Pura Vida

Leopoldo Jereissati
Fala Man
Published in
4 min readFeb 13, 2021

e puro lixo.

Comecinho desse ano fui convidado para participar de um call com um índio chamado Ailton Krenak (68), promovido pela empresa Selo eureciclo. Ouvimos atentos, eu e meu sogro de bermuda na praia, os diversos conselhos de vida que ele ia nos passando ao longo de sua fala. Me lembro de ter lhe perguntado, entre tantas batalhas que ele enfrentara na vida, qual o melhor caminho para fazer grandes transformações; fazer com que outras pessoas passassem a enxergar aquilo que gostaríamos que enxergassem?! A resposta veio algo como:

“ — As experiências são como os raios do Sol, cada um as recebe por diferentes ângulos e da sua forma. São únicos. Não são replicáveis. A resposta está aqui a todo momento, mas temos que prestar atenção. Eu moro em um lugar cheio de mata, rico em alimentos para fauna, mas hoje pela manhã pousaram diversas maritacas na minha varanda. Elas não precisavam estar aqui, elas vieram só para conversar.”

Também me chamou a atenção sua crítica inteligente à forma que lidamos com o lixo.

“ — Um copo de vidro escorrega da nossa mão e quebra. Os cacos vão direto para o lixo; mas os cacos não são lixo, são vidro. E com o vidro se pode fazer muita coisa. Colocamos o lixo lá fora, mas não existe lá fora. O fundo dos oceanos ainda são aqui dentro. Dentro do mesmo lugar que vivemos, nosso Planeta.”

É um relação nova e mais circular com as coisas, de maior responsabilidade nossa para com o outro, de maior integralidade. Não dá para se lixar daquilo que colocamos no lixo. Lixo é um julgamento, o fato é que o caco é vidro.

https://medium.com/listalaya/ailtonkrenak-377fde0d337

No paralelo, e já quase um mês depois, para concluir um curso chamado Digital On Board que estou fazendo, falta ainda uma etapa que é participar de verdade como conselheiro de uma das startups investidas pela Redpoint E-Ventures dos outliers Romero Rodrigues e Flavio Pripas. Não sabíamos qual das empresas investidas cairíamos mas não é que eu fui cair exatamente na EuReciclo?! No nosso primeiro encontro com os sócios e executivas do grupo falamos bastante sobre sincronicidade, ativismo, amadurecimento empresarial, adequação das mensagens para o mercado, cultura, a relação comercial com pequenas e grandes empresas entre tantas outras trocas muito ricas. Ao meu lado no conselho, estou tendo a honra de trocar experiências com mais três colegas super qualificados, em destaque uma mulher power do mercado, a Ivanyra. Eu não entendo nada do que ela fala, ela não entende muito do que eu falo também, a gente se entende nas risadas e vai aprendendo em pontas opostas: eu querendo falar com a equipe de vendas e marketing para ajudar a vender mais e melhor, ela pedindo para assinarmos um “NDA” para que ela tivesse acesso ao “P&L” e formasse um mini “Fiscal Council”. Depois fui ver no LinkedIn dela que ela era conselheira fiscal da porra toda. Que sorte à nossa.

Falando de mulheres super power e sincronicidade, meu telefone tocou (Whatsapp na verdade — força do hábito) e era outra mulher fora da curva, dessa vez do mercado publicitário, precisando de um site. O site era um presente de um colega querido dela para uma pessoa importante. Importante para nós três que, novamente por sincronicidade, fomos tocados pela mesma causa em diferentes circunstâncias. Foi um dos calls mais divertidos da minha carreira. Não é todo dia que me liga uma mulher dessas para me conectar com um Mad Men e ao invés de negócios falarmos sobre as engraçadas coincidências do cotidiano em três diferentes gerações: pura vida!

Nessa conversa falamos de muita coisa, entre elas uma que me deixou pensativo: a intolerância das pessoas nas redes sociais fez minguar a disposição dela de voltar a escrever e postar seus artigos em veículos de grande circulação. Eu não conheço muita gente com tamanho conhecimento, energia e poder de execução como ela. Me deixou inquieto imaginar que estou deixando de aprender coisas tão legais através dos seus textos porque ficou inviável para ela se expor. Imaginem quantas mentes brilhantes estão na mesma situação, silenciadas pelo ódio? A censura qual tanto temíamos voltar está sendo promovida pela própria sociedade, por nós mesmos e nosso arquétipo de criança rebelde do ego se manifestando sem qualquer responsabilidade por aí. Onde vamos chegar com tanta intransigência, críticas duras e sem fundamento; com tanta raiva? O BBB de 2021 está acontecendo fora do Projac. Apesar do foco estar lá dentro, somos nós quem estamos presos em casa há quase um ano, vigiados por todos smart-trecos, sendo julgados e colocados no paredão a cada dia por gente que a gente não sabe quem é e nem eles próprios sabem quem são. Onde é que fica a saída de emergência???

Eu acredito que a compreensão de que todos somos limitados pelo nosso lugar de fala abre novas possibilidades de interação e de empatia. Este lugar, como disse Pedro Cardoso em um papo aberto e sincero sobre racismo, mostra que “somos livres e prisioneiros da nossa biografia para discorrermos sobre qualquer tema, sermos quem somos e termos a humildade de lembrar que sempre estaremos falando sob a nossa perspectiva.”

Que que tem a ver a sabedoria de um índio Crenaque, a forma como lidamos com o lixo, educação, venture capital raíz, a falta de convívio e troca de conhecimento entre gerações de um mesmo mercado, a censura e a intolerância?

Viveremos em um futuro residual se nos lixarmos para o presente.

Ps (i): Haters will hate.

Ps (ii): Ghost Writing é uma opção tradiça em tempos de censura

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