor. É uma marca de Erva-Mate, aquela que o Suarez, Messi e companhia tomam nos treinos do Barça? Minha história com o mate começa no Tereré gelado nas cavalgadas no Mato Grosso do Sul e se encaminha pelos quentes goles de Chimarrão no Oeste Catarinese com a família da minha esposa. É um ritual muito gostoso de amizade e de troca entre conhecidos e desconhecidos. Além de promover esses momentos, o pessoal da Guayaki encontrou uma forma de ser bem-sucedido no plantio das ervas dentro da Mata Atlântica e estão recuperando do zero, milhares de hectares de Mata a cada ano no Paraná, Paraguai e Argentina salvo engano.

Um empresário Italiano chamado Massimo Mercati nos provocou a pensar no crescimento qualitativo, já que a Terra não aguenta mais aumento de produtividade e do volume total a qualquer custo. Nos questiona se são novos consumidores que devemos buscar ou novos transformadores — pessoas mais conscientes que possam influenciar a mudança do hábito de consumir. Chega de consumo pelo consumo apenas.

Camila Escobar, CEO dos cafés colombianos Juan Valdez, nos lembrou da essência das cooperativas agrícolas cujo papel é atender e remunerar de forma mais justa toda uma classe com necessidades mais básicas. Dessa forma ela vem empoderando a base da pirâmide e portanto trazendo maior liberdade para os pequenos produtores que hoje em dia estão sendo explorados pelo mundo dos negócios e seus inúmeros sindicatos: “Se podemos fazer bem feito, temos a responsabilidade e obrigação de assim fazer”.

Sobre o papel do Governo nessa transformação, merecem uma atenção especial um novo núcleo numeroso de pessoas até então com quase nenhum tipo de oferta de assistência social: os “Nem-Nem” — Nem estudam, e nem trabalham. São jovens entre 15 e 29 anos sem entender quem são e o que querem ser. A primeira impressão é de um bando de desocupados, mas não é nada disso não. O maior número de Nem-Nems são meninas adolescentes que engravidam muito cedo. Aí quando nascem os bebês, sentem que é muito tarde para voltar a estudar o básico e muito despreparadas para ingressarem no mercado de trabalho. No Brasil já são 11 milhões. Imaginam quanto talento podemos recuperar aqui? Para isso há uma iniciativa muito bacana do Sebastián Amenábar através da educação que busca minimizar ao máximo esse número até 2030.

Actitud Lab

Ouvi uma série de vezes a seguinte frase: “Temos que encarar nosso ato de consumo como constantes atos de investimento”. Cada vez que compramos algo, apoiamos aquilo que está sendo feito da forma como está sendo feito. Nos países em que vivemos, os maiores compradores são os Estados. É prioritário que eles também reaprendam a comprar e valorizem a produção de impacto positivo que nunca vai ser a mais econômica sob a ótica pura de preços. Custa caro fazer direito. Uma das grandes barreiras para disseminar o consumo consciente são os preços finais mais altos nas gôndolas. Iniciativas públicas já começaram nas mesas de compras do Uruguai e Argentina, vide trabalhos da Carolina Robino (www.ricg.org) e Franco de Pasquale dando preferência à empresas de triplo impacto na cidade de Mendoza — ARG. Até o BNDES Chileno está começando a acelerar startups com esse perfil, com investimentos de até 300 mil reais por empresa. Fica a dica para nossos novos políticos e equipes econômicas.

Encuentro B na Capa do principal jornal Chileno e nas mídias como um todo.

O resultado desse grande encontro foi uma “B.elleza” — diziam os Chilenos. “Somos B.allientes” — assim denominaram-se as Empresas B Chilenas se referindo à valentia dos empreendedores e comunidades locais para enfrentar tudo e seguir “caminando”.

Grande sentimento de pertencimento. De reencontro com a gente mesmo. Na sua mais profunda poesia, a natureza da Patagonia Chilena entre fortes corredeiras, lagos enormes e inúmeras montanhas engrandeceu tudo isso e nos apequenou quase que de propósito, por um propósito maior.

B.amos! Porque #Growing2019 já começou.

B.ora com a gente?

50+ Brasileir@s na Patagonia para o Encuentro B — 2018

Ps.: um agradecimento especial a todos integrantes do Sistema B Brasil que organizaram nossa comitiva de maneira incrível e muito profissional. @Marcel @Flavia @Daniel @Tati @PedroS — Nosso muito obrigado! Nos vemos em Mendoza em Agosto de 2019.

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