Casos de Família
Parte da Série Reminiscências
O bisavô caiu do trem — foi o que disseram. Poder ter caído bêbado, pode ter caído porque havia chegado a hora de cair. Pode ter precipitado essa hora jogando-se de encontro ao trilhos: um corpo que cai, nada além de carne. Quando bisavô morreu, bisavó já havia partido — o parto de cinco filhos lhe tomara as forças, o alcoolismo do maridos e os tempos magros, a vontade de viver — foi “a doença” que lhe tomou o que restava, vovô nunca disse qual. Quantas vidas se construíram e se perderam na via férrea? A de bisavô se foi num suspiro, mais ainda agora a grava e a erva daninha crescem em meio aos trilhos. Ainda agora as pessoas vagam pelas estações, ainda agora casas são construídas e demolidas ao longo da via férrea: as famílias florescem como a grama — sejam em casas de alvenaria ou em barracos improvisados — apesar de constantemente pisoteadas pela cidade. O cemitério e a estação são testemunhas silentes desta cidade que cresce se destruindo, cresce consumindo pessoas e, indiferente a tudo — e a todos — o trem corre por sobre os trilhos, como correu por sobre o corpo de bisavô.
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