Watermelon Sugar

Leopoldo Jereissati
Fala Man
Published in
6 min readDec 6, 2021

High…

Tá chegando o verão e não há sensação mais gostosa do que essa de encerramento de ano. Novembro acaba e logo começam encontros atrás de encontros. É hora de estarmos mais próximos, uma época que de alguma forma todos querem resolver aquilo que ficou aberto por qualquer motivo, buscando o fechamento e renovação de mais um ciclo. A gente usa esses eventos para reforçar os laços e os compromissos uns com os outros: “ — Sabe que pode contar comigo né?!”, “ — Sabe que eu te amo?!”, “ — Você é o/a melhor ________do mundo!”. São palavras mundanas, todavia as mais gostosas de ouvir e as únicas que importam a cada ano que passa.

Para quem gosta de encontros de família chegou o seu momento: geral alvoroçada procurando datas e brechas em comum para se encontrar. A já quase lotada agenda ainda precisa de espaço para passar em algum lugar para comprar os presentinhos que faltaram.

Sexta-feira fui ver minha irmãzinha se apresentar na escola de música. Fiquei impressionado como ela está tocando bem piano para quem começou há poucos anos e ao lado de músicos-professores tocaram uma versão muito linda de “Snowman” da Sia (Se clicar na palavra sublinhada você consegue ir ouvindo enquanto lê aqui…). A letra é uma declaração de amor em forma de metáfora (de um boneco de neve) que reforça que o sentimento da cantora pelo amado é mais forte do que apenas uma estação que em tese é tudo o que daria para um boneco de neve suportar (o inverno) — nosso “amor de verão”.

A apresentação era 20h30 mas fiz questão de chegar mais cedo para não perder nada. Ela ficou feliz em me ver ali e correu para ensaiar. Enquanto isso bati altos papos com mãe e a avó dela que acabara de se recuperar de um susto de saúde e combinamos de tomar um whiskinho para comemorar, assim que possível — claro. Ela estava super preocupada se a neta iria ou não colocar em tempo um sapatinho com brilhos de princesa que ela havia separado em uma sacola, mas tinha alguém ali decidida a manter sua originalidade desde cedo:

Esse Converse azul foi o charme do lookinho…

Outro presente de natal que acabei ganhando sem saber que iria ganhar naquela noite foi a coincidência da apresentação de um dos meus sobrinhos na bateria. Ele estava tenso e focado, aquele frio na barriga natural de quem vai subir no palco e se apresentar. Ele escolheu uma música muitoo legal chamada Watermelon Sugar — Harry Styles. Acho que poucos ali sabiam da dualidade da letra que transcreve de forma muito sutil o orgasmo feminino (Você pode assistir o clipe ao clicar na palavra Watermelon) e eu adorei mais ainda depois dessa descoberta — acho que o pai e o avô vão ficar orgulhosos de saber.

Quando ele começou a tocar eram batidas simples e ritmadas. A professora de bateria dele era puro estilo e se arriscou no microfone. A vibe dessa música é incrível e ela foi logo tomando toda a platéia. Minha vontade era gritar, bater palma, soltar um “Vaaii Jojo”, mas a galera tava mais contida. Fiquei reparando na interação entre professora e aluno: ela olhava para ele e batia com as mãos no ar o ritmo certo para ele seguir. Atento aos dedos das mãos dela ele acompanhou “um, dois, três, quatro” e no compasso certo ele mandou uma girada pela bateria toda que arrancou suspiros do avô, ao meu lado, e do tio aqui que deixou cair uma lágrima de tanto orgulho; arranquei a máscara e comecei a assobiar! Não teve jeito rsrs…

Watermelon Sugar, high!

Não deve ser fácil ser Papai Noel, uns pedem tanto e outros tão pouco.

Na segunda-feira desta mesma semana, ganhei de presente do meu irmão o convite para um encontro no JK de um instituto chamado Sol — ligado à educação. O evento beneficente buscava aumentar a arrecadação de recursos para dar continuidade na oferta de bolsas de estudo em instituições privadas para alguns jovens talentosos do ensino público. Eu não me canso de ter empatia e engajamento com esse tipo de causa, ODS 4 da ONU. Cada jovem é uma história que pode impactar milhares de outras vidas se tiverem acesso — e nada além disso — à pessoas e a educação.

Neste evento, além de escutarmos o depoimento de alguns destes jovens em formação, pudemos também ouvir um pouco mais sobre as trajetórias do Florian Hagenbuch(empreendedor fundador da Printi e da Loft), da Tamara Klink (a mais jovem brasileira à atravessar o Atlântico — solitária)e o Daniel José (Deputado Estadual de SP — jovem que veio do zero e foi super bem votado pela linda trajetória de vida e competente carreira). Aqui os principais aprendizados com eles na noite:

Florian: empreendedor alemão que veio morar desde muito novo no Brasil — “Referências e Condições” é a forma qual ele encontrou para dividir com a gente o caminho que trilhou com muito trabalho e visão. Referências no sentido de ter para onde olhar e com quem se espelhar e Condições no sentido de ao fornecermos/buscarmos condições adequadas para a realização de um feito/sonho, “Por que não?!”. Ele comentou também sobre a importância de sonhar novos sonhos a cada estágio da vida, uma vez que suas referências e condições se expandem com o tempo. Essa passagem dele me lembrou uma frase:

“ — Um homem nunca pode banhar-se duas vezes no mesmo rio pois o rio já não será mais o mesmo, nem tampouco o homem”… Heráclito de Efeso

Eu queria ter prestado mais atenção no que ele falava, mas como sou pai fresco de um Galeguinho, eu olhava para ele e pensava se meu filho iria ficar esteticamente parecido mais velho…

Daniel José trouxe de sua trajetória, sua relação com o pai que faleceu com 98 anos. Ele o viu “enterrar a maioria de seus amigos e familiares” e como filho parceiro ele o acompanhava em uma série de velórios em sua cidade natal. Essa relação de ver a morte de perto desde tão cedo trouxe um senso de urgência muito grande para ele já que a vida está acontecendo agora e há pouco tempo por aqui disponível. Seu legado está ligado à melhoria do IDEB, índice que mede a performance dos alunos em rede pública. Dividiu com a gente também as preocupações de sua mãe com a decisão dele de entrar na política no Brasil. “ — Era melhor ele ter ficado entre os refugiados na Jordânia” — ela dizia. Como tudo na vida é relativo, ela preferia que seu filho continuasse por lá ao invés de entrar para o cotidiano da vida pública que, infelizmente, ainda afasta muita gente com boa intenção de entrar; mas já está melhor segundo ele ao ver jovens de sua faculdade interessadas em seguir pelo mesmo caminho.

Tamara Klink foi para mim, e para minha sobrinha Lulu que estuda no mesmo colégio que ela estudou, a grande estrela da noite. Ela nos contou de uma forma muito bem articulada e poética sobre sua aventura cruzando o Oceano Atlântico em um barco, sozinha. Chegou a ficar 17 dias sem ver nenhuma pessoa, nem mesmo ela por falta de espelho no barco. Esse mulherão de apenas 24 anos me jogou de volta no livro sobre as aventuras de Shackleton e me deu saudades daquela irresponsabilidade calculada de quando era mais jovem entre 18–25 anos. Seu legado está ligado a mudar nossa forma de ver o Mar e sobre inspirar mais e mais mulheres a comandarem suas travessias aqui na Terra… To seguindo ela no insta!

Para tentar fechar tudo isso que vivi nessa semana atípica de fim de ano, acredito muito na importância de formarmos cidadãos além de perfis técnicos puros. Imaginem mais e mais jovens entrando no mercado de trabalho com condições e referências, com o desejo de promover mudanças estruturais no sistema público e quando se tem coragem e ousadia para fazerem suas travessias…Por que não?

O eixo que liga dezembro à janeiro é como um portal que se abre, uma vez por ano, por um instante.

Aproveite o seu.

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